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quinta-feira, 14 de junho de 2018

Um Mundial de alto risco... até para Putin

Numa fase de tensão nas relações entre Moscovo e o Ocidente, a Rússia joga neste Campeonato do Mundo a sua imagem internacional

Durante as próximas quatro semanas, a Rússia de Putin vai estar sob os olhares do Mundo

As grandes competições desportivas tiveram desde sempre, dos Jogos da Grécia clássica aos Jogos Olímpicos da era moderna ou aos Mundiais ou Europeus de futebol, uma enorme carga simbólica e uma vincada dimensão política.

Há 38 anos, em plena Guerra Fria, o Ocidente reagiu à intervenção soviética no Afeganistão boicotando os Jogos Olímpicos de 1980 em Moscovo - e roubando assim grande parte do brilho a uma ocasião desportiva e política em que a URSS tanto apostara.

Poucas vezes a realização de uma prova desportiva internacional terá, ainda assim, assumido um peso político tão marcado como este Mundial da Rússia. Numa fase de forte crispação nas relações entre a Rússia e o Ocidente estará muito mais em jogo do que a disputa do título mundial de futebol nas próximas quatro semanas na Rússia. Um Mundial bem-sucedido constituirá um momento de afirmação da Rússia no plano internacional.

Eventuais perturbações no decorrer da competição ou incidentes graves poderão estragar a festa e agravar ainda o clima de tensão nas relações entre a Rússia e o Ocidente.

A Rússia jogou recentemente a sua imagem no Mundo noutra grande competição internacional. Os Jogos Olímpicos de Inverno de 2014, em Sochi, deixaram, nesta perspetiva, um balanço mitigado. A preparação dos Jogos ficou marcada por polémicas envolvendo os elevados custos e acusações de corrupção, e o êxito dos atletas russos seria depois manchado pelas acusações de doping. No plano político, os Jogos de Sochi seriam ensombrados pelas críticas internacionais ao regime de Putin e depois pelas incidências da crise na Ucrânia. A chanceler alemã Angela Merkel, o presidente francês François Hollande e outros líderes europeus recusaram-se a marcar presença em Sochi em reação às alegadas perseguições aos homossexuais na Rússia.

Este Mundial 2018 representa assim um formidável desafio para a Rússia em matéria de organização, de segurança e de grande ocasião mediática. Em termos de organização e segurança a Rússia já passou o primeiro teste coma Taça das Confederações do ano passado, mas desta feita o teste tem outras dimensões, quer no plano desportivo quer, sobretudo, em matéria política.

Ameaças de boicote

A tensão política que envolve este Mundial 2018 esteve logo marcada no momento em que, em Dezembro de 2010, foi anunciada a vitória da candidatura russa à organização da prova. As relações entre a Rússia e o Ocidente atravessaram desde então dias atribulados - da crise ucraniana e da anexação russa da Crimeia, em março de 2014, ao apoio russo a Bashar al-Assad, na Síria, ou, mais recentemente, ao caso Skripal -, e a cada crise a ameaça de boicote aflorou nos discursos políticos no Ocidente.

Já em setembro de 2014, em plena crise da Crimeia, a Al Jazeera referia que o vice-primeiro ministro britânico Nick Clegg falava da hipótese do boicote ao Mundial da Rússia como uma "poderosa sanção política e simbólica". E o El País adiantava que a Comissão Europeia chegou a considerar a hipótese de um boicote do Mundial 2018 no quadro das sanções à Rússia pela crise na Ucrânia.

Mais recentemente o caso Skripal, o misterioso episódio do envenenamento de um ex-espião russo no sul de Inglaterra, envenenou as já difíceis relações entre Londres e Moscovo. O Governo de Theresa May denunciou "mão" do Kremlin no caso, a imprensa britânica anunciou que nenhum membro da família real ou do Executivo britânico honraria com a sua presença o Mundial da Rússia. Dias depois a Islândia anunciava que os responsáveis políticos de Reiquejavique não marcariam presença no Mundial.

De acordo com o Daily Mail responsáveis britânicos discutiram mesmo com os aliados europeus a hipótese de um boicote coordenado ao Mundial e terá sido evocada a hipótese de a própria seleção inglesa se recusar a marcar presença na Rússia. Os apelos ao boicote não tiveram porém eco significativo, mas testemunharam uma vez mais a carga política que rodeia desde há muito este Mundial.

O peso das tensões entre a Rússia e o Ocidente confere a alguns momentos deste torneio da Rússia uma carga simbólica muito especial. Será em particular o caso de Kaliningrado, um enclave russo no Báltico, encravado entre os territórios da Polónia e a Lituânia, ambos membros da NATO e da União Europeia. Uma faixa de território fortemente militarizada, sede da esquadra russa do Báltico, e que tem sido, em particular desde a crise da Ucrânia de 2013-2014, palco de uma alta tensão militar entre a Rússia e a NATO. Ao mesmo tempo, Moscovo tem procurado afirmar a modernidade e o desenvolvimento do enclave, transformando Kaliningrado numa zona económica livre que lhe mereceu o epíteto de "Hong Kong da Rússia". Os quatro encontros do Mundial aprazados para o novíssimo estádio Arena Baltika, construído expressamente para a ocasião, decorrerão a poucos quilómetros da fronteira polaca - e do forte dispositivo militar da NATO.

Os fantasmas de Marselha

Outro dos grandes desafios que se coloca às autoridades russas é o da segurança dos adeptos. A questão coloca-se de forma muito particular em relação aos apoiantes da seleção inglesa. Estão ainda presente na memória os violentos confrontos de há dois anos, no Europeu de França, entre adeptos russos e ingleses antes e depois do encontro entre as duas seleções em Marselha. A venda de bilhetes para este Mundial da Rússia em Inglaterra foi significativamente mais baixa do que em anteriores edições.

A Rússia foi obrigada a um esforço particular na prevenção de incidentes entre claques dentro e fora dos estádios. A má fama deixada pelos hooligans russos em Marselha agravou-se ainda nos últimos meses com a repetição de incidentes graves como as manifestações de racismo visando jogadores franceses de origem africana durante um encontro amigável com a Rússia em São Petersburgo. Os adeptos russos já referenciados pelas autoridades, entre eles muitos dos que participaram nos incidentes de Marselha, têm sido obrigados a apresentar-se regularmente à polícia e advertidos contra quaisquer incidentes violentos e alguns obrigados mesmo a assumir compromissos por escrito.

A fama dos hooligans ingleses nada lhes fica a dever. Ainda num recente amigável Holanda-Inglaterra registaram-se incidentes graves provocados pelos seguidores das cores inglesas. As polícias russa e britânica trocaram informações ao longo dos últimos tempos e estudaram ações coordenadas para prevenir a repetição do cenário de Marselha.

As relações tensas entre Londres e Moscovo - e que se refletem por exemplo numa clara diminuição do turismo britânico na Rússia - pesam também na situação dado o frequente envolvimento de expressões nacionalistas na violência das claques.

Sob os olhares do Mundo

Durante as próximas quatro semanas a Rússia de Putin vai estar sob os olhares do Mundo e os holofotes de uma imprensa internacional que os russos tendem a ver como hostil ao país. A juntar às crises internacionais, o regime de Putin tem sido acusado no Ocidente de deriva autocrática, de desrespeito pelas normas democráticas e pelos direitos humanos, de homofobia, ou de perseguição à comunidade LGTB. Praticamente no início do seu quarto mandato à frente dos destinos do Kremlin, é o próprio regime Putin que estará em jogo neste Mundial.

Palco onde estarão concentradas as atenções de todo o Mundo, não deixa de representar uma ocasião particularmente tentadora para as mais diversas manifestações de ordem política e social ou mesmo para incidentes mais graves.

Desacatos mais sérios entre adeptos, manifestações que levem a uma intervenção policial mais musculada bastariam para manchar gravemente a grande ocasião e transformar o Mundial da Rússia num fracasso humilhante para Moscovo e para gerar uma potencial crise política e diplomática. As autoridades russas tomaram igualmente medidas particulares para prevenir a eventual ameaça de um atentado terrorista em plena competição. Situações de grande tensão como a do leste da Ucrânia ou da Síria não deixam igualmente de pesar como uma ameaça potencial ao bom andamento deste Mundial.

dn.pt

sábado, 13 de abril de 2024

EUA apuram que China aumentou vendas para esforço de guerra russo

© Getty Images

Por Lusa   12/04/24
A China aumentou as vendas para a Rússia de máquinas-ferramenta, microeletrónica e outras tecnologias que Moscovo aproveita para produzir mísseis, tanques, aeronaves e armamento para utilização na Ucrânia, de acordo com uma avaliação dos Estados Unidos.


