Por Jorge Herbert
É sabido que desde o pós-independência que o PAIGC tomou o território da Guiné-Bissau e fez a extensão do quintal da sua sede e assumiu que o povo guineense deve andar sob as batutas do partido, servindo as vontades e caprichos do líder do partido, caindo na desgraça, ou pagando com a própria vida, todo aquele que ousara contrariar esses desideratos… Esse fenómeno ganhou o seu ponto mais alto com o assassinato de Tagmé Na Waye e Nino Vieira, pela mão do próprio PAIGC, o que inexoravelmente veio a conduzir ao golpe de Estado de abril de 2012 e consequentemente uma forte, rápida e necessária intervenção da comunidade internacional no sentido de se conseguir uma boa transição e a restauração do processo democrático no país.
A esperança renasceu para os guineenses em maio de 2014, com a eleição de dois quadros do PAIGC para os mais altos cargos da magistratura guineense, com a Comunidade Internacional a mobilizar esforços no sentido do rápido endividamento externo e condicionamento do país, no sentido de assegurar a estabilidade do país, mas imposta de fora para dentro. O então Primeiro-ministro Domingos Simões Pereira, deliciado e inebriado com esse impulso económico externo, possibilidade única na vida de qualquer político guineense até a data, decidiu incorporar a velha confusão da liderança do partido com a liderança do Estado e quis submeter o Presidente da República aos condicionalismos da liderança do partido que o havia apoiado nas eleições e, o então Presidente da República, Dr. José Mário Vaz, homem conhecido por aqueles que lhes são próximos, como homem de trabalho, de rigor e disciplina quer na vida pessoal, no trabalho como na política, em nome da preservação e valorização dos recursos naturais do país, negando o seu desbaratar, acabou por “chocar de frente” com o então Primeiro-ministro e até agora líder do PAIGC. Desse choque resultou a impossibilidade de coabitação política saudável para a democracia e consequente demissão do Primeiro-ministro.
Desde a demissão do então Primeiro-ministro e líder do PAIGC, vulgo DSP, que a Guiné-Bissau inverteu a trajetória construída em dois anos de transição pacífica, com mobilização dos interesses estrangeiros como nunca visto, pela paz e estabilidade do país. Desde essa demissão, o PAIGC e o seu líder, em vez de assumirem uma oposição democrática e centrada no interesse do país e do povo, optaram pela política de terra queimada, aparentemente por compromissos assumidos com investidores e financiadores externos. Nessa altura, nunca tinha visto tanta intervenção estrangeira na política da Guiné-Bissau, chegando ao extremo de se publicar afirmações de estrangeiros com responsabilidades em organismos internacionais, a dizer que não havia qualquer motivo para a demissão do Primeiro-ministro e, até ameaças de que seriam “congelados” investimentos estrangeiros prometidos para esse arranque pós-transição…
O líder do PAIGC, imbuído da velha cultura PAIGCista e inebriado com esse apoio externo e de alguma franja da sociedade guineense que viam na sua liderança a possibilidade do regresso ao elitismo da era pós-colonial imediato, após ter tentado a todo o custo manter-se como Primeiro-ministro, até com a aceitação da remodelação governamental desde que se mantivesse na liderança do governo, passou a assumir a política destrutiva que, para um doutorando em Ciências Políticas, envergonha a instituição que patrocina esse doutoramento.
