© STEFANI REYNOLDS/AFP via Getty ImagesPOR LUSA 14/04/23
Jack Teixeira, membro da Guarda Aérea Nacional de Massachusetts detido na quinta-feira após emergir como um dos principais suspeitos na divulgação de documentos militares norte-americanos altamente confidenciais, falava frequentemente sobre Deus, armas e segredos de guerra.
Num mundo em que as redes sociais produzem uma série de informações rastreáveis, não demorou muito para que as autoridades federais e os jornalistas especialistas em verificação de dados chegassem ao nome de Jack Teixeira.
Teixeira, de 21 anos, que serviu na Guarda Aérea Nacional de Massachusetts, foi detido na quinta-feira em conexão com a divulgação de documentos classificados de grande alcance que abalaram várias capitais, desde Washington a Kiev, passando por Seul, com revelações de espionagem dos Estados Unidos a aliados e inimigos e a divulgação de inteligência militar sensível sobre a guerra na Ucrânia.
O procurador-geral norte-americano, Merrick Garland, disse que Teixeira seria acusado de subtração não autorizada de informações classificadas de defesa nacional.
Havia pistas em mensagens publicadas num fórum de conversação no Discord, uma plataforma onde se acredita que Teixeira fez durante anos publicações sobre armas, jogos e os seus 'memes' favoritos -- além de segredos norte-americanos até então bem guardados.
O 'site' de jornalismo de investigação Bellingcat e o The New York Times identificaram Teixeira publicamente pela primeira vez na quinta-feira, minutos antes de autoridades federais confirmarem que se tratava de uma pessoa de interesse na investigação. Ambos rastrearam perfis em outros 'sites' mais obscuros ligados a Teixeira.
O suspeito, como parte das suas funções profissionais, teria tido acesso a informações altamente sigilosas.
O caso ressalta os desafios que os Estados Unidos e outros Governos têm em manter segredos numa era de dados omnipresentes e com um número cada vez maior de utilizadores experientes que sabem como explorá-los.
Quando questionado sobre como um militar tão jovem - de apenas 21 anos - poderia ter acesso a documentos altamente confidenciais, o porta-voz do Pentágono, Patrick Ryder, disse que era da natureza dos militares confiarem nos seus membros muito jovens grandes níveis de responsabilidade, incluindo questões significativas de segurança.
Soldados recém-saídos do ensino secundário foram lutar no Iraque, Afeganistão e outras zonas de combate, muitas vezes usando informações ultrassecretas e programas para atingir adversários.
"Nós confiamos aos nossos membros muita responsabilidade desde muito cedo. Pense num jovem sargento de pelotão de combate e na responsabilidade e confiança que depositamos nesses indivíduos para liderar as tropas em combate", disse Ryder.
Em declarações anteriores à agência Associated Press (AP), o divulgador da informação confidencial foi identificado como "The O.G." por um membro de um grupo de um 'chat' onde Teixeira e outras pessoas fizeram publicações por anos. O membro do grupo recusou-se a identificar-se à AP, alegando preocupações com a sua segurança pessoal.
O grupo de conversação, chamado "Thug Shaker Central", atraiu cerca de duas dúzias de entusiastas que falaram sobre o tipo favoritos de armas e também compartilharam memes e piadas, algumas delas racistas. O grupo também manteve uma discussão contínua sobre guerras, que incluiu conversas sobre a invasão da Ucrânia pela Rússia.
Nessa discussão, "The O.G." publicou por meses material que disse ser confidencial -- originalmente digitando com as suas próprias anotações. Contudo, há alguns meses começou a publicar imagens de documentos com marcas de dobras, porque sentiu que as suas redações não eram levadas a sério, disse a fonte à AP.
Um participante diferente do grupo compartilhou alguns dos arquivos num outro grupo de conversação - e a partir daí parecem ter-se espalhado pela internet.
A fonte da AP disse que não falou na quinta-feira com Teixeira, mas manteve contacto no início da semana. Jack Teixeira disse que sabia que o FBI (polícia federal norte-americana) estava à sua procura.
Teixeira era um aviador de primeira classe destacado para uma unidade de inteligência da Força Aérea, de acordo com publicações na rede social Facebook da 102.ª Ala de Inteligência com base na Base da Guarda Aérea Nacional de Otis, em Massachusetts.
Na Guarda Aérea Nacional, Teixeira era "especialista em sistemas de transporte cibernético", ou seja, um especialista em tecnologias de informação responsável pelas redes de comunicações militares. Nesse papel, o jovem teria um nível mais alto de habilitação de segurança porque também teria a responsabilidade de aceder e garantir a proteção da rede, disse um oficial de defesa à AP.
A Guarda Nacional emitiu um comunicado afirmando que estava ciente da investigação e que "leva esta questão muito a sério".
"A segurança nacional é nossa principal prioridade e qualquer tentativa de miná-la compromete os nossos valores e degrada a confiança entre os nossos membros, o público, aliados e parceiros", pode ler-se no comunicado.
Agentes policiais bloquearam na quinta-feira a rua em frente à casa identificada como pertencente à família de Teixeira.
A fonte que falou com a AP disse que "The O.G." -- que reconheceu na quinta-feira como Teixeira -- era um cristão que frequentemente falava de Deus e orava com os membros do grupo de conversação.
Enquanto estava alistado, Teixeira opôs-se a muitas das prioridades do Governo dos Estados Unidos e denunciou os militares "já que eram dirigidos por políticos de elite", disse o membro do 'chat', acrescentando que não sabia o motivo de Teixeira se ter alistado em primeiro lugar.
Contudo, a fonte frisou não acreditar que Teixeira divulgou os documentos com o intuito de minar o Governo norte-americano ou por uma razão ideológica.
Quando o New York Times publicou pela primeira vez uma história sobre os documentos na semana passada, disse a fonte, os membros do grupo estavam numa videochamada com "The O.G.".
"Basicamente, o que ele disse foi: 'Lamento muito pessoal, rezei todos os dias para que isso não acontecesse'", disse a fonte. "'Eu orei, e orei, e agora cabe somente a Deus decidir o que acontecerá a seguir'", acrescentou.