A apresentar mensagens correspondentes à consulta ACORDO DE PESCA ordenadas por data. Ordenar por relevância Mostrar todas as mensagens
A apresentar mensagens correspondentes à consulta ACORDO DE PESCA ordenadas por data. Ordenar por relevância Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 5 de setembro de 2024

Trabalho infantil: EUA revelam aumento do trabalho infantil para 160 milhões de crianças

© ShutterStock
Por Lusa  06/09/24 
A exploração do trabalho infantil nas cadeias de abastecimento globais está "perturbadoramente" difundida em todas as regiões do mundo, um fenómeno que afeta cerca de 160 milhões de crianças, revelou quinta-feira o Departamento do Trabalho dos Estados Unidos.

De acordo com o relatório 'Seat & Toil', elaborado pela Administração norte-americana, o trabalho infantil na extração de ouro encontra-se no maior número de países (26), seguido do fabrico de tijolos (18), do trabalho nos campos de cana (18), das plantações de café (17) e do tabaco (17).

Quanto ao trabalho infantil forçado, este afeta quase 28 milhões de crianças, com as fábricas têxteis em primeiro lugar, em 10 países.

Seguem-se o setor da construção (9 países), os campos de algodão (7) e a pesca (6), alertam os relatórios "2024: Lista de bens produzidos por trabalho infantil ou trabalho forçado" e "2023: Conclusões sobre as piores formas de trabalho infantil".

A última lista de bens produzidos através de trabalho infantil ou forçado inclui 204 bens provenientes de 82 países, que os Estados Unidos acreditam serem produzidos através de trabalho infantil ou forçado, em violação das normas internacionais.

Esta edição inclui 72 adições, incluindo um registo de 37 mercadorias que não estavam anteriormente incluídas, como o enxofre, o chumbo, o níquel, o cloreto de polivinilo e as lulas; e retira da lista os mirtilos argentinos, o sal cambojano, o camarão tailandês e o espatoflúor da Mongólia.

"Estes relatórios fornecem uma orientação importante, à medida que trabalhamos para reduzir estrategicamente as práticas flagrantes de trabalho infantil e de trabalho forçado a nível mundial", afirmou a secretária do Trabalho norte-americana, Julie Su.

A governante reconheceu que os Estados Unidos "não estão imunes" a esses abusos, pelo contrário, regista-se um aumento significativo no número de crianças empregadas ilegalmente no país.

O relatório inclui também vários estudos que permitem identificar bens produzidos total ou parcialmente por trabalho forçado ou infantil através de cadeias de abastecimento globais complexas, como produtos têxteis de algodão da China e do Vietname fabricados com algodão chinês, ou produtos de açúcar ligados ao trabalho forçado na indústria da cana-de-açúcar na República Dominicana, entre outros.

A Ásia é a região do mundo com a maior concentração de trabalho infantil, segundo o relatório "Seat & Toil".

Quanto às piores formas de trabalho infantil, que afetam 131 países, o relatório inclui o tráfico, a servidão por dívidas, o trabalho forçado, o trabalho perigoso, a exploração sexual comercial e a utilização de crianças em conflitos armados ou atividades ilícitas.

O estudo fornece cerca de 1.900 recomendações específicas para combater estes flagelos.

As principais áreas de preocupação abrangem numerosas indústrias, incluindo bens de consumo, eletrónica, vestuário, têxteis e indústria transformadora, bem como os setores mineiro e metalúrgico.

quinta-feira, 8 de agosto de 2024

Ex-ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang condenado nos EUA

© Lusa
Por Lusa  08/08/24 
O ex-ministro das Finanças de Moçambique Manuel Chang foi hoje condenado nos Estados Unidos, no âmbito do caso das dívidas ocultas.

O veredito foi dado por um júri federal em Nova Iorque, avançou a agência de notícias Associated Press (AP). Chang foi acusado de aceitar subornos e de conspiração para desviar fundos dos esforços de Moçambique para proteger e expandir as suas indústrias de gás natural e pesca, num plano para enriquecer e enganar investidores.

Chang, que foi o principal responsável financeiro de 2005 a 2015, declarou-se inocente das acusações. Os seus advogados disseram que o ex-ministro estava a fazer o que o seu Governo desejava quando assinou as promessas de que Moçambique pagaria os empréstimos e que não há provas de uma contrapartida financeira para o então governante.

Entre 2013 e 2016, três empresas controladas pelo Governo moçambicano contraíram discretamente empréstimos milionários junto de grandes bancos estrangeiros.

Chang assinou garantias de que o Governo reembolsaria os empréstimos, cruciais para os credores.

As receitas deveriam financiar uma frota de atum, um estaleiro naval, navios da Guarda Costeira e sistemas de radar para proteger os campos de gás natural ao largo da costa do Oceano Índico.

Mas banqueiros e funcionários do Governo desviaram o dinheiro do empréstimo, disseram os procuradores norte-americanos.

"As provas neste caso mostram-vos que existe aqui um esquema internacional de fraude, branqueamento de capitais e suborno de proporções épicas" e que Chang "escolheu participar", disse aos jurados a procuradora adjunta norte-americana, Genny Ngai, nas alegações finais.

Os procuradores acusaram Chang de recolher sete milhões de dólares em subornos, transferidos através de bancos norte-americanos para contas europeias de um associado.

A defesa de Chang disse que não havia provas de que lhe tivesse sido prometido ou recebido um cêntimo.

O único acordo que Chang fez "foi o acordo legal de pedir dinheiro emprestado aos bancos para permitir que o seu país se envolvesse nestas obras de infraestruturas públicas", disse o advogado de defesa Adam Ford.

Descobertas em 2016, as dívidas foram estimadas em cerca de 2,7 mil milhões de dólares (cerca de 2,55 mil milhões de euros), de acordo com valores apresentados pelo Ministério Público moçambicano.

Moçambique era, então, uma das dez economias de crescimento mais rápido do mundo durante duas décadas, segundo o Banco Mundial, mas acabou por mergulhar numa convulsão financeira.

O Governo moçambicano chegou a acordos extrajudiciais com os credores, numa tentativa de pagar parte da dívida.

O escândalo das dívidas ocultas remonta a 2013 e 2014, quando o então ministro das Finanças aprovou, à revelia do parlamento, garantias estatais sobre os empréstimos da Proinducus, Ematum e MAM aos bancos Credit Suisse e VTB.

Chang foi detido no principal aeroporto internacional de Joanesburgo no final de 2018, pouco antes de se tornar pública a acusação dos Estados Unidos.

Leia Também: Presidente de Moçambique exonera ministro das Finanças 


terça-feira, 16 de julho de 2024

Paul Kagame vence as eleições presidenciais de Ruanda com vitória esmagadora

VOA Português  julho 16, 2024 
O presidentee está no poder no Ruanda desde o fim do genocídio em 1994, tendo assumido em várias funções.

Kigali. Ruanda — O presidente ruandês, Paul Kagame, venceu as eleições presidenciais do país com 99% dos votos, de acordo com os resultados preliminares das eleições – 79% dos votos expressos – divulgados na noite de segunda-feira pelo órgão eleitoral do país.

Kagame, que está no poder ocupando vários cargos desde 1994, venceu por margem semelhante em 2017.

Os eleitores fizeram fila pacientemente a partir das 7h, horário local, de segunda-feira, para votar, dizendo que estavam entusiasmadas para exercer seu dever cívico.

Alguns disseram à VOA que queriam um líder que possa realizar o que a população deseja. Outros disseram que viram progresso e votavam para que isso continue.

Kagame disse que as suas prioridades de construir e fazer crescer o país rumo à prosperidade não mudariam.