Dois altos funcionários da administração norte-americana citados sob anonimato pela agência Associated Press, disseram que em 2023 cerca de 90% da microeletrónica da Rússia teve proveniência na China e que a Rússia usou para fabricar mísseis, tanques e aeronaves.

Quase 70% dos cerca de 900 milhões de dólares (845 milhões de euros) em importações de máquinas-ferramenta da Rússia no último trimestre de 2023 também tiveram origem chinesa.

Entidades chinesas e russas têm trabalhado para produzir conjuntamente veículos aéreos não tripulados na Rússia, e empresas da China estarão a fornecer a nitrocelulose necessária para fabricar armas com propulsão, indicaram as mesmas fontes.

Pequim também está a trabalhar com a Rússia para melhorar os seus satélite e outras capacidades espaciais para utilização na Ucrânia, um desenvolvimento que os altos funcionários dizem que poderá, a longo prazo, aumentar a ameaça que a Rússia representa em toda a Europa.

Os funcionários, citando descobertas dos serviços de informação, disseram que os Estados apuraram ainda que a China está a fornecer imagens à Rússia para a sua guerra contra a Ucrânia.

O Presidente norte-americano, Joe Biden, já tinha levantado as suas preocupações diretamente ao homólogo chinês, Xi Jinping, sobre o apoio indireto de Pequim ao esforço de guerra da Rússia, antes de uma visita que o chefe da diplomacia de Washington, Antony Blinken, deverá realizar este mês à capital da China.

Embora a China não tenha fornecido apoio militar letal direto à Rússia, Pequim responsabiliza o Ocidente por provocar a decisão do Presidente russo, Vladimir Putin, de lançar a guerra na Ucrânia, em fevereiro de 2022, e absteve-se de lhe chamar uma invasão em deferência ao Kremlin.

A China também afirmou que não está a fornecer armas ou assistência militar à Rússia, mas mantém ligações económicas robustas com Moscovo, ao lado da Índia e de outros países não ocidentais, apesar das sanções de Washington e dos seus aliados.

Xi reuniu-se em Pequim na terça-feira com o ministro dos Negócios Estrangeiros da Rússia, Serguei Lavrov, que elogiou a liderança do líder chinês.

O crescente isolamento económico e diplomático da Rússia tornou-a cada vez mais dependente da China, o seu antigo rival na liderança do bloco comunista durante a Guerra Fria.

A secretária do Tesouro, Janet Yellen, que regressou a Washington esta semana após uma visita a Pequim, disse que alertou as autoridades chinesas que a administração de Joe Biden estava preparada para sancionar bancos, empresas e a liderança da China se ajudarem as forças armadas da Rússia na sua invasão da Ucrânia.

O Presidente norte-americano emitiu uma ordem executiva em dezembro dando a Yellen autoridade para sancionar instituições financeiras que ajudassem o complexo industrial militar da Rússia.

"Continuamos preocupados com o papel que quaisquer empresas, incluindo as da República Popular da China, estão a desempenhar nas aquisições militares da Rússia", disse Yellen aos jornalistas, avisando que "enfrentarão consequências significativas se o fizerem".

Janet Yellen reforçou que quaisquer bancos que facilitem transações significativas que canalizem bens militares ou de dupla utilização para a base industrial de defesa da Rússia expõe-se ao risco das sanções dos Estados Unidos.

Ao mesmo tempo, a China anunciou na quinta-feira raras sanções contra duas empresas de defesa dos Estados Unidos devido ao alegado apoio à venda de armas a Taiwan, a ilha democrática autónoma que Pequim reivindica como seu território.

O anúncio congela os ativos da General Atomics Aeronautical Systems e da General Dynamics Land Systems mantidos na China. Também proíbe a entrada da administração das empresas no país.

Os registos mostram que a General Dynamics opera meia dúzia de operações da Gulfstream e de serviços de aviação a jato na China, que continua fortemente dependente de tecnologia aeroespacial estrangeira, mesmo enquanto tenta construir sua própria presença no setor.

A empresa também ajuda a fabricar o tanque Abrams que está a ser adquirido por Taiwan para substituir equipamentos desatualizados.

A General Atomics produz os 'drones' Predator e Reaper usados pelos militares norte-americanos.



Leia Também: Trump "deixou claro que achava que a Ucrânia deve fazer parte da Rússia"  

quinta-feira, 9 de maio de 2024

Rússia celebra o terceiro Dia da Vitória sem vitórias para Putin

Militares russos realizam ensaio geral para o desfile do Dia da Vitória (EPA/LUSA)
João Guerreiro Rodrigues  Cnnportugal.iol.pt  09/05/2024

Rússia prepara-se para celebrar o terceiro Dia da Vitória desde que começou a guerra na Ucrânia e o seu significado está a mudar diante dos nossos olhos

Para a Rússia, o dia 9 de maio é uma data complexa. O Dia da Vitória é uma data que celebra não só os sacrifícios feitos pela União Soviética no combate aos nazis, durante a Segunda Guerra Mundial, mas também serve como uma demonstração de poder militar e da grandeza da Rússia. Só que desde 2022 que os russos têm traçado a conquista de vários territórios ucranianos para coincidirem com esta data, mas Vladimir Putin não tem tido muito para apresentar ao país.


Este ano, a chefia militar russa definiu a conquista da cidade de Chasiv Yar como um dos principais objetivos para a data. Esta cidade ucraniana, vizinha de Bakhmut, está a aguentar há semanas alguns dos mais violentos bombardeamentos que atingem a linha da frente. Em abril, o próprio comandante-chefe da Ucrânia, Oleksandr, Syrskyi, admitia que a situação neste ponto da frente tinha “deteriorado significativamente”, depois de a Rússia ter definido a conquista desta cidade até ao dia 9 de maio.

O motivo era claro. Para a Rússia, esta cidade é vital para os seus objetivos na região do Donbass. Apesar de pequena, Chasiv Yar, que tinha apenas 12 mil habitantes antes da guerra começar, serve de nó logístico para o exército ucraniano na frente de Bakhmut. É a partir desta localidade que é distribuído todo o equipamento para as unidades que se encontram nesta frente.

Se a Rússia a conseguisse conquistar, colocava em causa o apoio logístico de toda a região, o que podia permitir ao exército russo aumentar a pressão nesta área. Se isso acontecer, a Rússia fica com o caminho aberto para Kostiantynivka, Druzhkivka, Kramatorsk e Sloviansk, os últimos grandes bastiões de Donetsk.

Mapa da Ucrânia após conquista de Avdiivka (CNN)
Nas últimas semanas de abril, a situação parecia mesmo ser uma possibilidade realista, com a Rússia a explorar a falta de munições antiaéreas e de artilharia ucranianas. Mas após a aprovação do pacote de ajuda militar norte-americano, os soldados ucranianos têm conseguido conter os ataques dos mais de 25 mil soldados russos que se encontram na região.

Não é a primeira vez que a Rússia estabelece metas de conquista territorial para o dia 9 de maio. Durante dez meses, Moscovo atirou tudo o que tinha para tentar conquistar a cidade de Bakhmut. Foi no início de 2023, quando o Grupo Wagner intensificou as suas operações na cidade, levando a algumas das mais sangrentas batalhas de toda a guerra, e que seriam decisivas para o desfecho de Yevgeny Prigozhin, icónico líder do grupo paramilitar. Segundo fontes ocidentais, a Rússia chegou a sofrer 60 mil baixas, entre as quais 20 mil mortos. Foi preciso esperar até ao dia 20 de maio para a cidade cair nas mãos russas.

E isso teve repercussões nas celebrações em Moscovo. Todos os anos, centenas de carros de combate desfilam nas ruas da capital. Mas, se na parada de 2022, o T-34, um icónico carro de combate muito utilizado na Segunda Guerra Mundial, foi acompanhado por vários dos mais modernos T-90 e T-14, o mesmo não aconteceu na cerimónia do ano passado. Nenhum destes modelos esteve presente, devido à intensificação do conflito. Em vez disso, o T-34 foi acompanhado por uma coluna de veículos de combate polivalentes, mas muito menos valiosos, o Tigr.

