terça-feira, 1 de setembro de 2020

REVISÃO CONSTITUCIONAL E INTRODUÇÃO DA LÍNGUA ÁRABE NO ENSINO NA GUINÉ-BISSAU.

Por Jorge Herbert

Tudo o que sei sobre estes dois assuntos, é o que vou vendo/lendo nas notícias e nos comentários nas redes sociais e é sob esse prisma que opino.
Primeiro, não vejo qualquer problema que o Presidente da República crie um grupo de trabalho para pensar e propor uma Revisão Constitucional, mas que não poderá passar disso mesmo, uma proposta, que terá obviamente de passar pelo crivo de uma comissão parlamentar criada para o efeito, que depois terá de o submeter a apreciação e votação dos verdadeiros representantes do povo numa democracia representativa, os deputados...

Segundo, qualquer Constituição da República num Estado de Direito tem de respeitar o princípio da separação de poderes. Um Presidente da República não pode presidir sempre os Conselhos de Ministros, sob pena de secundar a importância do chefe de governo, escolhido pelo partido mais votado pelo povo para chefiar o governo. A Presidência da República num sistema semi-presidencialista é um órgão de arbitragem, fiscalização e moderação das funções do executivo e nunca um órgão com funções executivas...

Terceiro, concordo com a criação de um Tribunal Constitucional, mas não concordo que a Presidência da República tenha o direito de indicar o mesmo número de juizes que a ANP, enquanto que o Conselho Superior da Magistratura que é um órgão independente, apolitico e que tem maior ónus de independência política seja secundado com apenas um voto entre os cinco juizes! Fica-me a inquietação relativa a necessária independência daquele que é para mim, o mais importante órgão judicial do país.

Quarto, pode parecer absurdo, mas não posso deixar de concordar que, para se concorrer aos mais altos cargos da representação do Estado, o cidadão guineense deva ter residência permanente (não significa estar permanentemente no país) e pagar os impostos no país, durante a legislatura ou mandato presidencial que antecede a sua candidatura. Dessa forma, garante-se o comprometimento do candidato com o povo em relação aos seus projetos políticos e evita aventurismos de guineenses preparados e financiados desde fora para ir ganhar as eleições e defender os interesses estrangeiros na Guiné-Bissau...

Quanto a introdução da língua árabe no nosso sistema de ensino, não entendo qual é o problema! Vivemos num estado independente e laico, onde temos uma língua estrangeira como a língua oficial e mais outras línguas estrangeiras no nosso ensino, como é o caso do Francês e Inglês. 

Qual é o medo da introdução da língua árabe? O domínio do país pelos árabes?
Vamos ver, qualquer expansão de um povo e o domínio de outros povos passou por três frentes: a lingua, o comércio (hoje pomposamente denominado economia do mercado) e a religião... Foi dessa forma e com essas três armas que os países colonizadores conseguiram serem aceites e dominarem os países colonizados... 
Hoje, vivemos num mundo cada vez mais globalizado e competitivo e, os países com poderio económico, cada vez com maior ânsia de expansão do seu mercado e as religiões a competirem por inerência para melhor posicionamento, expansão e até o sonho de domínio global... Não é à toa que hoje, na maioria dos países europeus, já se ensina o mandarim como uma disciplina opcional! É nesse contexto que o meu país, a Guiné-Bissau, tem de se posicionar, rompendo com o “status quo” que o aprisionou e atrasou durante décadas como país independente e encontrar a sua posição num mundo global, rumo ao desenvolvimento. Quanto a religião,  tem de ser vista no contexto da educação dos povos, mas essencialmente da fé individual, quando a sociedade é devida e suficientemente informada.

Que sejamos uma sociedade predominantemente católica ou muçulmana, para mim é indiferente, desde que haja liberdade de escolha de cidadãos em que a maioria é escolarizada e bem informada! Não podemos é continuar a aceitar o uso abusivo do obscurantismo e da miséria para a manipulação da consciência cívica, com fins lucrativos que não dos guineenses nem da Guiné-Bissau.
Jorge Herbert

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