Kagame, que foi eleito presidente pela primeira vez em 2000, enfrentou dois outros candidatos, incluindo o candidato do Partido Verde Democrático, Frank Habineza, e o candidato independente, Philippe Mpayimana. Habineza terminou em segundo lugar com 0,53% dos votos, enquanto Mpayimana obteve 0,32%.

Esta foi a segunda candidatura ao cargo máximo de Mpayimana, um jornalista que se tornou político, cujas iniciativas de manifesto para desenvolver a agricultura, os transportes, a pesca e outras indústrias receberam cobertura em mais de 50 artigos.

Habineza, que também concorreu contra Kagame nas últimas eleições, disse à VOA que voltou a concorrer este ano porque o titular está no cargo há muito tempo e é altura de ter uma nova visão para o país.

Vários outros candidatos, incluindo alguns dos críticos mais veementes de Kagame, foram impedidos de concorrer à presidência.

Cerca de 9 milhões de uma população de 14 milhões de ruandeses estavam registados para votar – isto é, 2 milhões a mais do que da última vez, de acordo com a Comissão Eleitoral Nacional.

A presidente da CNE, Oda Gasinzigwa, disse que mais de 300 observadores internacionais estão presentes em Ruanda, juntamente com cerca de 700 observadores locais.

Uma das razões pelas quais Kagame, de 66 anos, alcançou a vitória, dizem os críticos, é que ele governou com mão pesada e sufocou a dissidência.

Mas outra razão, dizem os analistas, é a sua capacidade de guiar o país da África Oriental rumo à paz interna desde o genocídio de 1994, quando cerca de 800 mil tutsis e hutus moderados foram mortos por extremistas hutus.

quinta-feira, 4 de julho de 2024

Guiné-Bissau. Embaló efetua visita de Estado à China de 10 a 12 de julho

© Getty Images
Por Lusa  04/07/24
O Presidente guineense realiza de 10 a 12 deste mês a sua primeira visita oficial à China, onde vai rubricar um acordo quadro geral de cooperação entre Bissau e Pequim, disseram à Lusa fontes governamentais guineenses.


Fonte do Governo indicou à Lusa que Umaro Sissoco Embaló deverá viajar para Pequim na terça-feira, iniciando a visita no dia seguinte para analisar "todos os aspetos" da cooperação entre os dois países.

A mesma fonte assinalou que a China coopera com a Guiné-Bissau nos domínios da Educação, Saúde, Agricultura, Infraestruturas, Pescas e apoios ao setor da Defesa.

No domínio da Educação, a China fornece anualmente bolsas de estudo ao Governo guineense e ainda disponibiliza, através da embaixada em Bissau, oportunidade de formação "aos melhores alunos" do país em universidades chinesas.

No âmbito da Saúde, a China disponibiliza médicos para o hospital de Canchungo, no norte da Guiné-Bissau, e ainda para o Hospital Militar Principal na capital guineense.

Nas pescas, segundo o Governo guineense, até 2020 existiam cerca de 70 navios de empresas privadas de armadores chineses a operar nas águas da Guiné-Bissau.

A China tem ajudado a Guiné-Bissau na construção de infraestruturas, nomeadamente edifícios públicos. Os palácios do Governo, da Assembleia Nacional Popular (ANP, Parlamento) e da Justiça foram construídos pela cooperação chinesa.

O próprio palácio da Presidência do país, destruído durante o conflito político-militar de 1998/99, foi reconstruído pela China.

A única autoestrada da Guiné-Bissau, num troço de 8,2 quilómetros, que liga o aeroporto internacional Osvaldo Vieira à localidade de Safim, está a ser construída pela China, num valor de 13,6 milhões de euros.

O principal porto de pesca artesanal do país, situado em Bandim, nos arredores de Bissau, foi construído pelos chineses com 26 milhões de dólares (24 milhões de euros).

Em 2019, a China doou ao Governo da Guiné-Bissau 44 tratores e motocultivadores agrícolas, 50 mil sacos de arroz e mais de 20 mil sacos de fertilizantes, num valor global de 53,3 mil euros.

"Como se pode ver, a China é uma das principais parceiras da Guiné-Bissau em quase todos os domínios", observou um diplomata guineense que vê na visita de Umaro Sissoco Embaló "uma oportunidade única".

A visita de Estado de Sissoco Embaló será a segunda de um Presidente guineense à China, após a do falecido ex-Presidente João Bernardo 'Nino' Vieira, em junho de 2006.

Entre outros membros do Governo de iniciativa presidencial, Embaló será acompanhado à China pelo ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação Internacional, Carlos Pinto Pereira, que segue hoje para Pequim, para preparar a chegada do chefe de Estado guineense.

Fonte militar precisou à Lusa que o Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, general Biague Na Ntan, também fará parte da delegação presidencial.

terça-feira, 2 de julho de 2024

Agricultura: A Índia, que se tornou o país mais populoso do mundo, deverá também substituir a China como principal motor do crescimento da procura agrícola mundial nos próximos 10 anos, segundo a OCDE e a FAO.

© Getty Images
Por Lusa  02/07/24 
 Índia deverá ultrapassar China no crescimento da procura agrícola mundial
A Índia, que se tornou o país mais populoso do mundo, deverá também substituir a China como principal motor do crescimento da procura agrícola mundial nos próximos 10 anos, segundo a OCDE e a FAO.

A Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE) e a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) disseram hoje que o consumo mundial de produtos agrícolas deverá aumentar 1,1% na próxima década.

Os países de rendimento médio e baixo serão responsáveis por quase 94% do aumento previsto, segundo o relatório anual conjunto da OCDE e da FAO citado pela agência espanhola EFE.

As razões prendem-se com o facto de ser nestes países que, com diferenças, se prevê um crescimento demográfico, mas também com uma alteração dos padrões alimentares.

Estes fatores justificam o facto de a Índia e o Sudeste Asiático serem os principais intervenientes e absorverem 31% do aumento da procura na próxima década.

Isoladamente, o aumento da procura na Índia até 2033 será de 20,2% na produção vegetal, para 220,1 mil milhões de dólares (186,8 mil milhões de euros, ao câmbio atual).

O aumento da procura na produção animal será de 41%, para 144,7 mil milhões de dólares (137,8 mil milhões de euros), e de 16% na produção pesqueira, para 48,8 mil milhões de dólares (45,5 mil milhões de euros).

A China continuará a ser, de longe, o maior mercado agrícola, mas com aumentos muito menores em termos relativos e absolutos.

Os peritos preveem que a procura de produtos vegetais na China aumente 4,1%, para 414,4 mil milhões de dólares (386,8 mil milhões de euros).

A procura de produtos animais crescerá 5,55%, para 206,5 mil milhões de dólares (192,7 mil milhões de euros), e a de produtos da pesca 13,8%, para 207,1 mil milhões de dólares (193,3 mil milhões de euros).

Embora a China tenha sido responsável por 28% do consumo adicional de produtos do setor primário na última década, esta percentagem cairá para 12% até 2033, de acordo com os autores do relatório.

A Índia tem 1,42 mil milhões de habitantes e a China 1,41 mil milhões, segundo dados do Banco Mundial.

A outra grande região que registará uma expansão significativa da procura é a África Subsariana, que contribuirá com 18% do aumento previsto, principalmente devido ao crescimento da população, a uma taxa de 2,40% por ano entre 2024 e 2033.

Globalmente, a produção no setor primário crescerá 1,1% por ano durante os próximos 10 anos, com aumentos de 1% para o valor das culturas, 1,3% para a pecuária e 1,1% para a pesca.

Os autores do estudo preveem que o aumento da produção resultará essencialmente de melhorias nos rendimentos, que representarão 80% no caso da agricultura, em que a extensão das terras cultivadas desempenhará um papel marginal.