De fora ficou também a habitual passagem aérea sobre a Praça Vermelha, apesar de as previsões meteorológicas apontarem para um céu relativamente limpo sobre Moscovo.

Visíveis estiveram apenas os habituais elementos de propaganda militar russa, os lançadores de mísseis balísticos intercontinentais Yars, que fazem parte do arsenal nuclear de Moscovo, e o sistema de defesa aérea S-400, que a Rússia descreve como sendo o mecanismo mais evoluído do mundo.

Ao invés de demonstrar o seu poderio militar, numa altura difícil no campo de batalha, Vladimir Putin focou-se em apresentar-se como salvador e defensor de uma Rússia em apuros, alvo das “elites globalistas” do Ocidente. “Hoje, a civilização está novamente num ponto de rutura”, disse Putin. “Mais uma vez, foi desencadeada uma verdadeira guerra contra a nossa pátria”.

Em 2022, a expectativa era diferente. Embora não houvesse um objetivo geográfico delineado, uma vez que a Rússia ainda contava manter grande parte do território ucraniano, um medo pairava no ar. Várias fontes ocidentais temiam que o presidente russo declarasse formalmente guerra à Ucrânia a 9 de maio, decisão que permitiria a mobilização total das forças de reserva da Rússia, numa altura em que estas ainda não tinham sido convocadas.

Este ano, a expectativa mantém-se, mas com uma “conta” cada vez mais pesada para apresentar ao povo russo. Segundo o ministro das Forças Armadas do Reino Unido, Leo Docherty, a Rússia conta com mais de 450 mil baixas, entre os quais 150 mil mortos. Mas as perdas materiais também são significativas, com as fontes ocidentais a estimarem que mais de dez mil veículos blindados tenham sido destruídos pela Ucrânia.

A cada ano que passa, assistimos ao regime de Vladimir Putin a moldar um dos principais mitos coletivos russos em algo completamente diferente. “Eles transformaram este mito unificador que a Rússia tinha numa justificação para uma guerra real”, afirma Maxim Trudolyubov, um jornalista russo. “Isto virou subtilmente tudo de cabeça para baixo – transformou um culto à vitória num culto à guerra.”

 

 Leia Também: Dia da Vitória. Rússia celebra hoje um dos seus feriados mais importantes  

 

 Leia Também: "A Rússia fará tudo para evitar um confronto global. Mas, ao mesmo tempo, não permitiremos que ninguém nos ameace. As nossas forças estratégicas [nucleares] estão sempre em alerta", declarou o Presidente russo.  


quinta-feira, 12 de maio de 2022

Rússia perde batalhão que tentava atravessar ponte em Lugansk... Militares russos tentavam avançar para oeste, mas os seus movimentos foram captados por um drone ucraniano.

© Twitter

Notícias ao Minuto  12/05/22 

O exército russo sofreu perdas consideráveis depois de os militares ucranianos terem feito explodir uma ponte sobre o rio Donets, na região de Lugansk.

Entre as perdas incluem-se três dezenas de tanques militares e vários militares mortos, que estariam a tentar atravessar a ponte, reporta o The Independent.

A artilharia ucraniana apanhou-os junto ainda à margem do rio e considera, segundo refere, por sua vez, a The Forbes, que o ataque impediu os avanços da Rússia na região do Donbass.

O rio Donets, que se desloca do sul da Rússia para o leste da Ucrânia, é uma das várias barreiras de água que os batalhões russos têm de atravessar para avançar para oeste, para o território ucraniano.

De acordo com as forças armadas ucranianas, o batalhão que foi apanhado na ponte estava a tentar atacar Lyman, uma cidade de 20 mil habitantes.

A passagem do batalhão terá sido 'apanhada' por um drone da 17.ª Brigada de Tanques da Ucrânia.

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O Presidente russo, Vladimir Putin, acusou hoje o Ocidente de sacrificar o resto do mundo para manter o seu domínio global, incluindo através de sanções económicas contra a Rússia, que disse estarem a criar uma crise planetária.

"Estas sanções estão a provocar em grande parte a crise global. Os seus autores, guiados por ambições políticas míopes e inflamadas, pela russofobia, prejudicam os seus próprios interesses nacionais, as suas próprias economias, o bem-estar dos seus cidadãos", disse, num encontro com membros do seu governo sobre a economia.

A Rússia é o segundo maior produtor de cereais depois da Ucrânia e a guerra desencadeada pelas tropas de Putin em território ucraniano ameaça criar problemas alimentares a nível global, como já alertaram organizações internacionais.

Numa videoconferência com membros do Governo hoje, o Presidente russo revelou que a colheita de cereais na Rússia poderá ultrapassar as 130 milhões de toneladas em 2022, das quais 87 milhões de trigo...Ler Mais


A Rússia avisou hoje a Finlândia de que será forçada a tomar medidas de retaliação, "tanto técnico-militares como outras", se violar as suas obrigações jurídicas internacionais e aderir à NATO.

"A adesão da Finlândia à NATO causará sérios danos às relações bilaterais Rússia-Finlândia (...). A Rússia será forçada a tomar medidas de retaliação, tanto técnico-militares como outras, a fim de pôr termo às ameaças à sua segurança nacional que surjam a este respeito", lê-se num comunicado do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo.

O comunicado foi divulgado poucas horas depois de o Presidente e a primeira-ministra da Finlândia terem anunciado o seu apoio à adesão do país nórdico à Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO)... Ler Mais   


A Rússia alertou hoje que a ajuda militar ocidental à Ucrânia e os exercícios da NATO perto das suas fronteiras aumentam a probabilidade de um conflito direto e o risco de uma guerra nuclear total. 

 O alerta, feito pelo vice-presidente do Conselho de Segurança russo, Dmitri Medvedev, surgiu no dia em que o Presidente e a primeira-ministra finlandeses divulgaram o seu apoio à adesão da Finlândia à Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO).

Medvedev não menciona a possibilidade de a Finlândia e a Suécia poderem aderir à NATO, mas acusa os países da Aliança Atlântica de estarem a aumentar o risco de uma guerra total com o seu apoio militar à Ucrânia na guerra com a Rússia.

"Os países da NATO a fornecer armas à Ucrânia, a treinar as suas tropas para utilizar equipamento ocidental, a enviar mercenários e os exercícios por países da Aliança perto das nossas fronteiras aumentam a probabilidade de um conflito direto e aberto entre a NATO e a Rússia, em vez da 'guerra por procuração' que estão a travar", escreveu Medvedev na rede social Telegram...Ler Mais


Intenção, há muito falada, foi hoje anunciada. Pedido oficial deve ser feito na segunda-feira.

O Kremlin já reagiu à decisão da Finlândia, que esta quinta-feira anunciou que se quer juntar à NATO, noticia a Sky News.

Moscovo considera que a decisão "é uma ameaça" para a Rússia, e salientou que a expansão da aliança militar não irá reforçar a estabilidade e a segurança na Europa ou no resto do mundo.

O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, considera que todos devem querer evitar um conflito direto entre a Rússia e a Aliança Atlântica. Contudo, considera que a Finlândia deveria arrepender-se da sua decisão já que esta representa "definitivamente" uma ameaça para a Rússia e "uma razão para uma resposta" na mesma medida.

Recorde-se que o presidente da Finlândia, Sauli Niinisto, e a primeira-ministra, Sanna Marin, anunciaram, esta quinta-feira, que são a favor da adesão do país à aliança transatlântica NATO e que o pedido de adesão deve ser feito “rapidamente”.


sábado, 3 de junho de 2023

As táticas transfronteiriças da Ucrânia têm como objetivo desestabilizar a Rússia. A julgar pela resposta, estão a funcionar

Prédio de vários andares danificado após um alegado ataque de drones em Moscovo, Rússia. Lev Sergeev/Reuters

Por CNN,  Análise de Sam Kiley  03/06/23

Porque os esforços da Ucrânia para abalar a Rússia estão a funcionar

A Ucrânia abriu uma nova frente na sua batalha para expulsar o invasor russo - na Rússia. Mas é estranhamente tímida em admitir que enviou tropas, disparou artilharia e pilotou drones para o território do seu vizinho.