Desde a demissão de Domingos Simões Pereira como Primeiro-ministro, a Guiné-Bissau deixou de ter paz, harmonia e tranquilidade, necessária ao desejado início de uma nova era política. Ou era ele, ou era o PAIGC, ou ninguém mais! A perseguição e diabolização da imagem do então Presidente da República, José Mário Vaz, foi tornado o lema principal do PAIGC e durante todo o seu mandato presidencial, o PAIGC não fez outro tipo de política que não tenha sido a de terra queimada! Manifestações, insultos e ameaças a todos que ousassem aproximar-se de Jomav ou concordar com a sua política, tornou-se no principal programa político do PAIGC. O líder do partido blindou estrategicamente os principais órgãos do partido com nomeações de pessoas da sua confiança e promoveu a expulsão e perseguição de todas as vozes que ousassem levantar contra a corrente destruidora e anti-Jomav… Também por domínio dos órgãos da ANP encerrou-se este órgão vital da democracia durante quase uma legislatura! Até familiares e amigos se afastaram com ofensas e ameaças por parte da legião de apoiantes do líder do PAIGC, a todos os que ousassem criticar o amado e admirado líder do PAIGC. A saga da diabolização do Presidente Jomav extravasou para as entidades internacionais e regionais como a CEDEAO, que tudo fizeram para o contrariar e humilhá-lo, em nome dos interesses do dito “renovado” PAIGC e do seu líder. Chegou-se ao cúmulo de ameaças externas a políticos que aceitassem a nomeação para o cargo de Primeiro-ministro e sanções da CEDEAO até a civis, sem qualquer critério nem audição da alegação contraditória! Numa demonstração de total desnorte e desrespeito para como o cargo que ocupa e com a instituição que lhe apadrinha o doutoramento, a Universidade Católica Portuguesa, chegou-se ao cúmulo do líder doPAIGC marcar presença numa manifestação que simulava a morte do mais alto magistrado da nação!
Essa cultura de política negativa e patrocínio de agressividade verbal e até física que culminou com a morte de um manifestante pacífico de nome Demba Baldé, instituída, promovida e quiçá monetariamente patrocinada pelo PAIGC, não tardou a estender-se a outras correntes políticas e chegou-se ao cúmulo de nunca se ter visto o povo guineense tão dividido! Mesmo durante a Guerra civil de junho de 1998, o povo guineense não se dividiu tanto, não se ofenderam nem se insultaram tanto, como na era de DSP na liderança do PAIGC! Pessoalmente, nunca fui tão insultado e ameaçado, apenas e só porque discordava da política PAIGCista e apoiava Jomav! A mesquinhez e pequenez mental que carateriza essa forma de fazer oposição, levou a essa gentinha a rotular-me a mim e a minha família de tudo o que de mais depreciativo possa existir! Até viram em mim um interesseiro a procura do cargo de Ministro da Saúde ou até Primeiro-ministro nomeado por Jomav!
Essa saga de política negativa estendeu-se a toda e qualquer tentativa que o então Presidente Jomav fizesse para “desenrolar o nó político” e permitir que a Guiné-Bissau encontrasse o caminho do desenvolvimento e todo o governo que fosse nomeado era bloqueado a todos os níveis pela máquina PAIGCista, que ainda aos dias de hoje, continua a marcar forte presença na administração pública guineense.
Uma das vítimas dessa política destruidora, foi o atual Presidente da República Úmaro Sissoco Embaló, enquanto Primeiro-ministro nomeado por Jomav.
Após a nata política guineense ter-se juntado contra a candidatura do líder do PAIGC, mais que propriamente apoiar a candidatura de Úmaro Sissoco Embaló, este ganha a segunda volta das eleições e, aquele que a máquina de campanha destruidora PAIGCista mostrava ao mundo como um monstro ditador agarrado ao poder, José Mário Vaz, abandonou o poder com uma rara elevação democrática, demonstrando na hora da passagem do cargo, a alegria de entregar a faixa ao seu sucessor e a honra de ter sido o primeiro Presidente da República da era democrática guineense, a cumprir um mandato sem interrupção. E o líder do PAIGC, para não assumir o destino que havia desejado a JOMAV, assinando a sua sentença de morte política, recorreu à instrumentalização do Supremo tribunal de Justiça para tentar travar a nomeação oficial do novo Presidente da República, com argumentos legais mais estapafúrdios que já se viu num tribunal supremo! Como se não bastasse, mobilizou todos os seus “nhanherus” para uma nova campanha de diabolização do novo Presidente da República Úmaro Sissoco Embaló. Vimos canais de comunicação social portuguesa a transmitir mentiras como verdades absolutas e a repetirem até a exaustão o rótulo de autoproclamado ao Presidente da República eleito nas urnas! Vimos uma saga de exposição de documentos estritamente de interesse da administração pública guineense a serem expostos nas redes sociais! Vimos a instrumentalização de mortes nos hospitais, de instrumentalização do sindicalismo, tudo para provocar bloqueio e disfuncionalidade no aparelho do Estado! Até a existência de COVID na Guiné-Bissau questionaram, acusando o governo de tentativa de angariar financiamento, inventando casos de COVID!