Quanto ao comércio dos produtos do setor, prevê-se um aumento de 1% por ano, equivalente ao aumento da produção, o que significa que o peso relativo das exportações se manterá estável.

Em relação aos preços, a OCDE e a FAO consideram que continuarão a descer face aos picos atingidos no período 2020-2022, devido a questões como a crise da covid, a invasão russa da Ucrânia ou más colheitas por razões climáticas.

A curto prazo, prevê-se que a descida seja mais rápida e, a médio prazo, os preços reais (descontando o efeito da inflação) dos produtos do setor primário deverão também continuar a tendência histórica para a baixa.

Esta situação deverá aumentar a pressão sobre a situação económica dos agricultores e beneficiar os consumidores.

Os autores do relatório disseram que se trata de uma evolução dos mercados globais e de ser necessário avaliar outros fatores que influenciam as decisões para ver se se transmitem aos mercados nacionais.

Entre esses fatores estão os custos específicos de transporte em cada lugar, as taxas de câmbio das diferentes moedas, as políticas comerciais e o grau de integração dos mercados locais com o comércio internacional.

 

Leia Também: Pelo menos 60 mortos em debandada num evento religioso na Índia... Autoridades dizem que o número de vítimas pode aumentar.  


segunda-feira, 24 de junho de 2024

China tem plano para conquistar Taiwan sem precisar de invadir. Mas há dois riscos: guerra com EUA e crise mundial

Taiwan (fonte Getty)
Cnnportugal.iol.pt, 24/06/2024

A ideia passa por criar uma zona cinzenta, uma espécie de área de "quarentena" em torno da ilha e fazê-la capitular pela escassez de recursos e economicamente. Ainda se lembra dos impactos da crise dos semicondutores - peças presentes em todos os aparelhos eletrónicos? Taiwan é um dos principais exportadores destes componentes à escala global

As forças armadas chinesas podem estar a preparar-se para isolar Taiwan, paralisar a sua economia e fazer com que a ilha democrática sucumba à vontade do Partido Comunista de Pequim, no poder, tudo isto sem nunca disparar um tiro, o alerta vem de um importante grupo de reflexão norte-americano.

Os receios de que o Partido Comunista possa cumprir a sua promessa de um dia assumir o controlo de Taiwan, pela força se necessário, têm sido intensificados nos últimos anos pelas ações cada vez mais bélicas do líder chinês Xi Jinping em relação à ilha auto-governada.

Sendo que a recusa da China em condenar a invasão da Ucrânia pela Rússia só veio aumentar esses receios.

Num tal cenário, os analistas e estrategas militares há muito que se concentram nas duas principais opções disponíveis para a China - uma invasão em grande escala ou um bloqueio militar.

Mas um grupo de reflexão de Washington, o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS), alerta para a existência de uma terceira via, que tornará muito mais difícil aos Estados Unidos e a outras democracias com ideias semelhantes contrariar: esta quarentena.

Recorrendo a táticas de "zona cinzenta" - ações que se situam um pouco abaixo do que podem ser consideradas atos de guerra - a Guarda Costeira da China, a sua chamada milícia marítima e várias agências policiais e de segurança marítima poderiam iniciar uma quarentena total ou parcial de Taiwan, possivelmente cortando o acesso aos seus portos e impedindo que fornecimentos vitais, como a energia, cheguem aos 23 milhões de habitantes da ilha, segundo um relatório recentemente publicado pelo CSIS (Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais).

Um navio de guerra chinês navega nas águas perto da ilhota de Pengjia, no norte de Taiwan, nesta imagem de divulgação divulgada a 23 de maio de 2024. (Guarda Costeira de Taiwan/Handout/Reuters)
Os ramos naval, aéreo e terrestre do Exército Popular de Libertação (PLA, sigla em inglês), a maior força militar do mundo, poderão desempenhar apenas papéis auxiliares e de apoio, escrevem os autores Bonny Lin, Brian Hart, Matthew Funaiole, Samantha Lu e Truly Tinsley.

"A China tem aumentado significativamente a pressão sobre Taiwan nos últimos anos, alimentando o receio de que as tensões possam explodir num conflito total. Tem sido dada muita atenção à ameaça de uma invasão, mas Pequim tem outras opções para além da invasão, como coagir, punir ou anexar Taiwan", refere o relatório.

Gráfico: Henrik Pettersson, CNN
Na cimeira de Defesa do Diálogo de Shangri-La, realizada em Singapura no início deste mês, o Ministro da Defesa chinês, Almirante Dong Jun, avisou que aqueles que apoiam quaisquer movimentos a favor da independência de Taiwan "acabarão por se autodestruir".

"Tomaremos medidas resolutas para travar a independência de Taiwan e garantir que tal plano nunca seja bem sucedido", disse Dong, falando através de um tradutor, enquanto criticava as "forças externas interferentes" por venderem armas e terem "contatos oficiais ilegais" com Taiwan.

A escalada das táticas chinesas na zona cinzenta foi claramente demonstrada nos últimos dias, quando navios da Guarda Costeira da China entraram em confronto com barcos da Marinha das Filipinas no Mar do Sul da China.

Vídeos mostraram as tropas de Pequim a ameaçar os filipinos com um machado e outras armas brancas, e Manila afirmou que um dos seus soldados perdeu um polegar numa colisão provocada pela China.

O nível de violência foi muito superior aos anteriores confrontos perto de Second Thomas Shoal, onde as Filipinas mantêm um posto avançado num navio de guerra encalhado em águas reivindicadas por Pequim e Manila.

Da mesma forma, a intimidação militar e económica de Pequim sobre Taiwan, uma economia de mercado livre altamente desenvolvida, tornou-se muito mais pronunciada durante o governo de Xi.

O Partido Comunista da China, no poder, reivindica a ilha como sua, apesar de nunca a ter controlado, e prometeu "reunificá-la", pela força, se necessário.

Mas o relatório do CSIS diz que Pequim tem opções fortes que poderiam não só manter o PLA fora da luta, mas também colocar a democracia da ilha ou os seus apoiantes, como os Estados Unidos, no papel de iniciadores de um conflito militar para preservar a autonomia de Taiwan.

O relatório refere que a Guarda Costeira da China - tal como a maioria das guardas costeiras em todo o mundo - é considerada uma agência de aplicação da lei. Isto significa que pode parar e regular a navegação à volta da ilha no que se designa por quarentena, o que difere em larga escala de um bloqueio.

"Uma quarentena (é) uma operação de aplicação da lei para controlar o tráfego marítimo ou aéreo dentro de uma área específica, enquanto um bloqueio é sobretudo de natureza militar", diz o relatório.

O direito internacional considera o bloqueio um ato de guerra, segundo os especialistas.

"Uma quarentena conduzida pela guarda costeira da China não é uma declaração de guerra contra Taiwan", diz o relatório, e colocaria os EUA numa posição difícil, advertem os seus autores.

Washington é legalmente obrigado - ao abrigo da Lei das Relações com Taiwan - a fornecer à ilha os meios para se defender e fornece-lhe armamento defensivo.

O Presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, foi mais longe do que a obrigação legal, afirmando repetidamente que utilizaria tropas americanas para proteger Taiwan, um aviso que parece desviar-se da anterior posição de Washington de "ambiguidade estratégica" e que os responsáveis da Casa Branca voltaram atrás.

Mas se os navios ou aviões militares americanos interviessem no que a China diz ser uma operação de aplicação da lei, os EUA poderiam ser vistos como iniciando hostilidades militares.

Segundo o relatório, a Guarda Costeira da China conta com 150 navios oceânicos e 400 navios mais pequenos, tal como a Marinha do PLA, a maior força do mundo em termos de dimensão da frota. Pequim tem centenas de outros navios na sua Agência de Segurança Marítima e na milícia marítima, barcos de pesca integrados nos serviços militares e policiais da China.