As operações de cidadãos russos, com identificação militar ucraniana, vestindo uniformes ucranianos e atacando a partir da Ucrânia, permanecem oficialmente opacas. É a contribuição de Kiev para o que se tornou conhecido como "guerra híbrida" na "zona cinzenta" do conflito contemporâneo.

Os dois termos geraram livros e um tsunami de opiniões entusiasmadas de um exército de especialistas quando a Rússia invadiu a Ucrânia pela primeira vez, em 2014.

Nessa altura, apareceram na Crimeia "homenzinhos verdes" com peculiares uniformes de caça desportiva de dois tons - e fardas militares russas.

Quando foi sugerido que talvez, apenas talvez, estes homens fossem de facto tropas russas, Vladimir Putin gracejou: "Pode ir a uma loja e comprar qualquer tipo de uniforme."

A posição oficial de Moscovo era que os homens que hastearam a bandeira russa sobre Simferopol e invadiram o parlamento local da Crimeia eram "unidades de autodefesa" de ucranianos pró-russos ansiosos por colocar o seu território sob o domínio de Moscovo.

Quando Moscovo admitiu que as suas tropas estavam realmente na Ucrânia, uma grande parte da antiga nação soviética, com 14 anos de existência, já estava sob o controlo de Putin.

Combatentes do Corpo de Voluntários Russos e do grupo aliado, a Legião da Liberdade da Rússia, ao lado de um veículo blindado apreendido, em 24 de maio de 2023. Sergey Bobok/AFP/Getty Images

Agora, em pequena escala, a Ucrânia está a adaptar essas mesmas táticas para tentar garantir um efeito estratégico.

O Corpo de Voluntários Russos e a Legião da Liberdade para a Rússia - que estão sob a alçada da estrutura dos Serviços de Informações de Defesa da Ucrânia - têm efetuado pequenos ataques transfronteiriços à Rússia.

O principal objetivo? Desestabilização.

Embora a terminologia e os métodos possam ter evoluído, a tática não tem nada de novo. Para além da Rússia, os regimes de apartheid da África do Sul utilizaram técnicas semelhantes durante as décadas de 1970 e 1980, atacando os Estados na linha da frente - Angola, Zâmbia, Zimbabué e Moçambique.

Pretória enviou tropas em incursões transfronteiriças para desestabilizar as nações africanas independentes que se opunham ao seu regime racista. Faziam-se frequentemente passar por combatentes da libertação local em ataques clássicos de "falsa bandeira" contra civis, tentando minar o apoio aos movimentos de libertação.

Estes grupos eram frequentemente formados por combatentes de Angola ou do Zimbabué, para dar "autenticidade" às atrocidades que esperavam atribuir a outros. Eram muitas vezes liderados por homens brancos camuflados de negros.

O objetivo a longo prazo - e, muitas vezes, o resultado - era manter permanentemente desequilibradas as nações que apoiavam a luta de libertação interna da África do Sul.

Rússia agitada

Na Ucrânia, convém a Kiev que os russos invadam a Rússia em seu nome.

Os resultados táticos podem ser limitados. Breves incursões em pequenas aldeias fronteiriças. Mas o efeito desejado de desestabilização da Rússia é conseguido.

A televisão russa tem sido inundada por relatos sem fôlego, e aterrorizados, de jornalistas locais sobre os ataques de artilharia contra cidades russas.

O governador de Belgorod - a região mais atingida pela última campanha ucraniana - retirou centenas de civis, tem estado em contacto telefónico pessoal com Putin e já recebeu um elogio de bravura pelos seus esforços.

Entretanto, a Legião da Liberdade para a Rússia está a publicar anúncios no seu canal Telegram para pilotos de drones se juntarem às suas fileiras.

Pode, ou não, estar por detrás do número crescente de ataques com drones que têm atingido o território russo, desde o Kremlin e os subúrbios de Moscovo preferidos dos aliados de Putin, até às cidades de Kursk, Smelensk e Krasnador.

O objetivo é fazer com que os ataques dentro da Rússia pareçam ter um sabor russo significativo - para sugerir que mais russos estão a seguir o dissidente "Grito de Liberdade" e a juntar-se a um esforço interno para depor Putin.

Tanto o Corpo de Voluntários Russos como a Legião da Liberdade para a Rússia afirmam ter apoiantes no seu país de origem.

É possível que tenham, de facto. Alguém soltou a bandeira azul e branca do movimento de oposição russo sobre Moscovo na semana passada. Alguém está a ajudar a pilotar, ou a treinar, drones para alvos russos.

No que diz respeito à Ucrânia, quanto mais os russos pensarem que os seus compatriotas estão envolvidos no ataque ao regime russo, melhor. A dúvida é, por si só, desestabilizadora.

A julgar pela retórica que vem da Rússia, está a funcionar.

Na abertura de uma reunião com o seu Conselho de Segurança na sexta-feira, Putin disse que os "malfeitores" devem ser impedidos de desestabilizar a Rússia.

Putin disse que o Conselho se iria concentrar em garantir a segurança política interna, tendo em conta os esforços intensificados do inimigo "para agitar a situação dentro da Federação Russa".

"Temos de envidar todos os esforços possíveis para não permitir que o façam em circunstância alguma", acrescentou Putin.

A guerra a regressar a casa

Nesta estratégia, a Ucrânia não poderia pedir um maior aliado do que Yezgeny Prigozhin, o líder do grupo mercenário russo Wagner.

"O Grupo Wagner quer, pelo menos, um mês de recuperação, porque foi um trabalho difícil, um ano difícil... E depois haverá os próximos confrontos, penso eu, muito provavelmente em território russo", disse após as incursões e os ataques com drones contra a Rússia.

Como bónus para Kiev, Prigozhin criticou a liderança militar russa. A cadeia de comando russa é "controlada por palhaços que apenas tratam os homens como carne para canhão", disse, acrescentando: "por isso, não faremos parte desta cadeia".

Prigozhin fotografado à saída de um cemitério, antes do funeral de um bloguista militar russo, que foi morto num ataque à bomba num café de São Petersburgo, em Moscovo, Rússia, a 8 de abril de 2023. Yulia Morozova/Reuters

Sobre os ataques com drones a Moscovo na semana passada, disse o seguinte aos generais russos: "Seus animais fedorentos, o que estão a fazer? Vocês são uns porcos! Levantem o rabo dos gabinetes onde foram colocados para defender este país."

Dmitry Medvedev, um aliado próximo de Putin, ficou igualmente abalado com o facto de a guerra ter chegado à Rússia. Reagiu com algo próximo da histeria.

"É clara a resposta que é necessária: eles têm de ser aniquilados, não apenas a título pessoal, mas temos de os destruir no próprio ninho de vespas. O regime que se desenvolveu na Ucrânia deve ser exterminado", disse Medvedev.

Pode parecer um nazi, mas as suas palavras continham ecos sinistros do genocida Holodomor dos anos 30, quando, sob a União Soviética, cerca de três milhões de ucranianos foram deliberadamente mortos à fome, os agricultores da classe média foram erradicados e a língua ucraniana proibida.

Mas tais fulminações podem não impressionar os russos comuns.

O governador de Belgorod afirma que dezenas de ataques atingiram distritos fronteiriços dentro da Rússia durante o último dia.

Numa longa publicação no seu canal Telegram, Vyacheslav Gladkov afirmou que grande parte do fogo recebido era de artilharia e morteiros contra os distritos fronteiriços. Houve danos em estradas, propriedades e veículos, acrescentou, e 12 pessoas ficaram feridas em 24 horas na cidade fronteiriça de Shebekino.

Uma mulher que falou para um canal pró-russo do Telegram disse que Shebekino estava "a arder, as batalhas estão a decorrer", acrescentando: "Fugimos da cidade. "

"Há muito poucos dos nossos lá. Nos dias anteriores, com todos os bombardeamentos, não houve quase nenhuma resposta, nenhum militar (russo). Fomos deixados por nossa conta", disse a mulher anónima. A CNN não pôde verificar a sua versão dos factos.

Mas as suas opiniões podem espalhar-se. E a reação da Rússia à campanha no seu território pode desestabilizar a sua campanha militar na Ucrânia - e com ela a política interna.

quinta-feira, 1 de setembro de 2022

Human Rights Watch : Transferência forçada de civis ucranianos para Rússia é "crime de guerra"

© Lusa

Por LUSA  01/09/22 

Moscovo está a transferir à força civis ucranianos, incluindo os que fogem do conflito, para a Rússia ou áreas ocupadas pelos russos na Ucrânia, ações que constituem "crimes de guerra", refere um relatório divulgado hoje pela Human Rights Watch.

