08/03/2021 / Jornal Odemocrata
[REPORTAGEM_março_2021] As horticultoras do campo da Granja de Pessubé, em Bissau, pedem ajuda do executivo e das organizações nacionais e internacionais em sementes agrícolas para que possam desenvolver as suas atividades de produção em quantidade e qualidade para abastecer o mercado nacional de produtos hortícolas e leguminosas, como forma de evitar a dependência da importação desses produtos dos países vizinhos, em particular da região de Ziguinchor no sul do Senegal. O apelo foi registado por uma equipa do Jornal O Democrata, durante uma reportagem efetuada naquele campo hortícola de um hectare e meio, onde trabalham centenas de mulheres e homens agrupados em oito associações.
O campo hortícola da Granja de Pessubé dispõe de uma feira que é conhecida como a “Feira de Legumes” onde são vendidos os legumes produzidos localmente a preços que os utentes consideram muito baratos em comparação com outras feiras do país, pelo que grande parte das bideiras recorrem àquele mercado para comprar produtos para revenda.
Os consumidores também movimentam-se aquele mercado para a aquisição de legumes, designadamente: alface, cenoura, beringela, couve, repolho, beterraba, quiabo (candja), badjiqui entre outros para consumo doméstico diário.
Uma equipa de reportagem constatouque a feira é mais movimentada no período de manhã, quando as mulheres aproveitam para vender seus produtos até às 10 horas para depois poderem regressar aos campos para regar e cultivar outros produtos. Segundo as informações avançadas pelas mulheres vendedeiras, um número insignificante de produtos comercializados na feira da Granja de Pessubé, que fica na Avenida Dom Settimio Arturo Ferrazzetta, depois da vedação da Aldeia SOS, vêm de Ziguinchor.
Uma das dificuldades e preocupações das horticultoras tem a ver com os assaltos de que são alvos da parte dos gatunos, ao anoitecer (fusca-fusca) e de madrugada, bem como o roubo dos seus produtos por “estranhos” que frequentam aquela zona e os estragos causados por animais, porque o campo não está vedado.
Outra situação constatada durante a visita em relação à feira, tem a ver com as cobranças que se fazem em todos dos mercados. A diferença é que nesta feira não se faz cobranças, mas cada vendedeira contribui com cem (100) francos CFA diariamente para assegurar a limpeza e a higienização da feira.
ASSOCIAÇÃO IMPLORA AO MINISTÉRIO DE AGRICULTURA A REABILITAÇÃO DA PARTE DE FEIRA EM RUINAS
O coordenador das mulheres horticultoras da feira da Granja de Pessubé, Carlos António Sanca, apelou à atual direção da Câmara Municipal de Bissau (CMB) no sentido de apoiá-las para que a feira possa ter mais e maior fluxo das utentes e movimento necessários. O apelo do coordenador das horticultoras da Granja Pessubé, António Carlos Sanca, foi tornado público na entrevista concedida ao semanário O Democrata para falar da real situação da feira pouco movimentada, devido à falta de fluxo de feirantes.
Na entrevista, Carlos António Sanca explicou que as mulheres decidiram ocupar o espaço que fica na parte baixa da feira para que possam ter maior visibilidade para as trocas comerciais, porque se ficassem no balcão principal da feira, que está um pouco mais escondido, não teriam acesso facilitado aos clientes, ou seja, seria muito difícil que as pessoas que frequentam o local as encontrassem e descobrissem como funciona a feira, o que poderia ter constituído um grande obstáculo às suas atividades comerciais.
“Desde 2011 que o governo entregou a feira, temos feito várias diligências junto da Câmara Municipal de Bissau pedindo que descongestione o mercado de Bandim e outros periféricos e encaminhe as pessoas para a feira da Granja de Pessubé, mas a edilidade não conseguiu mexer uma única palha e neste momento a feira está praticamente sem feirantes, o que tem criado transtornos às vendedeiras que praticam cá as suas atividades. A nossa preocupação era e continua a ser a mesma, deslocar as pessoas de outros mercados ou feiras congestionadas para Pessubé para que possamos ter também um fluxo, tanto de feirantes quanto de clientes”, lamentou.
Frisou que estavam em curso diligências junto da Direção-geral do Ministério da Agricultura para que esta tome as medidas para reabilitar partes da feira que estão em ruínas, “caso contrário a feira nunca será recuperada ou melhorada”.
Questionado sobre o número exato de associações existentes na Granja de Pessubé, referiu que são no total oito (8) divididas em diferentes direções e que cada direção tem os seus próprios estatutos.
