Dois médicos guineenses do Hospital Simão Mendes de Bissau, Mboma Sanca e Malam Sabali, disseram hoje à Lusa estarem cético com a estratégia da Guiné-Bissau para combater a pandemia do novo coronavírus.
O Centro de Emergência de Saúde da Guiné-Bissau registou já 457 infeções por covid-19 no país, incluindo 24 recuperados e duas vítimas mortais.
Mboma Sanca trabalha no único serviço de Cuidados Intensivos e Malam Sabali é médico-cirurgião nos serviços de urgência.
Ambos afirmam que o Simão Mendes, hospital de referência da Guiné-Bissau, lugar preparado para receber e tratar doentes afetados pela covid-19, não tem, atualmente, as mínimas condições exigidas.
Nas contas de Malam Sabali, até 6% dos doentes infetados pela covid-19 vão precisar de um internamento nos Cuidados Intensivos, dada a gravidade da sua situação, mas naquela unidade, disse, "não há oxigénio nem ventiladores".
Sabali afirmou que a unidade é a única naquele hospital com um sistema de canalização, já montado, para levar oxigénio até ao paciente, mas que atualmente não funciona por falta daquele produto.
A unidade de produção do oxigénio do Simão Mendes está avariada e Malam Sabali entende que a solução passa pela sua rápida recuperação, antes que qualquer doente com a covid-19 seja internado nos Cuidados Intensivos.
Médico de medicina interna, Mboma Sanca disse que é a própria estratégia guineense que "se está a relevar um fracasso", a começar pela forma como é feita a comunicação pelas autoridades sanitárias.
"Não se identificou a real estratégia de combate que devia assentar na comunicação e prevenção, porque mesmo os Estados Unidos de América com todo o seu arsenal de equipamentos, não estão a conseguir evitar as mortes", defendeu Mboma Sanca.
Para o clínico guineense, a doença deixou de ser uma ameaça para o país a partir do dia 25 de março quando foram diagnosticados os primeiros casos e "era tempo suficiente para uma outra abordagem", frisou.
Malam Sabali antevê "dias complicados" a partir do momento em que comecem a dar entrada no Simão Mendes casos graves e lembrou que o primeiro paciente com aquele quadro acabou por falecer 48 horas depois de dar entrada no hospital.
Sabali até compreende os esforços das autoridades, mas defendeu ser urgente equipar o Simão Mendes, formar a equipa médica e dotá-la de material de proteção que disse não passar, neste momento, de máscaras cirúrgicas e luvas.
"Esta batalha não é de curto prazo, devemos pensar que vai levar algum tempo. Temos máscaras e luvas, mas em pequena quantidade e é preciso dotar o pessoal médico com touca, batas, botas e outros materiais", sublinhou Sabali.
Para Mboma Sanca, mais do que pensar no tratamento é a própria estratégia que deve ser orientada no sentido de incentivar o distanciamento social da população, isolamento de casos positivos e proteção do grupo de risco, pessoas portadoras de outras doenças, nomeadamente AVC, diabetes, hipertensão e VIH/Sida.
É desse grupo que Malam Sabali aponta para os 6% de doentes que serão considerados casos graves e para os quais, disse, o país ainda não se preparou. Segundo disse, 80% de infetados terão manifestações ligeiras e 14% terão manifestações severas.
A Guiné-Bissau tem 475 casos confirmados da doença e dois mortos.
O Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló, prolongou, pela segunda vez, o estado de emergência no país até 11 de maio.
No âmbito do combate à pandemia, as autoridades guineenses encerraram também as fronteiras, serviços não essenciais, incluindo restaures, bares e discotecas e locais de culto religioso, proibiram a circulação de transportes urbanos e interurbanos e limitaram a circulação de pessoas ao período entre as 07:00 e as 14:00 horas.
O número de mortes provocadas pela covid-19 em África subiu hoje para 1.959, com mais de 49 mil casos da doença registados em 53 países, segundo as estatísticas mais recentes sobre a pandemia naquele continente.
A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de covid-19 já provocou mais de 254 mil mortos e infetou quase 3,6 milhões de pessoas em 195 países e territórios.
Mais de um 1,1 milhões de doentes foram considerados curados.
MB // VM
Lusa/Fim
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