11 de maio de 2017

Movimento 'O Cidadão' pede a CEDEAO que imponha sanções a Cassamá

O movimento guineense 'O Cidadão' exortou hoje a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) a impor sanções ao presidente do parlamento da Guiné-Bissau, Cipriano Cassamá, por ter bloqueado o funcionamento da Assembleia Nacional Popular (ANP).

Em comunicado, divulgado à imprensa, o movimento exorta a "CEDEAO a dar sanção pesada ao presidente da ANP Cipriano Cassamá que por iniciativa própria bloqueou o funcionamento de um órgão soberano de Estado".

O movimento lamenta também a "incapacidade, arrogância e o ego dos políticos por não aproveitarem mais uma vez a oportunidade para tirar o povo da situação difícil", em que se encontra.

Na última missão de avaliação da aplicação do Acordo de Conacri realizada a Bissau pela CEDEAO, a organização deu às partes em divergência 30 dias (que terminam a 25 de maio) para aplicar o acordo, caso contrário serão impostas sanções.

O Acordo de Conacri, patrocinado CEDEAO, prevê a formação de um governo consensual integrado por todos os partidos representados no parlamento e a nomeação de um primeiro-ministro de consenso e da confiança do chefe de Estado.

O movimento "O Cidadão" acusa também o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e outros partidos com assento parlamentar continuarem "indisponíveis" para encontrar uma solução para a crise que afeta o país há cerca de dois anos.

NAOM

Manecas dos Santos - A Guiné-Bissau pode estar "na iminência de um golpe de estado"

Manecas dos Santos (o mais alto, de barba) com Amílcar Cabral, o líder que levou mais longe a luta de libertação  |  ARQUIVO AMÍLCAR CABRAL/FUNDAÇÃO MÁRIO SOARES
Entrevista a Manecas dos Santos, comandante histórico do PAIGC, na sua casa de Bissau

Caboverdiano, Manecas dos Santos, 74 anos, juntou-se ainda estudante à luta de libertação liderada por Amílcar Cabral, o fundador do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC). Cercou Salgueiro Maia em Guidage, batalha decisiva da guerra na Guiné. "Não se esqueça de que o 25 de Abril também é nosso", sublinha. "O movimento dos capitães nasceu cá. Foi onde o exército português foi confrontado com enormes dificuldades." Nesta entrevista, a 27 de Abril na sua casa de Bissau, diz que a PIDE é responsável pela morte de Cabral, que o actual presidente é "um traidor", e que a Guiné-Bissau espera por um golpe "bom", para que haja eleições rapidamente. Há dois anos que o parlamento não funciona.

Como foi o cerco de Guidage?

Eu e o Lúcio Soares comandávamos toda a Frente Norte. Somos os dois únicos comandantes principais que ainda estão vivos, aqui na Guiné. E ele tinha saído para uma formação, eu era o número 2, ia comandar. Nessa altura decide-se fazer o ataque a Guilege, uma pedra no sapato que tínhamos na Frente Sul, precisávamos de a libertar. Para impedir a concentração das tropas especiais portuguesas em Guilege, fizemos ataques a Guidage, criando uma situação extremamente má para o exército colonial. E as tropas especiais portuguesas acabaram por se concentrar em Guidage em vez de Guilege. De facto, combateu-se muito mais em Guidage do que em Guilege.

Impressiona a descrição que Salgueiro Maia faz desses 50 dias de cerco.

A situação deteriorou-se muito para o exército colonial. Tiveram de tentar intervir. Houve uma altura em que mandaram um batalhão de comandos inteirinho mais uma companhia de paraquedistas tentar desbloquear Guidage e não conseguiram. Nós estávamos em vantagem, obviamente.

Quantos homens estavam lá?

Eu tinha entre 800 e 900.

Com que armas?

