© LusaNotícias ao Minuto 28/09/23
Mais de 2.500 pessoas morreram ou foram dadas com desaparecidas depois de tentarem cruzar o Mediterrâneo para a Europa desde o início do ano, disse hoje o Alto Comissariado da ONU para Refugiados (ACNUR) no Conselho de Segurança.
"Até 24 de setembro, mais de 2.500 pessoas, só em 2023, foram dadas como mortas ou desaparecidas. Este número representa um aumento de dois terços, em comparação com 1.680 pessoas no mesmo período de 2022", disse Ruven Menikdiwela, diretora do Escritório do ACNUR em Nova Iorque, numa reunião do Conselho de Segurança convocada pela Rússia.
Menikdiwela reiterou os apelos do ACNUR para a criação de um mecanismo regional de desembarque e redistribuição para refugiados e migrantes que cheguem à Europa por mar, "num espírito de partilha de responsabilidades e solidariedade com os Estados da linha da frente".
O ACNUR estima que, entre janeiro e agosto deste ano, mais de 102 mil refugiados e migrantes tentaram atravessar o Mar Mediterrâneo Central para a Europa a partir da Tunísia - um aumento de 260% em comparação com o ano passado - e mais de 45 mil a partir da Líbia.
Além disso, 31 mil pessoas foram resgatadas no mar ou intercetadas e desembarcaram na Tunísia, e 10.600 na Líbia.
"As partidas da Argélia permanecem limitadas, com quase 4.700 chegadas a Espanha até agosto de 2023, um aumento de 18% em relação a 2022. Além disso, um total de 3.700 pessoas foram resgatadas ou intercetadas pelas autoridades argelinas durante o mesmo período, um aumento de 68%", apontou o ACNUR.
No total, de janeiro a 24 de setembro, cerca de 186.000 pessoas chegaram por via marítima ao sul da Europa - Itália, Grécia, Espanha, Chipre e Malta -, tendo a maioria - mais de 130.000 pessoas - chegado a Itália, num aumento de 83% em comparação com o mesmo período de 2022.
Ruven Menikdiwela alertou ainda que vidas também são perdidas em terra, longe da atenção pública.
"A viagem da África Ocidental ou do Leste e Corno de África até à Líbia e daí até aos pontos de partida na costa continua a ser uma das mais perigosas do mundo", frisou.
Os refugiados e migrantes que viajam ao longo das rotas terrestres provenientes da África Subsariana correm o "risco de morte e de graves violações dos direitos humanos a cada passo", acrescentou a funcionário do ACNUR.
Menikdiwela salientou que as elevadas taxas de saída a partir da Tunísia resultam da perceção de insegurança entre as comunidades de refugiados, na sequência de incidentes e ataques com motivação racial e discursos de ódio, assim como de expulsões coletivas da Líbia e da Argélia.
"Embora o ACNUR reconheça o direito soberano e legal dos Estados de se envolverem com outros Estados e tomarem medidas para melhorar a sua gestão das fronteiras, isso é compatível com o respeito pelos direitos humanos", advogou.
Também a particular situação na ilha italiana de Lampedusa foi abordada na reunião do Conselho de Segurança da ONU, com o ACNUR a defender que Itália "não pode ficar sozinha na resposta às necessidades" dos que chegam à região.
A Organização Internacional para as Migrações (OIM) também participou nesta reunião, indicando que estes números são acompanhados de fenómenos como "discriminação, xenofobia, ataques e narrativas negativas contra migrantes e refugiados, que são crescentes e preocupantes".
Já a Rússia aproveitou a reunião para denunciar a política migratória dos países da União Europeia, que acusou de "desencadear uma guerra não declarada contra os migrantes que morrem porque não conseguem encontrar rotas alternativas seguras" para desembarcar.
A sessão do Conselho, a última do mês, foi expressamente convocada pela Rússia não para discutir a migração em geral, mas especificamente a migração no Mediterrâneo e o tratamento que a União Europeia lhe dá.
O embaixador russo, Vasily Nebenzya, disse que a União Europeia só lida adequadamente com a questão da migração "quando se trata da Ucrânia, mas um nível semelhante de solidariedade e tratamento humano por parte dos cidadãos europeus é algo que o povo do Norte de África aparentemente não pode desfrutar".
A França respondeu indiretamente ao embaixador russo recordando a responsabilidade de Moscovo em dois dos cenários de maior êxodo humano: a guerra na Síria - na qual a Rússia participa ao lado do regime de Damasco - e a instabilidade no Sahel, onde a força mercenária russa Wagner intervém cada vez mais abertamente.