"As transferências são uma grave violação das leis de guerra, que constituem crimes de guerra e potenciais crimes contra a humanidade", destaca a organização não governamental (ONG) em comunicado.

A Human Rights Watch (HRW) aponta ainda que as autoridades russas ou ligadas a Moscovo também submeteram milhares de cidadãos a uma forma de triagem de segurança coerciva, punitiva e abusiva chamada "filtragem".

Num relatório de 71 páginas, esta ONG documentou as transferências de civis ucranianos através de entrevistas a 54 pessoas que foram para a Rússia, passaram por "filtragens", tiveram familiares ou amigos que foram transferidos para a Rússia ou que apoiaram ucranianos que tentaram deixar a Rússia.

Em 05 de julho, a HRW escreveu ao governo russo com um resumo das suas descobertas e com questões, mas não recebeu resposta.

Embora o número total de civis ucranianos transferidos para a Rússia permaneça incerto, Belkis Wille, investigadora sénior de crises e conflitos da HRW e coautora do relatório, contou à agência Lusa que alguns entrevistados referiram que estiveram em processos de "filtragem" com milhares de outros.

"Um homem disse que estava na fila de espera e era o número 60.000 e teve de esperar cerca de um mês pela sua vez. É difícil ter números, pois apenas temos acessos aos divulgados pela Rússia e é difícil saber quantos desses foram transferências forçadas", explicou.

Para Belkis Wille, os civis ucranianos "não devem ficar sem escolha a não ser ir para a Rússia" e "ninguém deve ser forçado a passar por um processo de triagem abusivo para alcançar a segurança".

No final de julho, a agência de notícias russa TASS divulgou que mais de 2,8 milhões de ucranianos entraram na Federação Russa vindos da Ucrânia, incluindo 448.000 crianças.

"Muitos foram deslocados e transportados de uma maneira e contexto que os tornam transferências forçadas ilegais", salienta esta ONG em comunicado.

A HRW entrevistou ucranianos que fugiram da área de Mariupol, cidade portuária sitiada no sudeste da Ucrânia, e vários transferidos da região de Kharvik, tendo também abordado civis que conseguiram escapar da zona de guerra para o território controlado pela Ucrânia sem passar pela "filtragem".

Segundo testemunhas citadas no relatório, as autoridades russas avisaram os civis que "não tinham escolha" a não ser permanecer em áreas ocupadas pelos russos ou ir para a Rússia.

"É claro que teríamos aproveitado a oportunidade para ir à Ucrânia se pudéssemos, com certeza. Mas não tivemos escolha, nenhuma possibilidade de ir para lá", contou uma mulher transferida de Mariupol.

Já moradores de algumas aldeias e de uma cidade na região leste de Kharkiv, na fronteira com a Rússia, também foram transferidos à força para a Rússia, denuncia a ONG.

Um homem de 70 anos da vila de Ruska Lozova disse que as forças russas ameaçaram puni-lo caso o Exército ucraniano regressasse.

Embora este ucraniano não tenha cedido, centenas de famílias da aldeia partiram para a Rússia, acrescenta a HRW.

Outros ucranianos referiram à ONG que foram para a Rússia voluntariamente, incluindo homens que evitam a lei marcial da Ucrânia, que, com poucas exceções, não permite que homens entre os 18 e 60 anos deixem o país.

A ofensiva militar lançada a 24 de fevereiro pela Rússia na Ucrânia causou já a fuga de quase 13 milhões de pessoas -- mais de seis milhões de deslocados internos e quase sete milhões para os países vizinhos -, de acordo com os mais recentes dados da ONU, que classifica esta crise de refugiados como a pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).

A invasão russa -- justificada pelo Presidente russo, Vladimir Putin, com a necessidade de "desnazificar" e desmilitarizar a Ucrânia para segurança da Rússia - foi condenada pela generalidade da comunidade internacional, que tem respondido com envio de armamento para a Ucrânia e imposição à Rússia de sanções.

A ONU apresentou como confirmadas mais de 5.600 vítimas civis mortas, sublinhando que este número está muito aquém dos valores reais.

segunda-feira, 5 de junho de 2023

Exclusivo: Ucrânia tem agentes de sabotagem dentro da Rússia e está a entregar-lhes drones para ataques

Por CNN, 05/06/23

A Ucrânia tem cultivado uma rede de agentes e simpatizantes no interior da Rússia que trabalham para levar a cabo atos de sabotagem contra alvos russos e começou a fornecer-lhes drones para a realização de ataques, disseram à CNN várias fontes familiarizadas com os serviços secretos norte-americanos sobre o assunto.

As autoridades norte-americanas acreditam que estes agentes pró-ucranianos no interior da Rússia levaram a cabo um ataque com drones que visou o Kremlin no início de maio, lançando drones a partir do interior da Rússia em vez de os transportar da Ucrânia para Moscovo.

Não é claro se outros ataques com drones levados a cabo nos últimos dias - incluindo um que visou um bairro residencial perto de Moscovo e outro que atingiu refinarias de petróleo no sul do país - foram também lançados a partir do interior da Rússia ou conduzidos por esta rede de agentes pró-ucranianos.

As autoridades norte-americanas acreditam que a Ucrânia desenvolveu células de sabotagem no interior da Rússia, constituídas por uma mistura de simpatizantes pró-ucranianos e operacionais bem treinados neste tipo de guerra. Crê-se que a Ucrânia lhes forneceu drones de fabrico ucraniano e dois funcionários norte-americanos disseram à CNN que não há provas de que qualquer dos ataques com drones tenha sido efetuado com drones fornecidos pelos EUA.

Os responsáveis não puderam dizer de forma conclusiva como é que a Ucrânia conseguiu colocar os drones atrás das linhas inimigas, mas duas das fontes disseram à CNN que a Ucrânia estabeleceu rotas de contrabando que poderiam ser utilizadas para enviar drones ou componentes de drones para a Rússia, onde poderiam depois ser montados.

"O dinheiro faz maravilhas"

Um funcionário dos serviços secretos europeus observou que a fronteira russo-ucraniana é vasta e muito difícil de controlar, o que a torna propícia ao contrabando - algo que, segundo ele, os ucranianos têm feito durante a maior parte da década em que estiveram em guerra com as forças pró-russas.

"Também há que ter em conta que esta é uma zona periférica da Rússia", acrescentou. "A sobrevivência é um problema de todos, por isso o dinheiro faz maravilhas."

Drone explode perto da cúpula do Kremlin em Moscovo, nesta imagem retirada de um vídeo obtido pela Reuters a 3 de maio de 2023. Ostorozhno Novosti/Reuters

Fontes disseram à CNN que não se sabe exatamente quem controla estes bens, embora as autoridades norte-americanas acreditem que estejam envolvidos elementos da comunidade de serviços secretos da Ucrânia. O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky estabeleceu parâmetros gerais para o que os seus serviços de informação e segurança estão autorizados a fazer, disseram duas das fontes, mas nem todas as operações requerem a sua aprovação.

Solicitado a comentar, um porta-voz do chefe do Serviço de Segurança ucraniano sugeriu à CNN que as explosões misteriosas e os ataques de drones dentro da Rússia iriam continuar.

"Só comentaremos o 'algodão' depois da nossa vitória", disse. Citando o chefe do Serviço de Segurança, Vasyl Malyuk, o porta-voz acrescentou que, independentemente disso, "o 'algodão' tem estado a arder, está a arder e vai continuar a arder".

"Algodão" é uma gíria que os ucranianos utilizam para se referirem a explosões, normalmente na Rússia ou em territórios ocupados pela Rússia na Ucrânia. As suas origens remontam às primeiras semanas da guerra e resultam do facto de a palavra russa para "explosão" ser muito semelhante à palavra ucraniana para "algodão".

O culminar de meses de esforços

Ao longo do último ano, tem havido um ritmo constante de incêndios e explosões misteriosas no interior da Rússia, tendo como alvo depósitos de petróleo e de combustível, caminhos-de-ferro, gabinetes de alistamento militar, armazéns e oleodutos. Mas, nas últimas semanas, as autoridades têm vindo a registar um aumento destes ataques em solo russo, a começar pelo ataque ao edifício do Kremlin. Parece ser "o culminar de meses de esforços" por parte dos ucranianos para criar as infraestruturas necessárias a este tipo de sabotagem, disse uma das fontes familiarizadas com as informações.

