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POR LUSA 06/09/23
A África do Sul adquiriu o equipamento militar transportado pelo navio mercante russo Lady R a uma empresa nos Emirados Árabes Unidos, indicou um inquérito presidencial à controversa operação que os Estados Unidos alegaram ser de apoio à Rússia.
"O painel estabeleceu que a mercadoria que foi entregue pelo navio Lady R em Simonstown era equipamento para a SANDF [Forças Armadas da África do Sul], que havia solicitado, tinha sido encomendado pela Armscor [a agência de aquisição de armamentos do Ministério da Defesa sul-africano] e que era aguardado desde 2018. O equipamento foi encomendado a uma empresa sediada nos Emirados Árabes Unidos. Estava muito atrasado", lê-se no sumário do relatório de uma investigação, divulgado pela Presidência da República sul-africana, a que a Lusa teve acesso.
O painel de investigação escusou-se a qualificar o tipo de "equipamento" descarregado pelo navio russo na base naval sul-africana.
Todavia, no documento refere-se que "o painel examinou toda a legislação aplicável, incluindo os requisitos rigorosos da África do Sul para a importação e exportação de armas convencionais".
O documento, de quatro páginas, explica que "o fabrico, embalagem e entrega do equipamento foram atrasados, entre outros, pelos surtos de covid-19 e pelo conflito Rússia-Ucrânia".
"Nem a SANDF, a Armscor ou a AB Logistics, a divisão da Armscor responsável pela prestação de serviços logísticos de frete e viagens à Armscor e à SANDF, escolheram o Lady R como meio para entrega, nem tiveram controlo sobre o processo, nos termos contratuais. Na verdade, a África do Sul não teve qualquer controlo sobre a escolha do navio", refere-se no sumário da investigação divulgado pela Presidência sul-africana.
O painel apontou que as autoridades da Defesa sul-africana tomaram conhecimento, em outubro de 2022, que o navio Lady R estava sob sanções dos Estados Unidos da América (EUA) "quando o navio já se encontrava a caminho", sublinhando que "essas sanções não tinham sido aprovadas pelas Nações Unidas e, portanto, não eram vinculativas para a África do Sul".
"Os agentes de navegação em Ngqura/Port Elizabeth, onde o navio inicialmente pretendia atracar, recusaram-se a prestar assistência ao navio em resultado das sanções dos EUA. Isto só se tornou aparente quando o navio já se aproximava de águas sul-africanas", adiantou.
Segundo o painel, para resolver a situação, "a SANDF, em colaboração com a Armscor e o fornecedor, decidiu orientar o navio a atracar em Simonstown, onde a mercadoria/equipamento foram descarregados".
Segundo o documento, o equipamento militar foi descarregado durante a noite, entre os dias 07 e 09 de dezembro de 2022, sublinhando que "os detalhes do equipamento descarregado e o uso a que se destina são do conhecimento do Painel".
"Apesar de alguns rumores de que algum equipamento ou armas foram carregados no Lady R, o Painel não encontrou provas que fundamentassem essas alegações. As provas disponíveis apenas confirmaram o descarregamento e que não houve nada carregado", concluiu o painel de investigação.
Em comunicado, divulgado na noite de terça-feira, a Presidência da República sul-africana considerou como encerrada a investigação sobre a polémica despoletada pelos EUA em torno do navio russo Lady R.
"Devido à natureza confidencial das provas que informaram o relatório, o Governo não se pronunciará mais publicamente sobre a substância do relatório", afirmou.
Numa comunicação ao país na noite anterior, o Presidente Ramaphosa disse que o relatório permanecerá confidencial por motivos de defesa e segurança nacional do país.
O chefe de Estado sul-africano nomeou o painel liderado pelo juiz reformado Phineas Mojapelo para investigar as alegações dos Estados Unidos de que o navio russo transportava armas e munições da África do Sul com destino à Rússia para a guerra na Ucrânia.
Em maio, o embaixador dos Estados Unidos na África do Sul, Reuben Brigety, alegou publicamente que Pretória tinha carregado armas e munições no navio russo Lady R, que atracou na base naval de Simonstown, próximo da Cidade do Cabo, entre 06 e 09 de dezembro de 2022.
Na altura, as alegações do embaixador norte-americano colocaram também o foco na insistência da África do Sul em se manter "não-alinhada" com os países da Europa e do Ocidente que prestam apoio militar a Kiev como resposta à guerra da Rússia na Ucrânia, optando por encetar esforços diplomáticos de paz para a resolução do conflito.
O embaixador dos EUA não divulgou publicamente as provas do alegado fornecimento sul-africano de armas e munições à Rússia para a guerra na Ucrânia.