A guarda costeira de Taiwan, com apenas dez navios de alto mar e cerca de 160 navios mais pequenos, não tem capacidade para fazer recuar uma ação de quarentena, diz o relatório.

Os autores do CSIS observam que as ações de quarentena tomadas por Pequim podem ser extremamente limitadas e, ainda assim, ter o efeito de estrangular economicamente Taiwan. Poucos operadores quereriam enfrentar a possibilidade de verem os seus bens apreendidos pelas autoridades chinesas e poderiam voluntariamente deixar de prestar serviços à ilha.

"A demonstração da vontade chinesa de efetuar buscas e apreender apenas um punhado de navios comerciais poderia ter um impacto dissuador desproporcionado e desencorajar transgressões semelhantes", afirma o relatório.

As ações limitadas de busca e/ou apreensão têm um efeito nos voos para Taiwan, uma vez que a quarentena pode ser facilmente alargada ao ar, afirma o relatório.

De acordo com o documento, bastaria que um pequeno número de voos fosse avisado por aviões chineses para que o tráfego aéreo fosse sufocado.

A China faz regularmente voos com aviões militares à volta da ilha, por vezes dezenas num dia. Nas 24 horas que terminaram às 6:00 de dia 21 de junho, 36 aviões militares chineses atravessaram a zona de identificação da defesa aérea de Taiwan, segundo o Ministério da Defesa de Taiwan.

Entretanto, uma quarentena, em vez de um bloqueio, não exigiria que a China fechasse ou restringisse o acesso ao Estreito de Taiwan, refere o relatório do CSIS. Isto significa que Washington e os seus aliados poderiam perder uma das suas maiores reivindicações para intervir ao abrigo do direito internacional, preservando a liberdade de navegação numa via navegável internacional.

"Se a quarentena for apresentada como uma operação de aplicação da lei, a China pode facilmente anunciar o fim da operação e alegar que os seus objetivos foram atingidos", diz o relatório.

Guindastes de pórtico no porto de Taichung, em Taichung, Taiwan, na quinta-feira, 23 de maio de 2024. (An Rong Xu/Bloomberg/Getty Images)

Para manter as coisas ainda mais discretas, a China pode nem sequer precisar de usar a palavra "quarentena" para iniciar uma operação de isolamento de Taiwan, dizem os autores.

Ao afirmar que Taiwan é território chinês, Pequim poderia exigir a apresentação de declarações aduaneiras antes de os navios poderem fazer escala em Taiwan. Para os que não cumprirem, estes mecanismos de aplicação da lei poderão ter um efeito inibidor em toda a navegação.

"Os navios chineses responsáveis pela aplicação da lei serão autorizados a abordar os navios, a efetuar inspeções no local, a interrogar o pessoal e a tomar outras medidas contra os navios não conformes", refere o relatório.

Esta ideia permite que a China tenha um âmbito de atuação limitado. Por exemplo, poderia visar apenas o porto mais movimentado da ilha, Kaohsiung, responsável por 57% das importações marítimas de Taiwan e pela maior parte das suas importações de energia, de acordo com o estudo.

Plausível, mas ainda assim repleto de riscos para a China

Os analistas externos que analisaram o relatório do CSIS e falaram com a CNN consideraram-no plausível. Mas, também têm dúvidas importantes sobre o desenrolar da situação.

Alguns referiram que os aspetos económicos não jogam necessariamente a favor de Pequim.

"A manutenção da quarentena será dispendiosa e demorada", disse Carl Schuster, antigo diretor de operações do Centro Conjunto de Informações do Comando do Pacífico dos EUA.

"Taipé não vai desistir em menos de 60 dias", afirma Schuster. "Poderá Pequim suportar o esforço e a possível reação internacional durante tanto tempo?"

Os esforços para perturbar o status quo no Estreito de Taiwan podem prejudicar ainda mais o comércio externo de Pequim, alertam os especialistas.

Alessio Patalano, professor de guerra e estratégia no King's College, em Londres, salienta ainda os desafios que o Partido Comunista Chinês já enfrenta, com uma economia que ainda luta para recuperar do isolamento provocado pela Covid-19, que fez cair as taxas de crescimento, e novas restrições comerciais, como os direitos aduaneiros sobre as exportações de veículos elétricos.

Taiwan é uma economia industrializada proeminente, um nó crucial nas cadeias de abastecimento globais e um fabricante da grande maioria dos semicondutores mais avançados do mundo. Uma quarentena na ilha teria repercussões económicas não só a nível interno, mas também a nível mundial.

Embora a maior parte das nações reconheça diplomaticamente que Pequim detém o poder sobre Taiwan, a ilha tem vindo a estabelecer relações não oficiais cada vez mais fortes com as principais democracias ocidentais, tendo aprofundado esses laços nos últimos anos, à medida que as ameaças de Pequim se foram agravando.

Taiwan e a China estão também profundamente interligadas do ponto de vista económico. No ano passado, 35% das exportações da ilha destinaram-se à China continental, na sua maioria circuitos integrados, células solares e componentes eletrónicos, de acordo com o Ministério dos Assuntos Económicos de Taiwan.

As importações da China continental representaram 20% do total das importações da ilha no mesmo ano. Entre 1991 e 2022, as empresas taiwanesas investiram um total de 203 mil milhões de dólares no continente, de acordo com as estatísticas do governo de Taiwan, criando milhões de postos de trabalho na China.

Além disso, as quarentenas podem levar as populações a unir-se ao governo, em vez de se revoltarem contra ele, diz Sidharth Kaushal, investigador sénior do Royal United Services Institute em Londres.

"As provas históricas mostram que mesmo os bloqueios severos têm um valor coercivo limitado, e uma quarentena limitada pode resultar num efeito de união em torno da bandeira", afirma.

Uma quarentena poderia também levar o governo de Taiwan a declarar a independência, algo que Pequim tem repetidamente afirmado que provavelmente provocaria um conflito armado, alerta Kaushal.

"Isto deixaria o Partido Comunista com a opção de uma escalada ou de um grande revés", afirma.

Patalano diz que, para a China, a paciência é a chave para realizar o seu objetivo de "reunificação".

A escalada, e certamente a invasão, não é "eficiente em termos de custos", diz ele. A guerra custa não só vidas mas também riqueza nacional.

quarta-feira, 5 de junho de 2024

Cólera: Mais de 270 casos de cólera e um morto em duas semanas em Moçambique

© Lusa
Por Lusa  05/06/24 
As autoridades sanitárias moçambicanas registaram mais de 270 novos casos de cólera nas últimas duas semanas, que provocaram mais um morto, indicam dados oficiais a que a Lusa teve hoje acesso.

De acordo com o mais recente relatório sobre a progressão da doença, elaborado pelo Ministério da Saúde e com dados de 01 de outubro de 2023, início do atual surto, até 03 de junho, regista-se um acumulado de 16.285 infetados e 37 mortos, com uma taxa de letalidade que se mantém em 0,2%.

No relatório anterior, com dados até 16 de maio, estavam contabilizados 16.012 casos e 36 mortos.

Do total acumulativo atual, 5.610 casos foram reportados pela província de Nampula, com 15 mortos, foco da doença nas últimas semanas, seguindo-se 2.873 em Tete, com 10 mortos, e 2.431 em Cabo Delgado, com um morto.

Atualmente há surtos ativos da doença em distritos de Nampula, Cabo Delgado, Sofala e em Maputo e à data de 03 de junho estavam internados em unidades sanitárias do país 17 doentes com cólera, praticamente metade face ao relatório anterior.

Por outro lado, pelo menos 121 pessoas morreram devido a ondas de desinformação sobre o surto de cólera em Moçambique, de acordo com os dados oficiais tornados públicos desde outubro.

