A Guiné-Bissau continua a gerir as consequências da tentativa de desestabilização ocorrida no dia 1 de Fevereiro. Enquanto isso, continuam por resolver os problemas dos funcionários públicos, nomeadamente da classe docente e do sector da saúde, que têm efetuado largos meses de greve para receberem os seus salários em atraso sem conseguirem uma resposta positiva por parte dos seus interlocutores.
Ao esboçar um quadro pouco otimista da situação do seu país, Júlio Mendonça, secretário-geral da central sindical UNTG – União Nacional Dos Trabalhadores Da Guiné, dá conta de “elevadíssimos níveis de corrupção”, considera que “os políticos não estão interessados no bem-estar do povo” e que, por outro lado, “a comunidade internacional abandonou a Guiné-Bissau”.
“Durante um ano, fizemos greve no sentido de persuadir o executivo de mudar a forma de governar o país, priorizar a boa gestão da coisa pública e consequentemente criar condições para que o servidor público seja dignificado. Mas infelizmente isto não aconteceu. Pior do que tudo, assistimos a diferentes formas ou elevadíssimos níveis de corrupção no país.
O governo ficou impotente, não conseguiu tão pouco reajustar os salários ou controlar o preço dos produtos no mercado. Obviamente que todo o mundo descontente. Percebemos claramente que os políticos não estão nem aí na criação do bem-estar do povo, estão mais preocupados em angariar riqueza na base da corrupção, aproveitar o erário público para os seus interesses pessoais e partidários. Quem paga por isso é o povo e o trabalhador, razão pela qual a UNTG está muito distante das querelas políticas e não tem nenhuma ligação com partidos políticos. O nosso objectivo é claro: conquistar a dignidade do trabalhador guineense”.
Relativamente às condições económicas do país, neste momento nota-se que se deposita alguma esperança no empréstimo a ser avalizado pelo FMI.
“O FMI já fez variadíssimos empréstimos à Guiné-Bissau e isso nunca surtiu efeito a nível social. O dinheiro que não é utilizado para resolver sociais, nem para resolver os problemas fundamentais do país no que diz respeito à educação e à saúde. Esse dinheiro é desviado para compras de imóveis na Europa, construções imobiliárias na Guiné, criação de empresas fictícias… Enfim, esse dinheiro é desviado pelos governantes.
Não é preciso ser ‘expert’ para perceber que este é um dos países mais pobres do mundo. Mas com esses biliões, como é que se aplica esse dinheiro? Então, para nós, isso não será grande novidade, não há nenhuma expectativa disso, porque a prática é a mesma, desvio, corrupção. Vão emprestar o dinheiro e fazem a gestão à maneira que quiserem. Vemos os hospitais onde não se consegue detectar alguma coisa lá porque não têm laboratório, não têm nada. Agora fizeram investimento no Hospital Simão Mendes que é o maior hospital do país. É só pintura. Isso não interessa ninguém. Mas não foram criadas condições para que os médicos prestem um serviço de melhor qualidade, não dignificaram os médicos. Não foram capacitados, não têm material de diagnóstico, não têm nada. Então estão a fazer o quê? É uma brincadeira apenas. Fizeram tudo para manter o povo na escuridão. Foi negado ao povo a escola porque não criaram condições para que todo o mundo tenha acesso à escola. Quase 60 ou 70% da população é analfabeta. Não percebem isto. Os que tiveram oportunidade de ir à escola, muito caíram na corrupção, porque cada um luta para sobreviver. Enquanto representantes dos trabalhadores, só podemos lamentar, porque aquele dinheiro não será utilizado devidamente. É evidente que o povo guineense anda agora a pedir socorro mas percebemos que a comunidade internacional já abandonou a Guiné, porque há um silêncio absoluto”, disse o sindicalista.
Fonte: RFI
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