Tudo o que pode imaginar. Sobretudo Kalashnikovs, a arma de infantaria por excelência. RPG"s, canhões ligeiros. Uma arma pesada, o Morteiro 120. Era uma combinação disso tudo com o cerco. Cortar a estrada que ligava Guidage a Binta, Binta-Farim, cordão umbilical da Guiné, não deixar passar nada. A situação tornou-se... Eu, francamente, admiro o Salgueiro Maia. Ele aguentou o inaguentável. Sofreu muito lá dentro.

O senhor leu o livro com as descrições dele.

Hum, hum.

Foi assim como ele conta?

[Acena com a cabeça].

E vocês tinham o apoio da população.

Naquela zona praticamente não havia população. Guidage está mesmo em cima da fronteira com o Senegal. É óbvio que utilizávamos o território senegalês também. Foram combates extremamente renhidos.

Há uns três anos fui a Lisboa assistir ao lançamento de um livro, "A Última Missão", de um coronel, na altura capitão-paraquedista. Ele combateu em Guidage, num dos combates perdeu vários homens e não conseguiu levar os restos mortais, teve de os enterrar no local. Então, a última missão é que ele veio cá muitos anos depois do fim da guerra retirar os restos desses soldados para os levar.

E encontrou-os?

Encontrou. Ajudámo-lo em tudo o que pudemos.

Ele contactou-vos para pedir ajuda?

Sim.

[Levanta-se, sai da sala, volta com a "Última Missão", de José de Moura Calheiros]

Isto é um livro que vale a pena ler.

Ele estava com Salgueiro Maia?

Não. Era comandante de uma companhia que foi chamada para tentar desbloquear o Salgueiro Maia. Não conseguiram. Encontrei-o já várias vezes em Lisboa.

Salgueiro Maia aprendeu a respeitar quem combatia. A respeitar a causa que os levava a combater.

E os homens que tinha à frente.

Vocês também os respeitavam?

[pausa] Pode parecer um endeusamento de Cabral, não se trata disso. Mas Cabral nos anos 1960, quando uma boa parte dos movimentos de libertação era um bocado racista também, foi capaz de dizer: nós não estamos a lutar contra os portugueses, estamos a lutar contra um sistema, que é o colonialismo português. Eu diria que fomos educados nisso. A tal ponto que 45 dias depois do 25 de Abril os soldados do PAIGC e do exército português já estavam a beber juntos.

Onde?

Em Farim, por exemplo. E menos de um mês depois já nos tínhamos encontrado na mata. Encontrámo-nos e decidimos que não valia a pena estarmos aos tiros, mais. Na Guiné o cessar-fogo foi negociado muito depois de haver um cessar-fogo real, sem violações.

O cessar-fogo real acontece quando?

Acho que um mês depois do 25 de Abril não houve mais combates.

E entre a declaração de Independência a 24 de Setembro de 1973 e o 25 de Abril de 1974 o que é que aconteceu?

Foi a parte mais violenta da guerra. Melhor, entre Março de 1973 até ao fim da guerra. Conseguimos armas anti-aéreas eficazes. A aviação deixou de contar.

Armas de onde?

Russas. Portáteis, atirava-se do ombro, uma arma extremamente eficiente para aviões a relativamente baixa altitude. E, ao darmos cabo da supremacia aérea do exército colonial, eles ficaram em maus lençóis. Tenho no meu computador a acta da última reunião do Spínola com o seu estado-maior aqui em Bissau, em Maio de 1973. Dá para avaliar a desorientação que se tinha apoderado de Spínola e do seu exército.

Spínola tinha perfeita consciência de que a guerra não estava nada ganha, como se dizia em Lisboa.

Tinha consciência de que não podia ganhar. Podiam aguentar-se ainda muitos anos, à custa de sacrifícios enormes e de perdas crescentes. Mas era óbvio que a vitória não estava no horizonte. Nessa altura começámos a usar carros blindados.

Também russos?