A maior parte das vítimas, 98 pessoas, morreram numa só circunstância, quando, em 07 de abril, um barco que saía do posto administrativo de Lungo, no distrito de Mossuril, província de Nampula, com destino a Ilha de Moçambique, naufragou, matando 55 crianças, 34 mulheres e nove homens.

De acordo com as autoridades marítimas moçambicanas, a embarcação de pesca, na qual seguiam 130 pessoas, não estava autorizada a transportar passageiros e as pessoas fugiam de um alegado um surto de cólera, com destino à Ilha de Moçambique, tendo o naufrágio acontecido a cerca de 100 metros da costa.

O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, visitou o posto administrativo de Lunga para confortar as famílias, tendo reconhecido que o naufrágio resulta "da desinformação protagonizada por pessoas com interesses obscuros".

"Não permitam boatos", declarou Nyusi, durante a interação com as famílias das vítimas.

Os registos apontam para a existência de mais 23 pessoas que desde outubro de 2023 morreram em resultado de ondas de desinformação em temas ligados à cólera, avançou o comandante-geral da polícia moçambicana, Bernardino Rafael, no dia 17 de janeiro.

Os líderes comunitários e técnicos de saúde, na sua maioria, têm sido mortos ou feridos por populares sob alegações de estarem a levar a doença às comunidades.

Leia Também: ONU com "preocupação" com casos de cólera devido às inundações no Quénia 


domingo, 7 de abril de 2024

Arquipélago dos Bijagos: UNO – UMA ILHA “FANTASMA” COM A POPULAÇÃO ABANDONADA SEM ESCOLA NEM TRANSPORTE

Fonte: O DEMOCRATA  07/04/2024 

[REPORTAGEM] A ilha de Uno é uma das ilhas que faz parte da região de Bolama Bijagós e que, à semelhança das outras ilhas do arquipélago, torna-se a cada dia uma “ilha fantasma” com a sua população abandonada pelo governo e deixada a sua sorte para sobreviver. A ilha enfrenta enormes dificuldades de circulação, de acesso aos produtos da primeira necessidade e com fraco nível de cobertura de serviços das telecomunicações. 

As infraestruturas administrativas estatais encontram-se completamente em ruínas. A ilha dispõe de um posto da Polícia da Ordem Pública sem condições, o porto em pedaços e sem iluminação. Conta igualmente com uma estrutura sanitária do tipo C, que cobre toda área sanitária da ilha, mas não tem sequer um único médico. 

CRIANÇAS CAMINHAM DIARIAMENTE CERCA DE 30 QUILÓMETROS PARA TER ACESSO A ESCOLA

A agricultura, a pesca artesanal, a exploração florestal e de moluscos são uma das atividades praticadas pela população local, mas a exploração de moluscos é exercida praticamente por mulheres, que agora são contratadas por outras aldeias para explorar estes produtos e vendê-los diretamente a eles (senegaleses, gambianos) principalmente, gandhi.

Uma equipa de reportagem do jornal O Democrata visitou as diferentes comunidades, com destaque para Bruce, situada a 18 quilómetros da zona central da ilha, onde se encontra o liceu e o centro de saúde. O jornal descobriu que os alunos são obrigados a percorrerem diariamente o dobro dessa distância para terem o acesso à escola. As mulheres, para terem acesso à área sanitária local têm que fazer o mesmo, caso contrário não podem ter o acesso aos cuidados médicos. Em caso de emergência, recorrem às pirogas dos pescadores para evacuação para Bubaque, o que torna os pacientes expostos às contaminações.

Apurou o semanário que existe apenas uma piroga (pertença de uma das comunidades religiosas cristãs), que tem ajudado a população de Uno. A piroga faz ligação Uno-Bissau uma vez por semana, e vice-versa. Sai de Uno na sexta e volta na segunda-feira e cada passageiro paga quatro mil (4000) francos CFA. A ligação Uno-Bubaque varia de 2000 a 2500 francos.

Em entrevista ao jornal O Democrata, o comité da aldeia de Bruce, Carlitos Gomes Quelefa, revelou que a tabanca está a deparar-se com muitas dificuldades, nomeadamente na componente de saúde e a distância de 18 quilómetros que percorrem diariamente para terem o acesso   ao liceu e ao único centro de saúde localizados na aldeia de AN-Onho é outro dos sacrifícios que têm de enfrentar. Acrescentou que a tabanca não tem nenhuma estrutura sanitária e que os medicamentos são comprados apenas no posto central.

“É preocupante a situação em que nos encontramos. Se tiver uma grávida em trabalho de parto, ou a precisar de uma assistência urgente de uma parteira, somos obrigados a recorrer a motas. Imagina se tiver uma grávida ou um doente em estado grave, só Deus. Não temos na comunidade sequer uma única piroga para as emergências. Às vezes, recorremos às pequenas embarcações dos pescadores, as canoas da pesca artesanal para transportar doentes. As nossas crianças fazem quilómetros e quilómetros para terem acesso à escola. Não temos aqui nenhuma escola e o Estado deveria ter-se preocupado com essa situação. É um direito que nos assiste”, criticou.

Afirmou que a aldeia não tem eletricidade, não tem energia solar para iluminação, nem a presença de forças de segurança ou elementos da Ordem Pública, nem água potável, como também as bolanhas enfrentam a filtração da água salgada, tornando mais difícil a sobrevivência através da produção agrícola.

“Queremos pedir ao Estado que nos ajude com um centro de saúde e que construa furos de água potável. São centro das nossas maiores dificuldades. A sobrevivência aqui é arriscada. A água que bebemos não é boa para a saúde humana e tem criado problemas e dores de barriga, tanto às crianças quanto aos adultos. É urgente resolver essa situação o mais rápido possível”, defendeu.

O comité mostrou-se preocupado com a fuga de jovens para Bubaque e Bissau à procura de conhecimento científico e de melhores condições de vida, porque “estes reúnem condições e têm infraestruturas escolares para continuarem os seus estudos”.

Disse que essa situação cria muitos problemas aos pais, porque fazem um esforço redobrado para poder assegurá-los longe de casa.

Questionado sobre as atividades de fiscalização da pesca atendendo que as ilhas que compõem o setor de Uno fazem parte da Reserva da Biosfera de Bolama Bijagós, o Parque Nacional de Orango (PNO), Carlitos Quelefa afirmou que praticam atividade de pesca sem problemas, porque “conhecem as regras do parque, embora sejam violadas. Por isso quando há fiscalização naquela zona, os pescadores escondem-se das autoridades ou dessas entidades”.

MULHERES DE UNO REFUGIAM-SE À EXPLORAÇÃO DOS MOLUSCOS PARA GARANTIR O SUSTENTO DOS FILHOS

Interpelado pela repórter de O Democrata, a antiga matrona da comunidade de Ossocom, Segunda Paulo Odunte, revelou que as mulheres dessa zona refugiam-se à exploração dos moluscos (lingron, Ostras, Gandi e Combé), bem como à tecelagem de palhas como forma de continuar a garantir o sustento da família e pagar a escola dos filhos, além da atividade agrícola.

O semanário apurou que um quilograma de Combé custa 1.250 franco CFA na época da seca, e na época das chuvas o preço varia de 1500 a 1600 francos CFA por quilograma, o que faz muitas mulheres optarem mais para essa atividade do que a agricultura, que está ameaçada devido a fatores de alteração climática, o acesso atempado às sementes e o transporte para evacuar os produtos da agricultura para a cidade ou outros centros comerciais do país.

Segunda Paulo Odunte explicou que no passado, fazia o papel de parteira tradicional, assistindo as mulheres grávidas, dava conselhos às gravidas durante a gestação e no parto. Revelou que na aldeia havia um posto construído pela própria comunidade onde trabalhava (ela) e mais duas mulheres e um agente de Saúde Comunitária, mas todo o serviço era gratuito. Apenas recebiam de uma organização incentivos de arroz, também formação para assistir a comunidade.