"Há meses que há uma pressão bastante consistente por parte de alguns na Ucrânia para serem mais agressivos", disse a fonte, falando sob anonimato devido à sensibilidade dos serviços secretos dos EUA. "E tem havido certamente alguma vontade a níveis superiores. O desafio tem sido sempre a sua capacidade de o fazer."

Um perito inspeciona a fachada danificada de um edifício de apartamentos após um ataque de drones em Moscovo, a 30 de maio de 2023. Kirill Kudryavtsev/AFP/Getty Images

O chefe dos serviços secretos militares da Ucrânia, Kyrylo Budanov, propôs sistematicamente alguns dos planos mais ousados para operações contra a Rússia e valoriza atos simbólicos, disseram à CNN responsáveis norte-americanos.

De acordo com o Washington Post, documentos confidenciais do Pentágono divulgados online no início deste ano revelaram que a CIA pediu a Budanov que "adiasse" os ataques contra a Rússia no aniversário da invasão da Ucrânia. Budanov concordou com o pedido da CIA, segundo os documentos confidenciais. Mas os drones foram vistos perto de Moscovo a 28 de fevereiro, poucos dias depois do aniversário de um ano da guerra.

Outro relatório dos serviços secretos dos EUA, obtido pela CNN, que tem como fonte os serviços secretos de sinais [intercetação e interpretação de sinais de rádio, sinais de radar e telemetria], diz que Zelensky, no final de fevereiro, "sugeriu atacar os locais de implantação russos na região russa de Rostov" utilizando drones, uma vez que a Ucrânia não possui armas de longo alcance capazes de chegar tão longe.

Não é claro se esse plano avançou, mas instalações petrolíferas en Rostov incendiaram-se depois de terem sido atingidas por drones suspeitos várias vezes ao longo do último ano - ataques que a Rússia está agora a investigar e que atribuiu a "ações criminosas das formações armadas da Ucrânia".

"Tudo o que vou comentar é que temos matado russos", disse Budanov ao Yahoo News no mês passado, quando questionado sobre o ataque com carro-bomba que matou a filha de uma importante figura política russa nos subúrbios de Moscovo no ano passado. A comunidade dos serviços secretos dos EUA avaliou que essa operação foi autorizada por elementos do governo ucraniano.

"E continuaremos a matar russos em qualquer parte do mundo até à vitória completa da Ucrânia", acrescentou Budanov.

Uma estratégia militar inteligente

Publicamente, os altos responsáveis norte-americanos condenaram os ataques dentro da Rússia, alertando para a possibilidade de uma escalada da guerra. Mas, em declarações à CNN, responsáveis norte-americanos e ocidentais afirmaram acreditar que os ataques transfronteiriços são uma estratégia militar inteligente que pode desviar os recursos russos para a proteção do seu próprio território, numa altura em que a Ucrânia se prepara para uma grande contraofensiva.

Na terça-feira, o ministro dos Negócios Estrangeiros do Reino Unido disse aos jornalistas que a Ucrânia tem "o direito de projetar a força para além das suas fronteiras para minar a capacidade da Rússia de projetar a força na própria Ucrânia". "Alvos militares legítimos para além das suas próprias fronteiras são reconhecidos internacionalmente como fazendo parte da autodefesa de uma nação. Devemos reconhecer isso."

O vice-almirante francês Nicolas Vaujour, chefe de operações do Estado-Maior Conjunto, disse à CNN na sexta-feira que os ataques dentro da Rússia são apenas "parte da guerra" e oferecem uma oportunidade para enviar uma mensagem à população russa.

"Há uma guerra e isso pode preocupar-vos [o público russo] no futuro", disse Vaujour sobre os ataques. "Por isso, é uma boa forma de os ucranianos enviarem uma mensagem não só a Vladimir Putin, mas também à população russa", acrescentou.

Relativamente aos atentados, disse que não era "proibido" à Ucrânia pensar nisso.

Responsáveis ucranianos, além disso, disseram em privado que planeiam continuar os ataques dentro da Rússia porque é uma boa tática de distração que está a forçar a Rússia a preocupar-se com a sua própria segurança interna, de acordo com uma fonte americana que falou com oficiais ucranianos nos últimos dias.

Numa atualização dos serviços secretos, o Ministério da Defesa do Reino Unido afirmou que os ataques de grupos pró-ucranianos e os ataques de drones na região fronteiriça de Belgorod forçaram a Rússia a utilizar "toda a gama de poder de fogo militar no seu próprio território".

"Os comandantes russos enfrentam agora um dilema agudo", indica o documento, "entre reforçar as defesas nas regiões fronteiriças da Rússia ou reforçar as suas linhas na Ucrânia ocupada".

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2024

Há mais uma região separatista a pedir proteção à Rússia (e não é na Ucrânia)

Os rebeldes pró-russos em Tiraspol pediram proteção à Rússia. Aqui são vistos a agitar as bandeiras da Transnístria e da Rússia, em 2014 (Vadim Denisov/AFP/Getty Images via CNN Newsource)

CNN, Christian Edwards, Radina Gigova e Anna Chernova

Os rebeldes pró-russos de uma parte separatista da Moldova pediram ao presidente da Rússia, Vladimir Putin, que protegesse a sua região do que alegam ser ameaças do governo moldavo.

A Transnístria, que se separou ilegalmente da Moldova com o desmoronamento da União Soviética, manteve-se firmemente na órbita do Kremlin, enquanto a Moldova, que faz fronteira com a Ucrânia, está a tentar aderir à União Europeia.

Num congresso especial realizado na quarta-feira, os políticos da Transnístria pediram a Moscovo que protegesse a região da "crescente pressão da Moldova", tendo o Kremlin afirmado mais tarde que a proteção dos seus "compatriotas" era uma prioridade, segundo a agência noticiosa estatal russa RIA Novosti.

Embora o congresso tenha inicialmente provocado receios de que Moscovo pudesse avançar com o plano de longa data para desestabilizar o governo cada vez mais pró-ocidental da Moldova, o país rejeitou-o como "propaganda".

Eis o que precisa de saber.

O que aconteceu na Transnístria?

As reuniões do Congresso dos Deputados da Transnístria, um modelo de tomada de decisões da era soviética, são raras, mas frequentemente significativas. Um Congresso de Deputados deu origem à Transnístria em 1990, desencadeando uma guerra entre os separatistas apoiados por Moscovo e a jovem república moldava dois anos mais tarde.

Nenhum país reconhece oficialmente a Transnístria, onde a Rússia tem mantido uma presença militar ao longo das últimas décadas, embora cada vez mais reduzida. Atualmente tem cerca de 1.500 soldados.

Antes de quarta-feira, a última reunião do congresso tinha sido em 2006, quando foi aprovado um referendo que pedia a adesão à Rússia. Quando os políticos da Transnístria anunciaram inesperadamente uma nova reunião, os analistas sugeriram que tal poderia conduzir a novos apelos à unificação com a Rússia. As autoridades moldavas e ucranianas minimizaram esta especulação.,

Mapa da Transnístria (CNN)

O congresso não chegou a este resultado extremo, mas aprovou uma resolução que apela à Rússia para que dê mais "proteção" às autoridades moldavas aos mais de 220 mil cidadãos russos na Transnístria.

"A Transnístria lutará persistentemente pela sua identidade, pelos direitos e interesses do povo da Transnístria e não desistirá de os proteger, apesar de qualquer chantagem ou pressão externa", afirma a resolução, de acordo com a agência noticiosa russa TASS.

A proteção dos interesses dos habitantes da Transnístria, nossos compatriotas, é uma das prioridades", afirmou o Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia.

Por outro lado, as autoridades moldavas rejeitaram o congresso como uma tentativa de alimentar a "histeria".

"Não há perigo de escalada e desestabilização da situação nesta região do nosso país", escreveu o porta-voz Daniel Voda no Telegram. "O que está a acontecer em Tiraspol [a capital da região] é um evento de propaganda."

Em declarações à CNN, o gabinete de reintegração da Moldova afirmou que "rejeita as declarações propagandísticas de Tiraspol e recorda que a região da Transnístria beneficia das políticas de paz, segurança e integração económica com a UE, que são vantajosas para todos os cidadãos".

O porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, Matt Miller, afirmou na quarta-feira que os Estados Unidos estão "a acompanhar de perto as ações da Rússia na Transnístria e a situação geral na região".

Porquê realizar um congresso agora?

A guerra da Rússia na Ucrânia teve um efeito profundo na economia da Transnístria. A Ucrânia fechou a fronteira com a região quando a guerra começou, cortando cerca de um quarto do comércio do enclave. Embora continue a receber gás russo gratuitamente, o acordo que permite o trânsito de gás através da Ucrânia expira em dezembro e não há garantias de que seja prorrogado.

A guerra também levou a Moldova a tentar resolver o seu conflito de décadas com a Transnístria. Em parte em resposta à guerra, a União Europeia concedeu ao país o estatuto de país candidato em junho de 2022 e, em dezembro de 2023, deu luz verde para o início das negociações de adesão.

Embora a presidente da Moldova, Maia Sandu, tenha indicado que estaria disposta a aderir à União Europeia sem a Transnístria, a reunificação pode agilizar o processo. Um blogue recente do Carnegie Endowment for International Peace argumentava que "a estratégia da Moldova é apressar o processo tornando a vida da Transnístria o mais difícil possível".

Neste sentido, em janeiro, a Moldova eliminou inesperadamente as isenções aduaneiras para as empresas da Transnístria, obrigando-as a pagar impostos tanto à Transnístria como a Chisinau.

Dumitru Minzarari, professor de estudos de segurança no Colégio de Defesa do Báltico, explica à CNN que a decisão da Transnístria de realizar um congresso especial foi "diretamente desencadeada" pela reintrodução dos direitos aduaneiros pela Moldávia.

"Ao oferecer isenções fiscais à região separatista, o governo moldavo estava praticamente a financiar a existência de um regime separatista em Tiraspol", continua Minzarari - um acordo que o governo já não sentia que tinha de tolerar.

O especialista acrescenta que a disputa criou oportunidades para as autoridades russas "pescarem em águas turbulentas".

Porque é que a Rússia está interessada na Moldávia?

Se a invasão russa da Ucrânia tivesse corrido como planeado, teria capturado a capital Kiev em dias e o resto do país em semanas, atravessando a costa ucraniana até à cidade de Odessa, no sudoeste do país, perto da Transnístria.

O então comandante da Região Militar Central da Rússia, major-general Rustam Minnekaev, disse que um dos objetivos da chamada "operação militar especial" era estabelecer um corredor através do sul da Ucrânia até à Transnístria, uma vez que a Rússia procura reunir-se com os seus "compatriotas no estrangeiro".

Apesar de a Ucrânia ter travado o avanço de Moscovo em Kherson, a cerca de 350 quilómetros da Transnístria, os analistas sublinharam que a Rússia mantém os seus planos para a Moldova.

"O Kremlin procura utilizar a Transnístria como um representante controlado pela Rússia, que pode utilizar para fazer descarrilar o processo de adesão da Moldova à União Europeia, entre outras coisas", alertou o Instituto para o Estudo da Guerra, um grupo de reflexão sediado nos Estados Unidos, num relatório publicado na semana passada.

A Transnístria separou-se ilegalmente da Moldávia. Um busto de Lenine em frente ao edifício da Casa dos Sovietes em Tiraspol, em julho de 2022 (Anton Polyakov/Getty Images via CNN Newsource)

Tal como a Rússia considerou inaceitável a viragem da Ucrânia para a União Europeia, em 2014, e usou a força militar para a impedir, também está interessada em evitar o mesmo na Moldova. A CNN viu um documento elaborado pelo serviço de segurança russo, o FSB, que detalhava um plano para desestabilizar a Moldova e impedir a inclinação daquele país para o Ocidente.

Putin justificou a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014 e as operações militares em Donetsk e Lugansk como um esforço para proteger os cidadãos de língua russa no leste da Ucrânia, que ele alegou estarem sob ameaça de Kiev.

Minzarari afirma que existem "fortes paralelos" entre essa retórica e o tipo de retórica utilizada recentemente pelo governo da Transnístria. Numa entrevista à RIA Novosti, o presidente Vadim Kranoselsky afirmou que o governo moldavo estava a preparar ataques terroristas contra a Transnístria antes de uma possível invasão, sem apresentar provas.

No entanto, outros analistas argumentam que, em vez de sublinhar a influência da Rússia na região, a situação na Transnístria é antes uma chamada de atenção para o facto de Moscovo não ter conseguido, até agora, atingir os seus principais objetivos de guerra.

"Um apelo à anexação da Transnístria rejeitado pela Rússia seria um grande golpe de relações públicas para a Ucrânia, lembrando aos russos e aos ucranianos que o que os comentadores acreditavam há dois anos serem objectivos modestos para a guerra estão agora demasiado longe do alcance da Rússia para serem sequer considerados", refere Ben Dubow, membro não residente do Centro de Análise de Políticas Europeias, à CNN.

sábado, 2 de novembro de 2024

A Coreia do Norte, o Irão e a China apoiam a guerra da Rússia na Ucrânia. Surgiu um "novo eixo"?

Vladimir Putin e Xi Jinping (Getty Images)  Por  Cnnportugal.iol.pt, Análise de Simone McCarthy

Os milhares de soldados norte-coreanos que, segundo os serviços de inteligência dos EUA, chegaram à Rússia este mês para treino, geraram preocupação de que possam ser destacados para reforçar a linha de frente de Moscovo na Ucrânia.

A presença destas tropas também alarmou os EUA e os seus aliados, que receiam que a crescente coordenação entre países anti-Ocidente esteja a criar uma ameaça de segurança muito mais ampla e urgente – uma situação em que parcerias de conveniência evoluem para laços militares declarados.

Centenas de drones iranianos também fizeram parte do ataque de Moscovo à Ucrânia, e no mês passado os EUA disseram que Teerão enviou mísseis balísticos de curto alcance ao país em guerra.

Entretanto, a China foi acusada de abastecer a máquina de guerra russa com quantidades substanciais de bens de “uso duplo”, como microeletrónica e máquinas-ferramentas, que podem ser usados para fabricar armas. Na semana passada, os EUA penalizaram, pela primeira vez, duas empresas chinesas por fornecerem sistemas de armas completos. Todos os três países negaram estar a dar esse apoio.

Ao avaliar a cooperação emergente, um grupo apoiado pelo Congresso que avalia a estratégia de defesa dos EUA apelidou a Rússia, China, Irão e Coreia do Norte, este verão, de “eixo de parcerias malignas em crescimento”.

O receio é que uma animosidade partilhada contra os EUA esteja a levar esses países a trabalharem juntos – ampliando a ameaça que qualquer um deles isoladamente representa para Washington ou os seus aliados, não apenas numa região, mas talvez em várias partes do mundo ao mesmo tempo.

“Se (a Coreia do Norte) é co-beligerante, a sua intenção é participar nesta guerra em nome da Rússia. Isso é um problema muito, muito sério, e terá impacto não só na Europa — terá também impacto no Indo-Pacífico,” disse o secretário de Defesa dos EUA, Lloyd Austin, na quarta-feira, na primeira confirmação dos EUA da presença de tropas norte-coreanas na Rússia.

'Impulsionados por uma estratégia de sobrevivência'

Décadas após o eixo de potências da Alemanha nazi, Itália fascista e Japão imperial, e a coligação anti-Ocidente estridente da era da Guerra Fria – e anos depois de George W. Bush apelidar os inimigos dos EUA, Irão, Iraque e Coreia do Norte de “eixo do mal” – há uma perceção de que um novo alinhamento perigoso está em ascensão, com a guerra de Putin como catalisador.

Esse alinhamento reuniria duas potências nucleares antigas, um estado que se acredita ter desenvolvido um arsenal de ogivas nucleares ilegais, a Coreia do Norte, e o Irão, que os EUA dizem ser capaz de montar uma arma nuclear em questão de semanas.

A parceria militar da Coreia do Norte com a Rússia agora liga o conflito quente e exaustivo na Europa a um período especialmente tenso no conflito frio na Península Coreana, já que o líder norte-coreano Kim Jong Un elevou as suas ameaças ao Sul, com o qual permanece tecnicamente em guerra.