Todas as armas que tínhamos eram de origem russa. Muito provavelmente em breve iríamos usar aviões, já tínhamos pilotos em formação na União Soviética. Há uma entrevista que na altura deu o major Monge, agora general, em que ele diz que não era o PAIGC que estava a construir defesas anti-aéreas, era o exército português. Efectivamente, o exército colonial tinha muito mais homens do que nós...

Quantos tinha o PAIGC?

Operacionais, à volta de 7000. O exército colonial tinha muita tropa a ocupar quartéis mas que não saía, e tinha muito menos tropas que fazia intervenções, comandos, fuzileiros e paraquedistas. De forma que, em termos de gente operacional, nós tínhamos muito mais. Esses 7000 eram todos operacionais. Bons soldados. Não só porque eram formados mas também porque tinham sete, oito anos de experiência de guerra. Um soldado desses é muito difícil de matar.

Os soldados portugueses ficavam aqui menos tempo.

Os desgraçados vinham e ao fim de dois anos, quando começavam a estar aptos para o combate, iam-se embora. Havia uma diferença de qualidade enorme. Não porque o nosso soldado fosse melhor do que o o soldado português em termos anímicos ou outros. É uma questão de experiência.

E de estarem motivadíssimos para uma causa, não?

Também. Isso na guerra conta muito.

Esses 7000 tinham sido treinados fora?

Eram todos daqui. Todos guineenses, e alguns caboverdianos, uma percentagem pequena.

Havia mulheres?

Havia. Mas em unidades militares não. Estavam mais nas forças de auto-defesa. Milícias, como lhes chamávamos. Houve algumas mulheres, uma delas ainda está viva, vi-a há dias. Era enfermeira numa unidade, ia aos combates e, quando havia um ferido retirava-o da frente. Uma mulher extremamente corajosa: Cadi.

Quando se dá a morte de Cabral, o senhor está onde?

Na Rússia. Melhor, na Crimeia. A preparar a questão dos mísseis anti-aéreos.

Fala russo?

Falava um bocadinho. Ainda entendo muita coisa.

Como lhe chegou a notícia da morte de Cabral?

Pela rádio, pela BBC. Fui ter com o comandante russo e pedi-lhe que confirmasse. Ele confirmou uma hora depois. Nessa escola [da Crimeia] encontrávamos formandos do PAIGC, da Frelimo, do MPLA, do ANC. Éramos 200 [do PAIGC] nessa altura. Reuni-os no anfiteatro e dei a notícia. É das cenas mais pungentes a que assisti. Ver soldados que enfrentavam a morte todos os dias a chorar, porque Cabral tinha morrido.

Porque é que Cabral foi morto?

[sorriso] Isso é uma pergunta que toda a gente faz e para a qual ninguém tem resposta. Cada um vem com as suas elocubrações, mas Cabral foi morto pelo colonialismo, isso não tenha dúvidas. Por pessoa interposta ou não. O braço que atirou em Cabral sabemos quem foi, agora quem mandou... Não tenho dúvidas de que foi o colonialismo. E a PIDE em particular.

Porque é que isso não é um facto assente?

Porque não pode ser. Cometeu-se um erro diabólico, que foi ter-se liquidado a maior parte da gente que participou. Sem termos declarações fidedignas deles. A partir daí, torna-se tudo muito nebuloso. A PIDE e o regime colonial terão feito um mau cálculo, que matando Cabral tudo se desmoronava. É falso, não se desmoronou, pelo contrário. Nós perdemos um líder extraordinário. E Portugal também perdeu um líder que podia ter dado uma contribuição decisiva para a descolonização. Perdemos todos. Inclusive quem mandou matar.

Cabral teria feito uma diferença decisiva na descolonização?

Penso que sim.

O que é que ele tinha?

Antes de mais a inteligência. Era um génio. Tudo quanto fez, fez bem. Cursou agronomia, foi um excelente agrónomo, ganhou rios de dinheiro a fazer consultoria, depois foi um excelente político, um excelente diplomata, um excelente chefe de guerrilha. Releio muitas vezes o que escreveu e sempre descubro algo.