“Estávamos praticamente todo o tempo no pequeno posto, porque era no centro da aldeia. Trabalhávamos com velas, gostávamos do que fazíamos porque éramos reconhecidas pela própria comunidade, mesmo sem dinheiro. Já não fazemos este trabalho, porque não temos formação específica para tal e toda a atividade que fazíamos agora é feita apenas no centro. A distância para o posto é muita coisa e muitas grávidas fazem-na em condições difíceis, algumas acabam dando à luz pelo caminho”, disse.

Alertou para a existência de fome, afirmando que a comunidade está a enfrentar uma crise de fome, por falta de bolanhas em condições que permitam a cada família ter o que comer por alguns meses. Outro fator apontado tem a ver com a falta de transporte que ligue Bissau à ilha de Uno.

“Na ilha de Uno, mesmo tendo dinheiro é difícil conseguir comprar algo para comer, devido à falta de transporte e o comércio nesta localidade é quase nulo. As bolanhas são a nossa única confiança, mas nos últimos tempos estão todas abraços com água salgada e   a agricultura não está a ser uma opção, devido a vários fatores, nomeadamente a falta de chuva, de sementes e os animais estragam frequentemente as culturas da população”, indicou.

Segunda Paulo Odunte lamentou a falta de água, o que obriga as mulheres a descerem às bolanhas para conseguirem água, que também passam por vários processos, horas e horas para ser utilizada.

“A nossa água é muito poluída. Parece argila moída na água e não dá, tanto para a cozinha como para beber. Temos que passá-la por vários processos como filtragem para o consumo. Não temos escola, as crianças são obrigadas a percorrer todos os dias uma distância insuportável para terem acesso à escola para estudar. Vivemos no obscurantismo, na escuridão total porque não há energia”, lamentou, assinalando que as mulheres da comunidade têm, nos últimos tempos, recorrido à tecelagem de palhas e apanha de moluscos (ostras, ligron, combé e gandi), que são defumados e depois vendidos em Bissau e noutras ilhas.

“Nos últimos tempos a procura desses moluscos pelos cidadãos dos países vizinhos, nomeadamente Senegal, Gâmbia e Guiné-Conacri tem aumentado e as mulheres preferem vendê-los a cidadãos destes países diretamente no terreno para reduzir os riscos de perda. Também está em causa o tempo de conservação do produto e o custo de transporte para Bissau”, esclareceu.

“A minha neta está numa ilha. Leva consigo panelas e fica por lá muitos dias à procura de Combé e Gandhi para vender aos estrangeiros. Essa nova forma de trabalhar dá-lhes muito dinheiro do que vender seus produtos em Bissau”, contou sem, no entanto, dizer o valor.

Por sua vez, o comité da aldeia de Ossocom, Victor José da Gama, afirmou que a comunidade sob sua jurisdição está a enfrentar dificuldades em quase todos os domínios, nomeadamente saúde, escola e água potável. Recorrem à água de bolanhas para consumir, porque “reúne condições para o consumo humano”.

O responsável da tabanca de Uno informou que a população daquela aldeia vive através de atividade da pesca e de apanha da ostra e do Combé e todo o rendimento que conseguem é canalizado para comprar alimentos e pagar a escola das crianças.

Apesar do Combé ser rentável para as mulheres, a prática tradicional da etnia bijagó exige a sua conservação, porque “o Combé é usado para o casamento, o fanado e noutras atividades tradicionais locais, razão pela qual é aplicado esse método de conservação para a geração vindoura, bem como evitar a sua extinção.

Uno é uma das ilhas onde mais se explora o combé, porque “as ilhas do setor de Uno são as que mais têm este tipo de molusco”.

“Na nossa tabanca, a escola funciona de pré à primeira classe e quando as crianças transitam da primeira para o segundo ano de escolaridade, fazem dois quilómetros todos os dias para ter acesso à escola na tabanca de Anghané ou num posto mais próximo, um quilómetro e meio. O centro de saúde, também a mesma coisa, um quilómetro e meio dia e noite. As grávidas e doentes em estado grave são coletados e transportados em canapés”, lamentou.

No que diz respeito à questão de segurança e conflitos entre as aldeias, informou que são mediados internamente, porque “a maior parte de conflitos deriva-se dos animais que estragam os cultivos”.

“Nos últimos tempos, na qualidade do responsável da tabanca, aconselhamos os donos de gado e outros animais a construírem lugares adequados para colocar os seus animais”, disse, lembrando que a tabanca tinha um posto de atendimento às grávidas, financiado pela ONG Manitese, onde trabalhavam agentes da saúde base.

“Eu e o meu colega trabalhamos no posto como enfermeiros. Tínhamos três mulheres na equipa que desempenhava o papel de parteiras e faziam um trabalho excelente, porque tinham materiais para tal e em contrapartida recebiam arroz, óleo alimentar, carne enlatada e outros produtos que ajudavam muito na manutenção e no funcionamento do posto. O posto deixou de funcionar e as gravidas fazem quilómetros e quilómetros para dar à luz”, narrou, frisando que as doenças mais frequentes naquela tabanca são o paludismo, as diarreias e a gripe.

ÁREA SANITÁRIA DE UNO SEM MÉDICO FORMADO, NEM MEIOS DE EVACUAÇÃO DE DOENTES

O centro de saúde de Uno funciona em condições precárias, embora em relação a outros centros esteja bem conservado e a funcionar com energia solar. O centro de tipo C conta com três técnicos, dois enfermeiros e uma parteira, mas não tem médico. Esta equipa de técnicos cobre 31 aldeias e é apoiada por 13 Agentes de Saúde Comunitária (ASC). Dispõe de um serviço de maternidade, a consulta externa, farmácia e uma mota carro que faz o papel da ambulância para evacuação de doentes e grávidas, mas neste momento está inoperacional devido a uma avaria.

O responsável da Área Sanitária de Uno, Zito Nunes, disse que o centro enfrenta enormes dificuldades, começando pela fraca capacidade da produção de energia solar e as baterias estão esgotadas, não conseguem aguentar.

“O centro não tem   água potável. Os técnicos e os doentes recorrem a fontanários como alternativa”, afirmou.

O semanário soube que as análises são realizadas no hospital de Bubaque. São retiradas as amostras e depois enviadas para Bubaque, mas a geladeira de conservação tem funcionado e facilitado a conservação dos medicamentos e das amostras.

As doenças mais frequentes no setor são o paludismo e infecções respiratórias agudas. O centro de saúde tinha um moto-carro que fazia transporte dos pacientes das tabancas para o centro, mas estragou-se e neste momento tem motorizadas simples para fazer trabalhos estratégicos  nos postos avançados e a vacinação das crianças, consultas de grávidas e crianças das aldeias mais longínquas, que não têm acesso rápido ao centro de saúde, nomeadamente Cabuno, Bruce, Ancamona, entre outras.

“Recebemos medicamentos de três em três meses do hospital de Bubaque. Realizamos vacinas a cada mês nas tabancas que fazem parte da ilha e neste momento temos um stock de medicamentos”, contou.

No que diz respeito à prevalência de HIV-Sida, informou que a prevalência diminuiu, porque houve a participação e/ou adesão massiva das pessoas ao tratamento, a população tem aderido ao tratamento e planeamento familiar. A prevalência do SIDA é mais na faixa etária dos 25 anos.

