sábado, 11 de maio de 2019

Guiné-Bissau: Impasse político poderia ser resolvido com substituição do sistema semipresidencial

Um jurista português considerou hoje que o impasse político que “atormenta” a Guiné-Bissau não é novo, mas poderia ser resolvido se o país conseguisse “tomar a decisão soberana” de substituir o actual sistema semipresidencial por um sistema presidencial.

BBC News Brasil responde às principais dúvidas dos leitores em relação ao pleito deste ano com base em informações da Justiça Eleitoral Getty Images

A Guiné-Bissau está a viver um novo impasse político, dois meses depois de realizadas as eleições legislativas de 10 de Março, o que tem condicionado a nomeação do futuro primeiro-ministro e a formação de um novo Governo.

Fernando Loureiro Bastos, docente na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e antigo presidente do Conselho Científico e Técnico do Centro de Estudos e de Apoio às Reformas Legislativas da Faculdade de Direito de Bissau entre 2007 e 2011, sustenta que ainda que a Guiné esteja “atormentada com esta questão”, ela “já se prolonga há vários anos”.

“Há um problema fundamental em relação à vida política na Guiné-Bissau que é a questão constitucional”, disse à Lusa.

Seria muito importante que os guineenses “conseguissem tomar a decisão soberana” de substituir o actual sistema semipresidencial por um sistema presidencial, acrescentou.

“O que tem acontecido ao longo dos anos é um conflito entre o Presidente da República e o Governo por causa de uma falta de compreensão sobre o que é a divisão de poderes e de tarefas que existe num sistema semipresidencial”, explica o especialista.

O actual sistema político em vigor na Guiné-Bissau foi inspirado pela Constituição Portuguesa de 1976, mas, sustentou, “não se adequa às características de organização de uma sociedade como a guineense".

"O que nós vemos é que em Angola e em Moçambique esse modelo foi substituído por um modelo presidencialista porque é mais fácil ter uma compreensão de um poder quando ele está unificado num só órgão”, sustenta Fernando Loureiro Bastos.

O professor português reconhece que a distribuição de poderes é “muito útil” para o controlo das actividades políticas, mas “infelizmente no caso da Guiné-Bissau, tem conduzido a esta paralisia”, que não é explicada, sequer, pela inexistência de uma maioria parlamentar.

A questão tem que ser vista para além da perspectiva “jurídica” e “constitucional”, diz o especialista. “É uma questão de relações de poder. E nas questões de relações de poder, a existência de uma maioria não tem o mesmo significado do que quando estamos a olhar do ponto de vista estritamente legal”, sustenta o professor.

“Não é possível transpor aquilo que é a nossa leitura relativamente ao nosso parlamento para uma situação como é a da Assembleia Nacional Popular da Guiné Bissau”. Não basta “existir um grupo parlamentar com um X número de deputados porque a sua vinculação, às vezes, é mais fraca do que se poderia imaginar”, diz.

“Neste momento, parece-me que chegámos a um ponto em que vai ser preciso dar resposta a esta pergunta: os guineenses querem modificar a Constituição? Neste momento, a questão fundamental é conseguir encontrar regras de funcionamento para o sistema político que permitam uma certa fluidez”, advoga o professor da faculdade de Direito de Lisboa.

“Agora, é verdade, há aqui um bloqueio que às vezes é melhor do que um conflito aberto. Há uma situação de estagnação. Resta saber se, infelizmente, não se estão a criar as condições para qualquer coisa que é pior do que a mera estagnação, qualquer coisa que possa levar a um conflito entre várias facções”, acrescenta.

Quanto ao silêncio do Presidente da República guineense, José Mário Vaz, em relação ao atual impasse político, Loureiro Bastos diz que o actual chefe de Estado, que “tem sido fonte destas dificuldades no funcionamento do sistema”, está a “reservar-se, até porque vão ter lugar eleições presidenciais” e não há qualquer candidato favorito à partida.

“Julgo que ele, neste momento, não se quererá envolver em nenhuma polémica desnecessária que possa pôr em causa as eleições presidenciais”, considera o analista.

Os deputados guineenses eleitos nas legislativas de 10 de Março levaram mais de um mês a tomar posse, a 18 de Abril, mas o início da X legislatura está a demonstrar as fracturaras político-partidárias que existem no país com o impasse criado com a eleição para a mesa da Assembleia Nacional Popular.

O parlamento da Guiné-Bissau está dividido em dois grandes blocos: Um inclui o PAIGC (partido mais votado, mas sem maioria), a APU-PDGB, a União para a Mudança e o Partido da Nova Democracia, com 54 deputados; o outro juntou o Movimento para a Alternância Democrática (Madem-G15, segundo partido mais votado) e o Partido de Renovação Social (PRS), com 48 deputados.

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