Porque é que a Guiné é o primeiro país a declarar independência?

Era na Guiné que a luta de libertação se tinha desenvolvido mais. Tínhamos aquele homem, Cabral. E não foi o PAIGC que proclamou o estado. Cabral sempre quis fazer as coisas com alto grau de legitimidade. O que ele faz? Eleições nas regiões libertadas. Elege os conselheiros regionais e deputados, constitui a Assembleia, e é a Assembleia, os representantes do povo que proclamam a existência do Estado. Não é o PAIGC. Uma démarche única nos movimentos de libertação nacional. Mesmo depois da independência: você olha para a declaração de independência de Angola e foi o MPLA que a proclamou.

Quando é que o senhor conhece Salgueiro Maia?

Pessoalmente, em Portugal, depois da independência. Provavelmente em 1975. Encontrei-me com outros, Carlos Fabião, já aqui na Guiné, Hugo dos Santos, Otelo Saraiva de Carvalho, Vasco Lourenço. As pessoas não imaginam que assim fosse, mas nós tínhamos relações cordiais.

Como se partilhassem uma coisa.

Partilhamos uma história, de facto. Melhor ou pior, de um lado ou de outro.

Encontrou Salgueiro Maia em que circunstâncias?

Não me lembro bem, penso que terá sido um encontro com outras pessoas. Um encontro fortuito.

Não tem memória de uma conversa longa com ele?

Não.

Não conversaram sobre o que aconteceu em Guidage?

Não. Eu não quis tomar a iniciativa. E muito provavelmente ele não sabia que eu estava do outro lado. Penso que era um homem de grande verticalidade e grande coragem. Isso, ele demonstrou na prática. E a gente respeita isso, sempre. Nós, que fomos combatentes, respeitamos o adversário corajoso. Tínhamos um grande respeito pelo Carlos Fabião, um operacional de grande nível. Para ver a que ponto chegam as coisas: o Fabião é que apadrinha a minha entrada para a maçonaria. Não se alongue muito nisto [risos], como deve imaginar. Mas dá-lhe uma ideia do relacionamento.

O que faz hoje no PAIGC?

Tenho uma voz que foi sempre independente, não me coíbo de dizer o que penso. As pessoas respeitam isso. Sou membro do bureau político.

Portanto é ouvido para as decisões. Como olha para este momento, agora?

Não estou pessimista em relação ao futuro. A Guiné tem coisas boas na sua história, quando estabilizar vai tirar proveito delas. Mudou muito de 1974 para aqui, Mesmo que a gente não queira ver. Em 1974, tinha 97 ou 98% de analfabetos. Agora tem 40%. É uma mudança significativa. Para você avaliar os recursos humanos que tínhamos, em 1978 nomearam-me para ministro dos Transportes: eu era a única pessoa em todo o ministério com formação universitária.

Havia 14 licenciados quando foi o 25 de Abril?

Não sei quantos, mas poucos.

E o primeiro liceu foi em...

1958. E com acesso muito limitado.

Ou seja não só os licenciados não chegariam a duas dezenas como as pessoas com ensino secundário eram apenas algumas centenas.

Poucas centenas.

Mas há grande angústia dos jovens agora em relação à promessa que não veem cumprida.

Compreendo. Não há jovem que não queira progredir rapidamente. É salutar.

Como descreveria a actual situação política?

O presidente [José Mário Vaz, conhecido como Jomav] utiliza a Constituição a seu bel prazer. Quando demite o Domingos Simões Pereira - o melhor primeiro-ministro que a Guiné-Bissau já teve -, a única razão que encontrou foi incompatibilidade. Ora, o primeiro-ministro não tem de ser amigo do presidente. Isto não é um regime presidencialista. Depois vem com acusações de corrupção, tudo mentira. Aliás, o Domingos pediu uma comissão de inquérito, que trabalhou, já tem os resultados. Este presidente resolveu assenhorear-se do país. Quer ser primeiro-ministro e não presidente. Quer governar. Donde os problemas que teve com os dois governos do PAIGC. Nenhum aceitou isso.