Relativamente à despistagem de cancro, Zito disse que fazem a avaliação de cancro de mama que também não é frequente naquela zona insular do país, assegurando que a direção regional de saúde tem feito diligências para fazer chegar a todas as aldeias o direito à saúde, razão pela qual todos meses os técnicos fazem cinco saídas em colaboração com os 13 agentes da Saúde Comunitária. Admitiu que não têm condições para evacuar doentes.

“Havia um projeto que financiava a evacuação das grávidas em estado grave de Uno para Bubaque, mas já terminou o projeto há quase um ano e neste momento se precisarmos de evacuação temos que procurar um transporte ou pedir boleia como aconteceu com a vedeta que trouxe os medicamentos do projeto PIMI III, que nos ajudou a evacuar uma grávida para o Hospital de Bubaque, porque precisava”, contou.

De acordo com os dados do centro de Uno, em 2023 foram registados três óbitos a nível da saúde materno infantil, e neste ano ainda não se registrou nenhum caso e nenhum óbito, uma situação que se deve, em grande medida, à determinação não só dos agentes de saúde comunitária, como também da própria população que se tem mobilizado à procura de tratamento.

O centro de saúde dispõe de uma pessoa de limpeza que é pago com as receitas internas e os 13 agentes de ASC são suportados por um projeto. No que diz respeito às consultas, às crianças de 7 aos 14 anos pagam consultas no valor de 100 franco CFA, dos 15 aos 49 anos pagam 250 franco CFA, a partir dos 50 anos as consultas são gratuitas como também os menores de 0 a 6 anos e as grávidas não pagam.

O técnico lamentou a falta de incentivo do Estado perante a situação dos seus funcionários que trabalham numa zona isolada, sem subsídio de risco sobretudo para pessoas que trabalham nas ilhas, e que auferem um péssimo salário.

Por: Epifania Mendonça

terça-feira, 14 de novembro de 2023

Guiné-Bissau espera começar a exportar peixe para a UE dentro de um ano

© Lusa

POR LUSA  14/11/23 

O Ministério das Pescas da Guiné-Bissau conta iniciar a exportação do pescado do país para a União Europeia dentro de um ano, contando até lá ter a acreditação do laboratório de pesca.

Iça Bari, diretor geral do Instituto Nacional de Investigação das Pescas e Oceanografia, disse à Lusa que o país "já não pode esperar mais" no processo de obtenção da certificação do pescado para passar a exportar para a União Europeia.

Há vários anos que as autoridades guineenses tentam obter essa autorização, que passará, entre outras diligências, pela criação e entrada em funcionamento de um laboratório de controlo de qualidade e higiene do pescado e pela certificação.

Uma equipa de consultores da União Europeia que se encontra em Bissau para avaliar os passos já dados pelas autoridades referiu como expectativa, na melhor das hipóteses, conseguir concluir todo o processo dentro de dois anos.

O diretor-geral do Instituto Nacional de Investigação das Pescas e Oceanografia do Ministério das Pescas guineense considerou esse tempo "largo demais".

"Para as autoridades devia ser agora, mas de acordo com o nosso parceiro, União Europeia, o horizonte temporal será dentro de um ano, um ano e meio ou dois. Mas o processo está bem encaminhado", observou Iça Bari.

O responsável assinalou que Portugal vai ajudar a Guiné-Bissau na acreditação do laboratório de controlo de higiene do pescado, um dos requisitos para obter a certificação.

Bari afirmou que "as barreiras" que se colocam no processo por parte da União Europeia "são mais políticas de que técnicas", tendo em conta os passos já dados por Bissau.

"As pessoas aqui na Guiné-Bissau não entendem como é que a União Europeia pesca aqui nas nossas águas e leva o produto como produto da União Europeia, mas quando é para colocar 'made in Guiné-Bissau' ao nosso pescado já há barreiras", disse.

Para o responsável, as pessoas no país não percebem que o pescado capturado na Guiné-Bissau seja exportado para o mercado europeu a partir do Senegal.

"A única diferença é que o Senegal está na lista de países que podem exportar pescado para a União Europeia", sublinhou Iça Bari.

O responsável do Ministério das Pescas guineense notou que das 200 mil toneladas de capturas anuais, cerca de 30% passa pelo Senegal, para atingir outros mercados, nomeadamente europeu.

Henrique da Silva, sócio-gerente de uma das principais empresas de pesca da Guiné-Bissau disse à Lusa que não concorda que o país espere por mais tempo até obter a certificação para começar a exportar para o mercado europeu.

O empresário considerou necessário que a Guiné-Bissau "faça pressão" junto da União Europeia.

"Quando tivermos produto para exportar somos obrigados a descarregar no Senegal, tirar o pescado da caixa, entregar ao comprador e com o jogo dos preços ficamos sempre a perder dinheiro. Achamos que é urgente mudar isso", defendeu Henrique Silva.

O empresário disse não acreditar que as empresas pesqueiras da Gâmbia e da Guiné-Conacri tenham melhores condições para exportar para o mercado europeu do que as da Guiné-Bissau.

"É muito tempo esperar mais dois anos, vamos exigir que se encurte esse prazo", vincou Henrique Silva.


quinta-feira, 20 de julho de 2023

Senegal. Mais de 90 passageiros de barco em perigo ainda desaparecidos

© Seyllou/AFP via Getty Images

POR LUSA   20/07/23 

Um barco que transportava migrantes foi encontrado em perigo ao largo da costa do Senegal, e mais de 90 passageiros continuam desaparecidos, depois de 50 terem sido resgatados e sete encontrados mortos, informou quarta-feira uma associação de pescadores.

O barco foi localizado no alto mar na passada sexta-feira, ao largo da costa da cidade piscatória senegalesa de Saint-Louis, na fronteira do norte do país com a Mauritânia, de acordo com Abdou Ndiaga Beye, vice-secretário de uma associação local de pescadores, Conselho de Pesca Artesanal.

Os mortos eram todos do sexo masculino, e a polícia questionou os sobreviventes resgatados pela guarda costeira do Senegal, que fez saber que a embarcação transportava 148 pessoas, afirmou Beye em declarações à Associated Press (AP).

Não ficou claro se a embarcação era um dos três barcos que transportavam um total de 300 pessoas que, segundo o grupo de ajuda espanhol Walking Borders, desapareceram no final de junho, depois de partirem do Senegal.

Alguns dos sobreviventes eram, no entanto, das duas cidades onde os três barcos iniciaram as respetivas viagens.

A Walking Borders anunciou no início da semana que os três barcos que deixaram o Senegal no final de junho eram provenientes de Mbour, uma cidade costeira no centro do país, e da cidade de Kafountine, no sul do país.

O Conselho de Pesca Artesanal afirmou também que todos migrantes que seguiam num barco resgatado na semana passada eram senegaleses e incluíam pessoas de Mbour e Kafountine.

O ministério senegalês das Relações Exteriores afirmou, porém, num comunicado divulgado na passada terça-feira, que as informações do grupo de ajuda espanhol sobre migrantes desaparecidos são completamente infundadas.

Segundo a Walking Borders, 260 senegaleses foram resgatados no mar pelas autoridades marroquinas entre 28 de junho e 9 de julho e, posteriormente, levados para instalações junto ao consulado do Senegal em Dakhla, uma cidade do Sara Ocidental, de onde serão repatriados.

As novas informações passada pelo Conselho de Pesca Artesanal esta quarta-feira surgem numa altura em que um número crescente de embarcações de migrantes está a deixar o Senegal rumo às Ilhas Canárias, em Espanha.

No início desta semana, as autoridades espanholas resgataram 86 pessoas de um barco perto das Canárias, aparentemente proveniente do Senegal.

Pelo menos 19 embarcações do Senegal chegaram às Canárias desde junho, segundo o Walking Borders.

A rota migratória atlântica é uma das mais mortais do mundo. Cerca de 800 pessoas morreram ou desapareceram no primeiro semestre de 2023, de acordo com a organização espanhola.