Estamos a caminho de oito anos, desde que o líder do PAIGC foi demitido como Primeiro-ministro e, até hoje, não mais se viu o PAIGC a fazer uma oposição política construtiva em prol do país e do seu povo!
No que concerne a justiça, o PAIGC sempre se achou dono e senhor desse órgão da soberania e este “renovado” PAIGC fez questão de não fugir a regra! Sempre que algum elemento do PAIGC for indiciado pela justiça, inventam inúmeros argumentos para se vitimizarem de que estão a ser perseguidos por este ou aquele! Os Procuradores da República são sempre alegadamente comprados ou manipulados por interesses políticos contra o PAIGC. Vimos isso no caso dos Ministros do Governo de DSP indiciados no caso dos Passaportes diplomáticos, vimos isso no caso do resgate ao Banco, assistimos a isso no caso Manecas dos Santos e as condições para o golpe de Estado, vimos isso na negação do cumprimento do Acórdão judicial em relação à reintegração dos deputados expulsos e agora a impugnação da realização do Congresso por parte de um militante... No entanto, quando as decisões ou diligências judiciais lhes são favoráveis ou atacam seus opositores, apressam-se a dizer que é o Império da lei a funcionar!
Face a todo essa dissonância e eterna incompatibilidade entre a democracia e o PAIGC e entre a verdadeira justiça e o PAIGC, alguém acha que é possível liderar um governo na Guiné-Bissau ou fazer funcionar a justiça na Guiné-Bissau, com o PAIGC fora do poder, sem ter que se usar alguma força dissuasora pela parte do Estado,? Enquanto o PAIGC e o seu líder acharem que estão acima dos órgãos que garantem o funcionamento do Estado na Guiné-Bissau e sentirem-se no direito de desafiar o poder político ou judicial, o Estado só tem dois caminhos, ou faz uso da força policial para fazer valer as decisões dos órgãos do Estado, ou assume que quem continua a dirigir o Estado é o PAIGC.
Porque é que o PAIGC tem o direito de expulsar toda e qualquer voz que se ouse levantar dentro do partido, contra o líder, mas os membros do mesmo partido não têm direito de recorrer à justiça para travar a realização de um Congresso que, na interpretação deles, não cumpre com os Estatutos do partido!? Porque razão o PAIGC insiste mesmo assim em realizar o Congresso, contra uma decisão judicial a favor da impugnação do mesmo?! Porque o PAIGC insiste em não faz valer o Império da Lei, quando as decisões não lhe são favoráveis?!
O que espera o líder do PAIGC dos detentores do poder, senão o uso da força do Estado contra o seu partido, sempre que houver motivos, depois de levar quase oito anos de prática de uma política destrutiva dos adversários políticos e dos próprios Órgãos da soberania!?
Sendo contra a violência em qualquer modalidade, quer física como verbal, não posso esperar que o PAIGC e o seu líder não colham tempestades, depois de terem passado todos estes anos a semear ventos!
Curiosamente, tenho visto algumas pessoas que viam na atitude pacifista de JOMAV uma cobardia e diziam que devia usar a força do Estado para colocar o PAIGC e o seu líder no respetivo lugar, a manifestarem-se hoje contra o uso da força por parte do Estado, contra o PAIGC! Sinais do tempo?!
Jorge Herbert
PS. Bó pudi kobam mal a vontade, pabia n´kustuma dja bos!
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