Como se sai desta situação?

Difícil de dizer. Não acredito muito que se vão cumprir os acordos de Conacri [assinados em 2016 para tentar desbloquear o impasse político], não são fáceis de cumprir. Não acredito também que o presidente vá recuar.

Quando acha realista pensar em eleições?

Se cumprirmos a Constituição, devem realizar-se em Outubro-Novembro de 2018. É claro que há sempre hipótese de haver eleições antecipadas, mas o presidente não quer porque vai perder. Ele tem estado a manobrar no sentido de dominar o PAIGC. Não conseguiu nem vai conseguir.

Há uma pressão internacional para haver eleições na primavera do próximo ano.

Se houver, estamos disponíveis. Mas estou a falar do que diz a Constituição. E como é o presidente que marca as eleições, e ele não quer, seguramente não as vai marcar para a primavera.

Então a Guiné vai ficar um ano e meio...

Penso que antes disso há um golpe de estado [pausa]. Esta situação está-se a tornar insustentável para a maioria.

Estamos na iminência de um golpe de estado?

Sim. Veja, o primeiro-ministro entra na questão tribal e religiosa, o presidente acompanha de certa forma... É o pior que se pode fazer.

Isso é uma questão?

Transformaram isso numa questão. Quando o primeiro-ministro vem dizer que é fula, e agora os fulas é que têm de mandar, os balantas ficam todos com as unhas de fora, e eles são a maioria do exército. É um bocado simplista, mas é isso. No gabinete do primeiro-ministro actualmente só há fulas. Isso é uma coisa que nunca aconteceu na Guiné. É uma coisa, diria mesmo, contranatura, porque a miscigenação interétnica neste pastyssau no bolso. cial do poder para ele. O tipo estum golpe de estadom mas foi um golpe de estado bom. Serviua smociedade portuís é enorme, então em Bissau é quase 100 por cento. É difícil prever conflitos de ordem tribal porque as etnias estão todas misturadas.

Há sinais concretos desse mal estar?

Há. Inclusive nas Forças Armadas.

Da parte dos balantas nas Forças Armadas?

Não só. As Forças Armadas têm bons oficiais e eles eststyssau no bolso. cial do poder para ele. O tipo estum golpe de estadom mas foi um golpe de estado bom. Serviua smociedade portuão conscientes desta situação. Para dizer a verdade, não acredito que haja um golpe para os militares tomarem o poder. Estamos na iminência de haver um golpe de estado, e eventualmente violento, para tirar o presidente, o primeiro-ministro, e provocar eleições rapidamente. Não creio que os militares façam um golpe para se apoderarem do poder.

Diria que esse golpe de estado é necessário?

Um pouco como o 25 de Abril [ri]. O 25 de Abril foi um golpe de estado mas foi um golpe de estado bom. Serviu a sociedade portuguesa.

Está a dizer que estamos na iminência de um golpe de estado bom.

Pode ser.

Esse golpe contaria com o apoio da maioria da população?

Seguramente.

E quem podia assumir o poder até às eleições?

O presidente da Assembleia. É o que está na Constituição.

O presidente não tem noção disso?

Deve ter, mas está perfeitamente obcecado pelo poder. Pelo poder e pelo dinheiro, que para ele é complemento essencial do poder. O tipo está a meter a Guiné-Bissau no bolso. Antes de ele ser eleito, eu já tinha dito aos camaradas do partido: esse tipo vai nos criar grandes dores de cabeça. Ele é um traidor. Claro que o presidente sabe disso e não me pode ver nem com molho de tomate.

Como se juntou ao PAIGC?