Após a descoberta da presença norte-coreana na Rússia, a Coreia do Sul afirmou que poderia considerar fornecer armas à Ucrânia, onde o aliado dos EUA ainda não forneceu armas diretamente.

Para a Coreia do Norte, onde o líder Kim Jong-Un apelou ao aumento do programa nuclear ilícito do país, há pouco a perder em enviar o que se acredita serem milhões de munições de artilharia, mísseis balísticos de curto alcance e, mais recentemente, tropas para a Rússia.

Em troca, a isolada e economicamente fragilizada Pyongyang provavelmente recebeu alimentos e outros bens essenciais – e possivelmente apoio para desenvolver a sua capacidade espacial, o que também poderia ajudar o seu programa de mísseis sancionado.

A importância da guerra de drones na Ucrânia também levou a Rússia a procurar o Irão para aquisição – aprofundando uma aliança de segurança que remonta a 2015 e à guerra na Síria, quando ambos apoiaram o regime de Bashar al-Assad.

Para Teerão – sobrecarregado por sanções pesadas do Ocidente e envolvido no crescente conflito no Médio Oriente com Israel, apoiado pelos EUA – fornecer armas à Rússia pode potencialmente impulsionar o seu setor de defesa, enquanto os laços com Pequim e Moscovo lhe dão cobertura diplomática.

O líder chinês Xi Jinping, que declarou uma parceria “sem limites” com Putin semanas antes da invasão, afirmou neutralidade no conflito e tem evitado que empresas chinesas forneçam ajuda letal direta.

No entanto, a China tem preenchido lacunas na procura russa por outros bens, incluindo produtos que os EUA e outros consideram de uso duplo, e beneficiado da energia russa com desconto. Pequim defende o seu “comércio normal” com a Rússia. A China também continuou a expandir exercícios militares conjuntos e laços diplomáticos com um país que considera um parceiro-chave na luta contra o Ocidente em fóruns internacionais.

Mas mesmo que estes quatro países tenham as suas próprias motivações para cooperar uns com os outros individualmente, especialmente no contexto da guerra da Rússia, há limites claros em qualquer coordenação mais ampla, confiança mútua e até mesmo interesse em trabalharem juntos – pelo menos por agora, dizem os observadores.

“Estas são relações bilaterais impulsionadas pela estratégia de sobrevivência de cada país, pelo menu geopolítico do dia ou da década e pela crise com que estão a lidar,” disse Alex Gabuev, diretor do Carnegie Russia Eurasia Center em Berlim.

“São regimes autoritários … e todos veem os EUA como um adversário comum. Esse é o laço que os mantém juntos, mas se podemos falar de um grau de coordenação (entre os quatro) … acho que estamos muito longe disso,” disse ele.

Isso coloca a questão premente de saber se esses alinhamentos atuais podem perdurar para além da guerra na Ucrânia e evoluir para uma coordenação plena entre as quatro nações.

O fator China

Os restos de um míssil não identificado, que as autoridades ucranianas afirmam ter sido fabricado na Coreia do Norte, são vistos no local de um ataque russo em Kharkiv, na Ucrânia, a 2 de janeiro. Sofiia Gatilova/Reuters

Um fator chave para o desenvolvimento de qualquer alinhamento adicional é a China, dizem os observadores – de longe o jogador mais poderoso do grupo, o principal parceiro comercial da Rússia, Coreia do Norte e Irão, e o país visto pelos EUA como o seu principal adversário.

À medida que as divisões com Washington se aprofundaram, Pequim intensificou os esforços para desafiar a liderança global dos EUA e moldar uma ordem internacional que favoreça a China e outras autocracias.

O papel da Rússia nesse esforço foi evidente esta semana na sua cidade de Kazan, onde Xi e Putin destacaram o compromisso com a construção de um mundo “mais justo” à margem de uma cimeira do grupo BRICS, cuja adesão trabalharam para expandir este ano.

Os dois países trouxeram o Irão para esse círculo diplomático e também em grande parte apoiaram Teerão no conflito no Médio Oriente, onde os seus representantes estão a lutar contra Israel. A China, a Rússia e o Irão realizaram quatro exercícios navais conjuntos desde 2019, e a China é, de longe, o maior comprador de energia do Irão.

Ao mesmo tempo, o Irão, fortemente sancionado, deixou de ser o “estado favorito para a política do Médio Oriente da China” à medida que Pequim constrói relações com os países mais ricos do Golfo, segundo Jean-Loup Samaan, investigador no Instituto do Médio Oriente da Universidade Nacional de Singapura.

Pequim também gere cuidadosamente a sua relação com a Coreia do Norte – que depende quase inteiramente da China economicamente e diplomaticamente. Os líderes chineses são amplamente vistos como cautelosos com o crescente alinhamento Kim-Putin e com o potencial de uma Coreia do Norte fortalecida causar problemas e atrair mais atenção dos EUA para a região.

Questionado sobre o movimento das tropas norte-coreanas para a Rússia, o Ministério dos Negócios Estrangeiros da China disse quinta-feira que “não tem informações sobre isso.”

Embora pratique o seu próprio comportamento agressivo no Mar do Sul da China e em relação a Taiwan, a ilha democrática que Pequim reclama, a China pode não querer parecer apoiar abertamente essas parcerias e prejudicar os esforços para se apresentar como um líder global responsável.

“Rússia, Coreia do Norte, Irão é o tipo de grupo com o qual a China menos se quer associar abertamente,” disse Tong Zhao, investigador na Carnegie Endowment for International Peace.

A China tem sido “desesperada para esclarecer que não é uma aliança trilateral com a Rússia e a Coreia do Norte,” e também “tem mais opções do que esses países … e prefere trabalhar com um número maior de países” para competir com o Ocidente, disse ele.

‘Um risco real’

Um barco militar iraniano patrulha antes do início de um exercício naval conjunto do Irão, Rússia e China no Oceano Índico, em maio. Exército iraniano via AP

Visto do Ocidente, no entanto, a recusa da China em cortar as linhas económicas para uma Coreia do Norte que desafia as sanções da ONU e para uma Rússia que ameaçou o uso de armas nucleares na Ucrânia é frequentemente vista como um apoio aberto a esses regimes.

Em julho, a Comissão da Estratégia de Defesa Nacional, um grupo independente encarregado pelo Congresso de avaliar a estratégia de defesa dos EUA, disse que a parceria da China e da Rússia “se aprofundou e ampliou” para incluir uma parceria militar e económica com o Irão e a Coreia do Norte.

“Este novo alinhamento de nações contrárias aos interesses dos EUA cria um risco real, senão uma probabilidade, de que um conflito em qualquer lugar possa tornar-se numa guerra multi-teatro ou global,” afirmou.

A China insistiu repetidamente que a sua relação com a Rússia é de “não aliança, não confrontação e não direcionada contra terceiros.”

A NATO também, nos últimos anos, tem intensificado as relações com aliados e parceiros dos EUA na região da Ásia-Pacífico, com uma reunião de ministros da Defesa na semana passada, pela primeira vez com a presença da Austrália, Japão, Nova Zelândia e Coreia do Sul.

A curto prazo, as parcerias de armas da Rússia também abrem a porta para que o Irão e a Coreia do Norte possam potencialmente obter e produzir as tecnologias de armas sensíveis de Moscovo e até mesmo enviá-las para todo o mundo, de acordo com Zhao, da Carnegie.

A dinâmica atual também aumenta o risco de que futuros conflitos – incluindo um em que a China esteja no centro e não a Rússia – vejam uma coordenação entre os quatro, segundo alguns analistas.

Por exemplo, num possível conflito no Mar do Sul da China ou em relação a Taiwan, há debate sobre se Pequim gostaria que a Coreia do Norte ou a Rússia desempenhassem um papel em criar uma distração no Norte da Ásia.

Mas alguns especialistas também alertam contra a ideia de que esse “eixo” ou tal futuro seja uma conclusão precipitada – já que esses relacionamentos permanecem oportunistas, em vez de baseados numa profunda aliança ideológica ou confiança.

Por um lado, é possível que se possa incentivar “um comportamento mais moderado” por parte da China, o que poderia reduzir esse potencial, segundo Sydney Seiler, conselheiro sénior no Center for Strategic and International Studies em Washington.

Mas, como os aspetos parecem hoje – “o risco é suficientemente presente” para que os EUA possam enfrentar um futuro em que a conflagração envolva vários desses países, disse