Por LUSA
O apelo da União Africana (UA) e dos 120 ministros de todo o mundo foi feito em Barcelona, Espanha, no âmbito da MONDIACULT 2025, a Conferência Mundial sobre Políticas Culturais e Desenvolvimento Sustentável da UNESCO (a agência das Nações Unidas para a Educação e Cultura), que termina hoje.
No documento final do encontro, com o título "Compromisso dos Ministros e Ministras da Cultura MONDIACULT 2025", os 120 signatários defendem o "fomento do diálogo, da cooperação e das ações bilaterais e multilaterais efetivos e construtivos sobre o regresso e a restituição aos países de origem dos seus bens culturais que possuem valor espiritual, histórico e cultural, conforme for apropriado".
Os ministros dizem, no mesmo documento, ser necessário "assegurar a participação significativa dos grupos afetados nos países de origem, incluindo os povos indígenas, as pessoas afrodescendentes e as comunidades locais, nos esforços relacionados com a proteção, o retorno e a restituição de bens culturais, incluindo através de uma maior colaboração com os museus".
A questão da restituição de bens culturais surge na declaração final da MONDIACULT 2025 como uma das medidas a promover para o reconhecimento dos direitos culturais como direitos humanos.
A União Africana (UA), também presente na MONDIACULT 2025, organizou hoje com a UNESCO uma sessão paralela aos trabalhos da conferência precisamente sobre a restituição dos bens culturais a África, apelando para que haja maior rapidez nos processos e que esta questão se mantenha no "topo da agenda mundial".
Como lembrou a diretora do Departamento de Cultura da UA, a moçambicana Ângela Martins, a União Africana adotou como tema para 2025 "Justiça para os africanos e pessoas de ascendência africana através de reparações" e tem promovido uma série de iniciativas e instrumentos (jurídicos e outros) para abordar esta questão e apoiar os Estados-membros.
Também a UNESCO tem insistido neste tema, com a promoção de novas formas de cooperação e acordos.
Ainda assim, e apesar do debate de vários anos, os processos de restituição de bens culturais têm sido lentos e pontuais, como destacaram hoje vários governantes e peritos na sessão da MONDIACULT 2025.
"É necessário que haja mais colaboração bilateral entre os estados. Nós, como União Africana, podemos apoiar, podemos suportar, podemos popularizar os instrumentos, mas para concretizar a restituição tem que ser a colaboração bilateral entre os Estados", disse Ângela Martins, em declarações à Lusa à margem da sessão.
Ângela Martins ressalvou que, apesar de tudo, essa cooperação "tem vindo a acontecer", mas reconheceu que falta mais diálogo, sobretudo, entre países europeus e africanos.
"É certo que está a ser um pouco moroso, mas acreditamos que haverá, nos próximos tempos, maior aderência às restituições de bens culturais africanos", acrescentou.
O jurista senegalês especialista em restituição de património cultural Ibrahima Kane disse na sessão de hoje em Barcelona que apesar dos muitos debates e de "os sistemas jurídicos" por todo o mundo permitirem e conceberam a restituição de bens, a questão é "muito complicada" nos países europeus e, na verdade, quase nada foi feito até hoje.
Ibrahima Kane deu como exemplo França, com um Presidente, Emmanuel Macron, que assumiu um compromisso com a devolução de bens a África, mas em paralelo com uma legislação que a obstaculiza, obrigando, por exemplo, a votos no parlamento para cada caso concreto.
Em França, há 150 mil bens culturais que poderiam ser devolvidos a África, o que obrigaria a 150 mil votações parlamentares, afirmou o jurista, para quem a forma de acelerar estes processos passa por uma "posição comum" no seio da União Europeia, que abranja todos os 27 estados-membros e com que todos os países se comprometam.
Do lado africano, já existe essa posição comum, adotada no seio da União Africana.
Sem "diálogo entre África e Europa" não se encontrarão soluções, afirmou Ibrahima Kane.
O jurista lembrou que estão em causa objetos que são património, não meras obras de arte, cuja retirada de África causou danos profundos nos povos do continente e continua a limitar o próprio desenvolvimento local, como acontece na investigação científica.
Também a representante da UNESCO junto da União Africana, Rita Bissonauth, sublinhou que falar de restituição de bens culturais é, sobretudo, falar de justiça, que não se pode construir um futuro sem saber o que aconteceu no passado e que, perante vazios legais internacionais nesta matéria, é importante o diálogo entre países.
Um dos países que levaram esta questão à MONDIACULT 2025 foi Angola, com o ministro da Cultura a apelar à UNESCO, numa intervenção numa sessão da conferência, na terça-feira, para reafirmar "a importância da justiça reparadora para africanos e afrodescendentes", incluindo a restituição de bens culturais.
"Estamos convictos de que esta ação reparadora contribuirá significativamente para fortalecer o potencial económico do setor cultural africano, ampliando as ofertas de exibições de arte e promovendo o consequente aumento da receita proveniente do turismo cultural", para além de ser uma forma de "restaurar danos históricos", disse Filipe Zau.
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Washington, 30 set 2025 (Lusa) - O Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou hoje que a inflação em São Tomé e Príncipe pode voltar aos dois dígitos, acima do anteriormente previsto pela instituição, apesar de esta economia lusófona africana permanecer "relativamente resiliente" nos últimos meses.


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