O PAIGC mandou um dos seus militantes, Abílio Duarte, que depois veio a ser presidente da Assembleia, organizar o partido em Cabo Verde. Ele foi estudar no liceu onde eu estava, em São Vicente. Era um bocado fraco em matemática, matemática sempre foi o meu forte. e eu dava-lhe uma ajuda. Então, é da boca do Abílio que ouço as primeiras coisas sobre nacionalismo, colonialismo, etc.

Conte-me um pouco sobre a sua família.

Sou de uma família de classe média. O meu pai era comandante da marinha mercante portuguesa. Caboverdiano.

No Mindelo?

Sim. Tirou o curso de piloto na escola náutica do Mindelo, bem antiga. Depois fez o curso de comandante em Portugal. Tenho um tio que também era comandante.

E a sua mãe?

Caboverdiana de São Vicente com pais de São Nicolau. Assim como o meu pai era de São Vicente mas o pai da Boavista. E o meu avô, pai do meu pai, esteve preso em Portugal por ser republicano no tempo da monarquia. Foi preso em Cabo Verde e levado para Lisboa. Por ser republicano e nativista. O advogado de defesa dele foi o Trindade Coelho [risos]. Eu não sabia, o meu irmão é que foi à Torre do Tombo investigar.

Portanto, uma família com consciência política antiga.

Quando saio de Lisboa em fins de 1964 [a caminho da luta do PAIGC], o meu pai é que me foi levar à estação. E ele sabia ao que eu vinha. Não se opôs de maneira nenhuma. Nem a minha mãe, o que ainda é mais estranho [sorri].

Voltando ao liceu no Mindelo...

Terminei e matriculei-me na Faculdade de Ciências com 16 anos. Vou para Lisboa, para um ambiente estudantil de esquerda. O meu irmão já lá estava, a estudar engenharia também. As nossas leituras eram "Os Subterrâneos da Liberdade", de Jorge Amado, coisas desse calibre.

Em 1962 fundámos um comité do partido em Lisboa. E o nosso contacto era um estudante que estava a fazer um doutoramento em matemáticas na Sorbonne. Era um elo entre nós e o secretariado [do PAIGC] em Conacri, veio a ser professor catedrático em Portugal, chamava-se António Saint-Aubin, neto de um inglês que passou por Cabo Verde e ficou. Apesar de a avó ser quase preta, ele era branco, louro, de olhos azuis - acontece muito em Cabo Verde. Então, através dele contactávamos Conacri, e as instruções que recebemos é que aqueles que terminassem os estudos e não tivessem problemas de serviço militar que regressassem ao país de origem. Aqueles que tivessem problemas de serviço militar que saíssem de Lisboa. Quando chego a Paris em 1964, [Amílcar] Cabral passa por lá.

Já o tinha encontrado?

Não.

Como foi?

Bom, era o encontro entre um jovem estudante e o líder confirmado [ri].

Uma figura já lendária para si.

Não propriamente lendária mas era uma figura que considerávamos muito. E eu em particular. É por causa dele que venho parar às Forças Armadas. Eu estava quase a acabar engenharia e Cabral diz-me que precisa mais de soldados do que de engenheiros. De facto, com o desenvolvimento da luta armada aqui na Guiné precisava de gente com alguma capacidade técnica. Então, fomos a Cuba...

De Paris para Cuba?

Paris-Algiers [Argel], Algiers-Cuba. Havia uma velha ideia de desembarcar em Cabo Verde, ainda bem que não levámos isso a cabo, se não era suicídio. Cabral desistiu da ideia. Viemos todos, um grupo de 30 e tal caboverdianos, para a Guiné-Conacri.

Onde já tinha estado?

Nunca. Viemos já integrados em unidades do PAIGC. E com os vários episódios da luta as pessoas foram divergindo, alguns para a esquerda, outros para a direita. Fiz uma carreira militar, entre aspas, até 1974.

