UMARO DJAU II
Qualquer cidadão nacional -- dentro das suas liberdades -- tem o seu dever de expressar livremente o seu desagrado sobre qualquer assunto nacional, regional ou internacional.
Todavia, não posso concordar com certas atitudes desprovidas de quaisquer justificações patrióticas, nacionais e estratégicas.
Por exemplo, como é que uma pessoa devidamente equipada (politica, académica e intelectualmente) pode insurgir-se contra o estabelecimento de boas relações de amizade e de cooperação entre a Guiné-Bissau e os seus países vizinhos?
Uma tal postura já teve custos muitos elevados para o país em várias décadas de independência.
Por exemplo, em 1980 quando a Guiné-Bissau se “insurgiu” (política e diplomaticamente) contra o Cabo Verde, muitos guineenses aplaudiram. Mas, hoje em dia, todos sabem o resto da história. Para além de ser um exemplo entre as democracias africanas, Cabo Verde ocupa o lugar 122 do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e a Guiné-Bissau ocupa a posição número 178, entre os 11 países menos desenvolvidos do mundo, de acordo com os dados de 2016.
Mas, muito cedo, países como o Cabo Verde perceberam de que, para qualquer país, o "interesse nacional" afigura-se como o aspecto mais importante no relacionamento regional e internacional.
Infelizmente, muitos guineenses (falo dos quadros guineenses), devido à tremenda limitação "técnica", não têm sabido separar as suas querelas políticas nacionais da necessidade de defender conjuntamente e inequivocamente os nossos interesses nacionais, regionais e internacionais.
Daí que uns tenham aplaudido a forma como o actual Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, evitara visitar o país e tendo inclusive desenvolvido incessantemente campanhas contra os parceiros regionais mais vitais da Guiné-Bissau: O Senegal, a Gâmbia, a Guiné-Conacri, a Nigéria, para citar poucos.
E para ser mais especifico, já li também várias campanhas, tanto nos blogues como nas redes sociais, contra a visita agendada do Presidente senegalês Macky Sall à Guiné-Bissau.
Neste momento particular da sua vida e história, a Guiné-Bissau precisa (e depende) do Senegal para satisfazer as suas necessidades mais básicas da sua importação -- alimentação, combustíveis, materiais de construção, comunicação global, etc., etc. O mesmo se diz em relação à nossa inserção regional -- CEDEAO, UEMOA, entre outras organizações. O mesmo se diz em relação às outras iniciativas bilaterais de desenvolvimento -- o acordo de gestão e de cooperação na zona marítima comum com o Senegal e o Aproveitamento da Bacia do Rio Gâmbia (OMVG). O mesmo se diz em relação ao aperfeiçoamento técnico dos quadros guineenses, sobretudo no sector bancário, turismo e da tecnologia.
A Guiné-Bissau precisa de aliados e de amigos. E as tais alianças são frequentemente forjadas e favorecidas pelos relacionamentos pessoais entre líderes dos países em questão, sem perder de vista, o interesse nacional de cada parte.
Se o Presidente senegalês tem um bom relacionamento com o Chefe de Estado guineense e o seu primeiro-ministro, é a inteira Guiné-Bissau que beneficiará de um tal ambiente político e geoestratégico. Se o Rei marroquino tem um bom relacionamento com o Chefe de Estado guineense, é a inteira Guiné-Bissau que beneficiará de um tal ambiente político e geoestratégico. E para quem já viajou através da Casablanca, sabe que o Marrocos é agora a plataforma giratória (hub) mais significativa de voos regionais e internacionais para toda a costa ocidental africana. E a Guiné-Bissau só tem que ganhar com uma boa relação com um tal país. Estes são apenas alguns exemplos sobre a importância da cooperação regional e a necessidade da sua preservação e aprofundamento.
Exemplo mundial recente: presidente Donald Trump terá sido o primeiro (talvez o único) estadista dos países ocidentais a felicitar o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan pela sua vitória no problemático referendo. Justificação política? O interesse nacional dos EUA, sobretudo no tocante à sua necessidade de contar com a Turquia na sua luta contra o Estado Islâmico na Síria e no Iraque.
Portanto, caros compatriotas, deixemos de culpar o Senegal, a Gâmbia, e a Guiné-Conacri pelos nossos problemas crónicos e conjunturais. Um bom ponto de partida seria deixar de se influenciar por animosidades fúteis, retrógradas e sem fundamentos.
O Senegal, a Gâmbia e a Guiné-Conacri -- por uma questão de "interesses nacionais" dos seus respectivos países -- têm e terão sempre a legitimidade de investirem nos seus interesses políticos no nosso território nacional. A Guiné-Bissau tem também o mesmo direito, se assim estender. Aliás, os apoios incondicionais de Guiné-Conacri e do Senegal às causas das independências da Guiné e de Cabo Verde foram investimentos políticos (e históricos) dignos de sublinhar no quadro da solidareidade regional.
Os que já alguma vez estudaram os princípios básicos da diplomacia e das relações internacionais sabem que assim é em vários quadrantes do mundo. E assim será também em relação à Guiné-Bissau, independentemente da sua actual situação política. Aliás, hoje em dia, as relações regionais são àquelas que se apresentam como as mais valiosas (mais eficientes e menos custosas) para países específicos, nomeadamente a gestão comum de recursos, o comércio, os transportes, a segurança interna e regional, as relações informais e transfronteiriças, assim como outros interesses geoestratégicos ou transnacionais.
E é dentro desta lógica que os quadros guineenses devem estudar e entender a noção básica de interesse nacional, da cooperação e das relações internacionais. E quando assim for, começaremos a abraçar causas e acções internas e regionais mais justificadas e mais inteligentes. E no processo, seremos capazes de educar os mais jovens sobre as formas mais estratégicas de defendermos o nosso bem comum, com a devida firmeza, astúcia e seriedade.
Umaro Djau, 19 de Abril de 2017
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