Porém, admitiu a possibilidade de, no futuro, fundi-las numa única Confederação das horticultoras, que será o ponto de ligação entre as associações de base e as estruturas responsáveis pela gestão da cidade de Bissau, tendo assegurado que os trabalhos da elaboração dos estatutos da futura Confederação estão quase na fase final.
Relativamente às cooperativas agrícolas, Carlos Sanca frisou que não existe nenhuma cooperativa agrícola a cooperar com as oito associações das mulheres horticultoras da Granja de Pessubé e que a direção-geral do Ministério da Agricultura tem apoiado essas organizações com sementes e materiais alfaias.
“Temos recebido visitas de várias organizações que dizem trabalhar neste campo de horticultura, mas nunca recebemos apoios delas. Presumimos que usam as nossas associações e recolhem informações das nossas associadas para tirar benefícios próprios, salvo uma organização que teve amabilidade de apoiar”, notou.
HORTICULTORAS IMPLORAM POR FINANCIAMENTO PARA DESENVOLVER SUAS ATIVIDADES
As horticultoras que praticam diariamente as suas atividades nos campos da Granja de Pessubé para sustento das famílias pediram apoio ao Estado e outras entidades ligadas ao setor no sentido de apoiá-las, pelo menos, em as sementes, para que possam continuar a cultivar e produzir em quantidade e qualidade para abastecer o mercado nacional.
Teresa Alves Carvalho, Presidente de Associação de “Campo Piloto” da Granja de Pessubé, revelou que atualmente as mulheres horticultoras enfrentam grandes dificuldades devido à falta de financiamento de entidades ou projetos que atuam neste setor, embora tenha reconhecido que antes recebiam alguns financiamentos vindos de alguns projetos e beneficiavam também de todos os apoios que o Ministério de Agricultura disponibilizava para as horticultoras.
“Já faz anos que não beneficiamos de apoios, não temos materiais nem sementes. Praticamente não temos nada, compramos as nossas sementes. Às vezes compramos dez gramas por quinhentos (500) francos CFA, e muitas vezes não germinam”, lamentou referindo que “este ano temos muitas dificuldades, sobretudo em obter sementes de repolho, da cenoura de qualidade e não conseguimos vender alface no mês de dezembro, apenas algumas mulheres conseguiram vender um pouco”.
“Trabalhamos em circunstâncias muito difíceis. Não temos tido apoios de grande envergadura, nem do Estado nem dos parceiros. Sabemos que o nosso Estado depende muito da ajuda do exterior, mas deve esforçar-se mais para valorizar e apoiar os nossos esforços nos campos agrícolas”, assinalou e apelou às pessoas a apostarem mais na agricultura, porque “o nosso solo é muito rico e fértil”.
Teresa Alves Carvalho denunciou que várias organizações têm beneficiado de financiamentos de algumas entidades estrangeiras graças às filmagens que fazem nos campos hortícolas de Pessubé cheios de legumes, e quando conseguem financiamentos não as apoiam nem levam sementes para incentivá-las.
Relativamente ao fornecimento da água, sublinhou que têm água porque na Granja de Pessubé existe um furo da Empresa da Eletricidade e Águas da Guiné-Bissau (EAGB) e que têm trabalhado em colaboração com a EAGB. Contudo, esclareceu que quando a empresa não fornece a água recorrem a dois poços de água feitos no campo, como alternativa.
“Mas as nossas colegas que têm os seus campos um pouco distante dos dois poços ficam sem regar quando a EAGB não fornece água e como consequência, as plantam acabam por morrer”, disse e revelou que, apesar dos esforços feitos para cavar mais poços de água, não tem sido fácil desenvolver as suas atividades porque os agentes da “cintura verde” proibiram-nas de fazer mais fontes no campo.
De acordo com Teresa Carvalho, o painel solar montado no campo não fornece energia suficiente para puxar a água para encher o depósito, que em menos de 30 minutos fica sem a água.
PRODUTORES DENUNCIAM ASSALTOS, ROUBOS DOS SEUS LEGUMES E PEDEM VEDAÇÃO DO CAMPO
As mulheres horticultoras denunciaram que por falta de segurança e de vedação do campo onde praticam as suas atividades agrícolas têm sofrido assaltos, roubos e estragos causados por animais e queixam-se que se sentem inseguras, porque muitas vezes os assaltos e roubos são orquestrados por grupos de jovens que as atacam e roubam seus produtos, sobretudo o repolho que não lhes dá muito trabalho, em termos de preparação antes de ser comercializado.