Em Bissau

Dn.pt

Domingos Simões Pereira: “POVO GUINEENSE NÃO DEVE CONTINUAR ACEITAR MENTIRA DOS SEUS DIRIGENTES”

O líder do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, defendeu esta quarta-feira, 10 de maio 2017, que o povo guineense não deve continuar aceitar os seus dirigentes a escolherem mentira e a deturpação da realidade como elemento de argumentação.

Domingos Simões Pereira falava numa conferência de imprensa realizada na sede do partido para abordar a actual situação da crise política que assola o país.

O líder do PAIGC acusa José Mário Vaz de se ter baseado em falsas informações para invocar a corrupção como motivo de derrubar o seu governo.

“Invocou a corrupção, fez acusações sobre o executivo que eu liderava e com base nesses elementos, a Assembleia Nacional Popular
criou uma comissão parlamentar de inquérito, governo solicitou a realização de uma auditoria e no final deste trabalho a Comissão Parlamentar de Inquérito chegou a conclusão de que o então primeiro-ministro não estava envolvido em nada que indiciasse algum desvio das regras esta ele dias”, espelhou.

Simões Pereira também sublinhou a questão da auditoria das contas do FUNPI que segundo ele, o relatório aponta indícios aos colaboradres do prsidente da República. Pereira questiona o silêncio do Chefe de Estado sobre este assunto.

“Serão abertos inquéritos judiciais, iremos saber alguma coisa sobre os 12 milhões de dólares americanos cedidos por Angola. O povo será informado sobre procedimentos e os pagamentos dos atrasados internos que aconteceram entre 2009 a 2011 e afinal quem é que andou a roubar o nosso povo? Quem é que andou a desviar o pescado deste país? quem é que deu 14 contentores de areia pesada, alegadamente para análise laboratorial? E a questão da comercialização da madeira”, questionou o político. 

Por: Aguinaldo Ampa
OdemocrataGB 

BRAIMA CAMARÁ CONSIDERA TENDENCIOSO O RELATÓRIO DE AUDITORIA DE FUNPI

O Presidente de Câmara do Comércio, Indústria, Agricultura e Serviços (CCIAS), Braima Camará, considerou esta quarta-feira, 10 de maio 2017, de mentira, falso e tendencioso o relatório de auditoria internacional sobre o Fundo de Promoção da Industrialização de produtos agrícolas (FUNPI) que indicia a CCIAS.

Braima Camará, falava à imprensa à saída de um encontro com os operadores económicos na sede da CCIAS para analisar a evolução da presente campanha de comercialização da castanha de caju. Camará disse que pela primeira vez na história do país, o produtor conseguiu vender castanha de caju no início da campanha por 500 francos CFA (0,76 euros) por cada quilograma.

Aquele responsável do setor privado, adianta ainda que neste momento os produtores estão em condição de vender este produto no valor de 750 a 900 CFA por quilograma em função de volume de estoque que detiver o produtor.

“Enquanto Presidente da CCIAS, não tenho compromisso com nenhum membro do governo, Primeiro-ministro e muito menos com José Mário Vaz [PR]. Tenho, sim, com o setor privado, onde estão produtores, agricultores e empresários”, notou.

Referindo-se às declarações do Chefe de Estado que insurgiu-se esta semana contra a medida do Governo “nociva à economia” que proíbe os estrangeiros de comprarem castanha de caju, o presidente de CCIAS e igualmente conselheiro do presidente da república, considera de muito pertinente o intervenção de José Mário Vaz, na qualidade do “pai de todos os guineenses”. Segundo Camará, só “Burro” é que não muda.

“Pronunciamento do Chefe de Estado sobre este assunto de caju foi uma intervenção pontual e excelente. Neste momento o preço de castanha de caju subiu de 600 a 900 XOF junto do produtor”, assegurou.

De salientar que esta reunião dos operadores económicos, na qual se analisa a presente campanha de caju, ficou inconclusiva e será retomada amanhã.

