terça-feira, 6 de outubro de 2020

Guiné-Bissau: A guerra silenciosa na Presidência, Nova Maioria e Governo

© e-Global Notícias em Português   05/10/2020 às 17:13

Cada vez mais frequente são os rumores que apontam para um desentendimento entre os elementos da nova maioria parlamentar, mas oficialmente ninguém aceita dar a cara e assumir, nem para desmentir, assim como ninguém desmente que está em curso uma silenciosa na Presidência, nova maioria e Governo.

As dúvidas sobre continuidade de Nuno Nabian como primeiro-ministro (PM), a fraca influência de Braima Camará perante as instituições e face ao presidente Umaro Sissoco Embaló, a decisão de Sisssoco Embaló em propor a integração do PAIGC no Governo e a recusa do PRS ao projecto de Constituição de Umaro Sissoco Embaló, são elementos que sustentam os indícios discordâncias, diferendos e crise.

A presidência, governo e partidos que constituem os alicerces da nova maioria, comunicam-se com reservas, cada uma das partes receia ser vítimas dos seus aliados, e o sentimento de governarem no fio de uma navalha é cada vez mais presente.

A nova maioria persiste, mas é agora constituída de várias versões de novas maiorias segundo a óptica de cada líder. Também Umaro Sissoco Embaló tem a sua visão do que poderá ser uma nova na nova maioria.

A remodelação governamental, várias vezes adiada, irá definir os novos poderes e xadrez da nova maioria bem como poderá definir a consubstanciação de uma “nova nova maioria” com Umaro Sissoco Embaló a liderar, que será a antecâmara da afirmação do sistema presidencialista num ambiente ainda regido por um semipresidencialismo moribundo.

O convite ao PAIGC para integrar o Governo sugere ser uma iniciativa unilateral de Umaro Sissoco Embaló. Uma intenção estratégica que está a dividir os apoiantes do Chefe de Estado, mas alguns não escondem que a intenção do Presidente da República “está certa”. Nelson Moreira, vice-líder da bancada parlamentar do MADEM disse a 3 de Outubro que apoia a integração do PAIGC no Governo, por esta ser a única forma de garantir a estabilidade governativa e permitir a execução de algumas politicas do Chefe de Estado.

Apesar de algumas posições favoráveis, a hipótese de integração do PAIGC no governo tem a maior oposição no interior deste partido que acabou por condicionar a entrada no Governo com a exigência de liderar o executivo, tendo em conta que foi o partido mais votado nas eleições legislativas de 2019.

Quanto ao PRS tem centrado a sua resistência no Projecto de revisão Constitucional da Comissão idealizada por Umaro Sissoco Embaló, e a sua posição foi manifestada na recente Conferência Internacional, que os Renovadores organizaram por ocasião das comemorações de 24 de Setembro, Dia da Independência.

Com o tema “Importância da Revisão Constitucional e a sua Pertinência”, os oradores convidados pelo PRS concluíram que, o projecto apresentado pela Comissão criada por Umaro Sissoco Embaló não comporta todos os elementos necessários. Jorge Bacelar Gouveia, constitucionalista português convidado para abordar o tema, “desaconselhou” a mudança do Regime Político e sustentou que o semipresidencialismo está adequado à realidade do país. Na opinião deste constitucionalista, a opção deveria ser a revisão pontual de alguns artigos.

A inconstitucionalidade da Comissão criada por Umaro Sissoco Embaló, é todavia o ponto considerado mais grave e juridicamente complexo a defender. O Presidente da República não tem poderes de iniciativa Constitucional, pelo que não tem a aderência nem do Parlamento e muito menos de alguns partidos.

Terá sido com a intenção firme de viabilizar a sua revisão Constitucional que levou Umaro Siossoco a apostar na integração do PAIGC no governo, e assim negociar obter a maioria de 2/3 dos deputados da Assembleia, necessários para aprovar uma nova Constituição. No entanto, Domingos Simões Pereira, líder dos Libertadores, já foi peremptório considerando que o projecto de revisão constitucional é “uma proposta que não existe”, não dando hipóteses a qualquer negociação com esta base.
 
ENIGMÁTICO SILÊNCIO DE BRAIMA CAMARÁ
Cada vez mais sentido nos corredores do poder é Bissau, que também sustentam o desentendimento crescente entre os ideólogos e lideres da nova maioria, são as supostas as fricções entre o Presidente da República, Umaro Sissoco Embaló e o Coordenador do Movimento da Alternância Democrática (MADEM), Braima Camará, que publicamente permanece em silêncio.

Se na verdade não existem quaisquer trocas de acusações ou choques públicos entre os dois, não é menos verdade que os seus activistas têm levantado o véu da existência de uma real crise. O primeiro indício foi lançado pelo blogger Denilson Ferreira, vulgo “Doka Internacional”.

O blogger, que até Maio de 2020 agia como promotor de Sissoco Embaló e Braima Camará, tornou-se num denunciante e severo crítico contra o actual poder, devido a uma alegada “traição” de que terá sido alvo por parte do Presidente e do líder do MADEM, bem como dos seus acólitos.

Sissoco Embaló é o alvo privilegiado destes ataques. “Doka Internacional” alega que o presidente utiliza a ministra dos Negócios Estrangeiros, Suzi Barbosa, como “uma das pessoas” para o perseguir. O mesmo afirma também que Braima Camará está igualmente revoltado, depois de ter compreendido que foi usado por Sissoco Embaló na guerra contra Domingos Simões Pereira.

Mas não são apenas estes os sinais das eventuais divergências. Os chamados activistas, jovens apoiantes de Sissoco Embaló e Braima Camará, muito activos nas redes sociais, estão neste momento num violento duelo virtual e confronto público sem tréguas através das suas páginas. Um bloco defende Umaro Sissoco Embaló e outro apoia indefectivelmente Braima Camará.

Os motivos da crise estarão ligados a uma suposta resistência de Umaro Sissoco Embaló de não ser tratado, ou controlado, por Braima Camará como terá acontecido com o antigo presidente José Mário Mário Vaz (Jomav).

Umaro Sissoco Embaló não quer ser referido em moldes semelhantes como aconteceu durante a campanha das legislativas de 2019, em Braima Camará disse publicamente no Canchungo (um dos sectores da região natal de Jomav) que foi ele quem indicou a José Mário Vaz todas as pessoas por este nomeadas.

Não esquecendo este episódio, Umaro Sissoco Embaló decidiu resistir a essas tentativas, pondo um travão no protagonismo do Coordenador do MADEM.

A pouca visibilidade de Braima Camará está a ser encarada por alguns como a “falta de reconhecimento” do importante papel e trabalho que levou a cabo nas eleições legislativas e particularmente nas eleições presidenciais. Mais discretamente as dissonâncias entre Umaro Sissoco Embaló e Braima Camará acentuaram-se durante a comemoração do Dia da Independência.


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