Iancuba Dansó dw.com 11/04/23
Duas semanas depois da decisão das autoridades guineenses de retirar as crianças talibés das ruas e da situação de mendicidade, uma organização que monitoriza o caso diz que a medida está a ser cumprida na totalidade.
Diariamente, nos mercados e nas ruas, e todas as sextas-feiras, nas mesquitas de Bissau e do interior do país, viam-se crianças "talibés" - alunos do ensino corânico - a pedir dinheiro para levar aos mestres.
Os doutrinadores são acusados por organizações da sociedade civil de maltratar os menores que não entregam o dinheiro solicitado.
Desde que as autoridades decidiram, no passado dia 27 de março, retirar as crianças talibés das ruas da Guiné-Bissau, a DW África não testemunhou mais nenhuma movimentação de alunos do ensino corânico nas ruas da capital guineense.
"Situação controlada"
Suleimane Embaló, presidente da Associação Guineense de Luta Contra Migração Irregular, Tráfico dos Seres Humanos e Proteção das Crianças (AGLUCOMI-TSH), que tem monitorizado e denunciado a situação desses menores, disse à DW África que a situação está controlada.
"Graças a um esforço que fizemos junto com os mestres corânicos, União dos Imames e as autoridades policiais, neste momento as crianças não estão a sair as ruas para a mendicidade. Isso não é só em Bissau, mas também a nível nacional", destaca.
Sobre o caso, a DW África tentou, sem sucesso, contactar o Ministério do Interior, responsável pela segurança do país.
O sociólogo Ivanildo Bodjam sublinha a gravidade do fenómeno: "A situação das crianças talibés na Guiné-Bissau deve ser vista como um problema nacional, porque a mendicidade a que são colocadas essas crianças retira tudo que tem a ver com o princípio da proteção da criança, quando o Estado da Guiné-Bissau ratificou as convenções para a sua proteção, contra qualquer forma de exploração, do trabalho, sexual e outros riscos a que são expostas".
Mais de 700 alunos em escolas corânicas
A Associação Guineense de Luta Contra Migração Irregular, Tráfico dos Seres Humanos e Proteção das Crianças disse ter registado, em Bissau, recentemente, mais de duas dezenas de escolas corânicas, que albergam mais de 700 alunos, dos quais mais de 200 saíam às ruas para pedir.
O presidente da Associação anuncia o início de uma ação de sensibilização para a "mudança de mentalidade" dos mestres corânicos, em relação à forma de tratamento das crianças talibés.
Mas Suleimane Embaló alerta que é urgente a reintegração desses menores, agora retirados das ruas: "Estamos mais uma vez a pedir às pessoas de boa vontade e às autoridades para que acelerem o processo de reintegração dessas crianças junto das famílias, porque se não, a situação vai complicar-se e vai ser muito difícil de controlar."
O sociólogo Ivanildo Bodjam defende que o Estado da Guiné-Bissau deve colaborar com a comunidade escolar corânica: "Como forma de melhorar a qualidade e acesso a esse modelo de ensino, sendo importante mecanismo que o Estado possa encontrar e evitar que essas mesmas crianças sejam enviadas para outros países, com riscos de serem doutrinadas com o fundamentalismo radical, capaz de fomentar o extremismo violento na Guiné-Bissau".
Revoltado com a situação dos alunos corânicos, no mês passado o Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló, ordenou a detenção de qualquer mestre corânico que a partir de 27 de março mandasse uma criança talibé para a mendicidade nas ruas do país.
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