A castanha de cajú é principal produto comercial que representa 93% das receitas de exportação da Guiné-Bissau e cerca de oitenta por cento (80%) é encaminhada para Índia. 

Por: Aguinaldo Ampa
 OdemocrataGB

Crise Política: GRUPO DOS 15 DEPUTADOS EXIGE APRESENTAÇÃO DE PROVAS DE ESCOLHA DE AUGUSTO OLIVAIS EM CONACRI

O Grupo dos 15 deputados dissidentes da fileira do Partido Africano da Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), exige apresentação de provas que confirmam a escolha do dirigente do partido libertador, Augusto Olivais, como  nome de consenso para liderar o governo, durante as negociações que ocorreram em Conacri, em outubro de 2016.

Em comunicado, que a redação do  Jornal ‘O Democrata’ teve acesso, o “grupo dos 15”  reage às informações avançadas nas redes sociais e em algumas página web, dando conta que o PAIGC anunciara o processo de reintegração dos deputados expulsos daquela formação política e que o Secretariado Nacional do partido convida elementos afetos aos “15” para se dirigirem à Comissão para o diálogo e reconciliação no partido.

Em relação a este processo, o Grupo lamenta o facto de, o alegado comunicado do PAIGC se traduzir numa acentuada ‘má-fé e falta de vontade política’, na medida em que, diz os dissidentes, a direção do partido libertador sabe que a reintegração não se opera através de um comunicado de boas intenções, mas sim, por decisões dos órgãos jurisdicionais do partido que, por ser independente nos termos estatutários, nenhum comunicado anula e nem se sobrepõe as deliberações do Conselho Nacional de Jurisdição do PAIGC.

Aliás, o grupo lembra no seu comunicado que num passado recente, em 2013, uma vaga de reintegração de militantes e dirigentes do PAIGC teve lugar por via de um indulto por este órgão de jurisdição e, apresentado numa reunião do Comité Central.

“O Grupo dos 15 que sempre manifestou a sua total disponibilidade e abertura ao diálogo político interno no seio do PAIGC, vem relembrar mais uma vez, que foi o próprio presidente do PAIGC que numa conferência de imprensa afirma categoricamente que a questão da reintegração dos 15 está definitivamente posta de lado, tal como referiu em Conacri, que a questão do Grupo dos 15 era um falso problema”, lê-se no comunicado.

No entanto, o Grupo dos 15, denuncia no seu comunicado, a ligação estreita entre o objetivo da carta endereçada pelo primeiro vice-presidente do PAIGC ao Representante Especial do Presidente da Comissão da CEDEAO, no passado dia 25 de Abril, e a iniciativa de uma ‘pseudointegração’, para provocar a queda do governo, pondo em causa a implementação dos Acordos de Conacri,

“Esta é a razão fundamental desta enorme aberração da Direção do PAIGC em propor uma nova redação da alínea h) do Comunicado da Missão Ministerial da CEDEAO, para implicar diretamente o Presidente da República, por forma a não reconhecer o atual governo e pressionar o Presidente a demiti-lo, como aliás, o próprio presidente do PAIGC exigiu numa conferência de imprensa dos partidos que boicotam a iniciativa de diálogo do primeiro-ministro”, diz o comunicado.

Para ilustrar aquilo que considera da “hipocrisia política” da atual direção do partido, o grupo avança no comunicado que a direção superior do PAIGC, ordenou e executou o afastamento de responsáveis do partido na Comissão Política na secção de Portogole, sector de Mansoa, Região de Oio, usurpando as competências da conferência de secção, sem contar ainda com outras tentativas de afastamento de responsáveis políticos nos círculos eleitorais 27 e 29, em Bissau.

O Grupo apela a todos os militantes, responsáveis e dirigentes do PAIGC, no sentido de manterem-se atentos e vigilantes a quaisquer manobras políticas internas contra a unidade e coesão interna do partido de Cabral, bem como a estabilidade política e a paz social no país. 

Por: Assana Sambú
OdemocrataGB