“Ninguém tem a coragem de levantar-se às cinco horas da madrugada para ir regar os legumes, por causa das ações maléficas de jovens. Porque levantarmo-nos às cinco da manhã, corremos o risco de sermos assaltadas e esfaqueadas, por isso esperamos até às sete horas e um quarto para nos fazermos ao terreno”, explicou.
Teresa Alves Carvalho criticou algumas mulheres que saem de Bissau para Senegal à procura de legumes porque, segundo argumentou, os legumes que saem do Senegal são menos consistentes porque utilizam muito os produtos químicos para tornar o solo fértil, tendo realçado que os legumes nacionais têm mais vantagem em relação aos do Senegal, porque utilizam menos químicos.
Sustentou que muitas mulheres guineenses têm vontade de trabalhar mais e mais neste ramo e que se existissem financiamentos ou apoios poderiam ter feito mais trabalho e produzido mais.
“Só para constar no vosso registo, o primeiro perímetro de campo de Granja de Pessubé tem sessenta (60) associados e tem uma área de 1,5 hectares e cada parcela ocupa 15/20 metros”, avançou.
MULHERES TEMEM PERDER O CAMPO COM AS VENDAS DE TERRENOS
Na mesma entrevista, Teresa Alves carvalho alertou que sediligências não forem tomadas urgentemente, poderão ficar sem espaço para praticar as suas atividades hortícolas, devido à invasão de pessoas que estão a comprar terrenos naquela zona húmida para construir habitações.
A responsável da Associação das Horticultoras do Campo hortícola de Pessubé acrescentou que as mulheres horticultoras não têm tido estabilidade, porque o primeiro campo hortícola da Granjanão foi legalizado pelas associações por impedimento das autoridades, que terão alegado que apenas podem legalizar as associações, não o campo hortícola de Pessubé.
Em relação à cobrança na feira, explicou que nunca foram cobradas, porque desde que a feira foi entregue à CMB, esta instituição não tem feito nada para que a feira pudesse ter movimento ou fluxo. O objetivo principal da feira da Granja de Pessubé era que funcionasse como centro de abastecimento dos mercados e das feiras da capital Bissau. Ou seja, as horticultoras tiravam seus produtos dos campos e vendiam-nos às vendedeiras de outros centros comerciais.
“Por ficar por muito tempo na mesa a vender, algumas horticultoras acabam por vezes não conseguir cultivar os legumes”, disse.
NENÉ CAETANO DA ASSOCIAÇÃO “UNOK ULILI ” LAMENTA A FALTA DE AJUDA ÀS HORTICULTORAS
Por sua vez, Nené Caetano, presidente interina da Associação “UNOK ULILI”- (DIVERSÃO É BOA) numa tradução livre da língua Mancanha para o crioulo “Brincadeira Sabi “, admitiu na entrevista que enfrentam enormes dificuldades e que não conseguem ajudas das entidades que intervêm nessa área, devido a não legalização da sua associação, o que torna difícil obter apoios dos parceiros.
“Por isso queremos pedir ao governo e à AMAE no sentido de darem atenção às mulheres horticultoras porque trabalhamos em circunstâncias extremamente difíceis, porque não temos dinheiro e meios materiais para desenvolver as nossas atividades e se não regarmos não podemos ter bons legumes para comer”, disse.
Perante esta situação, a responsável da associação “UNOK ULILI” sugeriu que as autoridades diligenciassem um crédito junto dos bancos comercias, para as mulheres horticultoras. Para Nené Caetano, com essa diligência seria mais fácil as mulheres dinamizarem as suas atividades, adquirir materiais e sementes que lhes permitam produzir em grande quantidade e qualidade para abastecer os mercados e as feiras de Bissau.
“Veja só as mulheres saem da Guiné-Bissau para Senegal à procura de produtos para depois revendê-los no mercado local, uma vez que podemos produzir grande quantidade de produtos com mais segurança, porque utilizamos menos produtos químicos”, criticou.
Questionada se a associação faz parte de Associação das Mulheres de Atividade Económica (AMAE), Caetano frisou que sim, mas recebem poucos apoios desta organização, lamentado que a sua associação não está legalizada, o que torna difícil conseguir apoios da parte de outras entidades.
Segundo Nené Caetano, há quase cinco anos que a organização que dirige não recebe apoios do Estado e que produzem com esforços próprios, de cada mulher horticultora. Relativamente ao ano agrícola, sublinhou que foi de baixo rendimento, devido aos estragos causados pelos inseticidas “lagarta” que causaram muitos danos, com prejuízos na economia das horticultoras porque muitas não conseguiram vender praticamente nada.
Por: Carolina Djemé
Fotos: Marcelo Na Ritche