Nos últimos anos, as Ilhas Canárias tornaram-se um dos principais destinos para migrantes que tentam chegar a Espanha, tendo sido registado um pico de mais de 23.000 pessoas em 2020, de acordo com o ministério espanhol do Interior. Nos primeiros seis meses deste ano, mais de 7.000 migrantes e refugiados chegaram às Canárias.

Economias em dificuldades, falta de emprego, violência extremista, agitação política e o impacto das alterações climáticas estão entre fatores que levam os migrantes a arriscar a vida em barcos sobrelotados para chegar às Canárias.


segunda-feira, 19 de junho de 2023

ONU adota tratado histórico para proteção dos oceanos

© iStock

POR LUSA   19/06/23 

As Nações Unidas (ONU) adotaram hoje o primeiro tratado para a proteção do alto mar, um acordo histórico alcançado após anos de debates e negociações e que permitirá o estabelecimento de áreas marinhas protegidas em águas internacionais.

O texto, que foi finalizado após um longo processo de negociações, foi formalmente aprovado hoje em Nova Iorque após ser revisto e traduzido para os seis idiomas oficiais das Nações Unidas.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, elogiou a adoção do acordo, classificando-o como uma demonstração da força do multilateralismo.

"O oceano é a alma do nosso planeta e hoje vocês deram-lhe uma nova vida e uma oportunidade", disse Guterres aos Estados-membros da ONU.

"Ao agir para combater as ameaças ao nosso planeta que vão além das fronteiras nacionais, vocês demonstraram que as ameaças globais merecem uma ação global e que os países podem unir-se para o bem comum", acrescentou.

A adoção ocorreu por consenso, sem necessidade de votação, e foi aplaudida de pé pelos representantes dos Governos, que comemoraram a conclusão do longo processo.

Embora a decisão de hoje ponha fim às negociações na ONU, o novo tratado não entrará em vigor até que pelo menos 60 países o tenham assinado e ratificado.

O texto será aberto para assinatura na sede das Nações Unidas a partir de 20 de setembro e Guterres já pediu hoje aos Governos que não demorem.

"Isso é fundamental para responder às ameaças enfrentadas pelo oceano e para o sucesso das metas relacionadas ao oceano da Agenda 2030 e do Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal", observou.

Com base no legado da Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar, este acordo fortalece significativamente a estrutura legal para a conservação e uso sustentável da biodiversidade marinha em áreas fora das jurisdições nacionais.

O tratado fornece uma estrutura essencial para a cooperação intersetorial entre os Estados e outras partes interessadas para promover o desenvolvimento sustentável dos oceanos e os seus recursos, assim como para combater as múltiplas pressões que enfrenta.

Grupos ambientalistas insistem há anos que este tratado é vital para salvar os oceanos, ameaçados pela poluição, pela crise climática e pelas novas tecnologias que abrem as portas para a mineração no fundo dos mares e a pesca mais intensiva.

O alto mar - as águas situadas a mais de 200 milhas náuticas das costas - representam dois terços do total dos oceanos e até agora foram administrados sob uma série de acordos e organizações internacionais sem uma jurisdição clara, sem muita coordenação e com regulamentos inadequados para a sua proteção.

Entre outras coisas, o novo tratado lança as bases para o estabelecimento de áreas marinhas protegidas, o que deve facilitar o cumprimento da promessa internacional de salvaguardar pelo menos 30% dos oceanos até ao ano de 2030.

Além disso, garante que o impacto ambiental das atividades em águas internacionais seja levado em consideração e facilite a cooperação entre países em tecnologia marinha.

Também cria um quadro para a partilha dos benefícios do mar, especialmente tudo o que está relacionado com os recursos genéticos marinhos - espécies que podem fornecer genes patenteáveis no futuro, para uso medicinal, por exemplo.

Nessa questão, colidiram os interesses de alguns países ricos, que são os que têm maior capacidade de aproveitar esses avanços, e os dos Estados em desenvolvimento, que temem ser excluídos, naquela que foi uma das últimas questões a serem fechadas na maratona de negociações.


sábado, 10 de junho de 2023

Parlamento Europeu (PE) agenda debates sobre Ucrânia, seca e organismo ético na sessão plenária

© Reuters

POR LUSA   10/06/23 

O Parlamento Europeu (PE) vai debater na sessão plenária da próxima semana a situação na Ucrânia e o problema da seca, entre outros temas, como a proposta de criação de um organismo de ética interinstitucional.

Na terça-feira, os eurodeputados têm agendado um debate sobre os recentes desenvolvimentos na Ucrânia, incluindo a destruição da barragem de Kakhovka, que teve como consequência inundações que obrigaram a retirar milhares de pessoas das suas casa e destruíram campos agrícolas.

Os esforços de reconstruir, de forma sustentável, o país devastado pela guera lançada pela Rússia em 24 de fevereiro de 2022, e a ajuda que a União Europeia poderá prestar são também temas do debate.

No mesmo dia, o PE vai debater a recente -- e já contestada por pouco ambiciosa -- proposta da Comissão Europeia para a criação de um organismo de ética que estabeleça regras de conduta comuns a todas as instituições.

As críticas visam principalmente o facto de o organismo não ter competência de investigação de casos nem de imposição de sanções.

A revisão das regras éticas tinha sido assumida pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, quando iniciou o mandato em novembro de 2019, mas acabou por ser impulsionada pelo escândalo de tráfico de influências 'Qatargate' que abalou o PE em dezembro de 2022.

A crescente escassez de água e a seca que afetam Estados-membros como Portugal, Espanha, França e Itália vai a debate na quinta-feira, tencionando os eurodeputados pedir mais medidas para preservar e melhorar os recursos hídricos da UE, afetados por vários anos de seca e pela diminuição dos níveis das águas subterrâneas.

Segundo os mais recentes dados do Observatório Europeu da Seca, mais de um quarto do território da UE está atualmente em condições de alerta de seca, enquanto 08% já se encontra em estado de alerta de seca.

Na quarta-feira, o PE vai autorizar o acordo de pesca de atum com a República da Maurícia para o período 2022-2026, que inclui navios portugueses.

O acordo permitirá à frota da UE --- composta principalmente por barcos espanhóis e franceses, mas também italianos e portugueses (01% do total) --- pescar até 5.500 toneladas por ano de atum e espécies afins.


Leia Também: Quatro crianças encontradas na selva da Colômbia 40 dias após queda de avião

segunda-feira, 15 de maio de 2023

TIMOR-LESTE: Ramos-Horta defende compra de equipamento naval a Portugal

© Reuters

POR LUSA  15/05/23 

O Presidente da República timorense defendeu hoje que Timor-Leste deve comprar equipamento naval e 'know-how' a Portugal para estabelecer um pequeno estaleiro no país para garantir a manutenção das embarcações timorenses.

"Porque não contactamos com as autoridades portuguesas (...) e encontramos uma fórmula (...) em que Portugal nos venda, não é dar, nos venda equipamento naval, 'know-how', e construímos aqui um estaleiro naval", questionou José Ramos-Horta em entrevista à Lusa.

"Por amor de Deus, eu peço aos governantes para pensarem com seriedade nesta questão de manutenção: não há um exército, não há uma polícia séria sem uma manutenção na retaguarda, muito, muito boa", afirmou.

Ramos-Horta presidiu hoje à inauguração do recém-recuperado Centro de Operação Marítima (COMAR) instalado na base naval de Hera, a leste da capital timorense, estrutura recuperada com apoio da cooperação australiana e que acolhe a Autoridade Marítima Nacional.

O Programa de Cooperação Australiano para a Defesa forneceu cerca de 375 mil dólares americanos (345 mil euros) com apoio técnico adicional a nível de engenharia.

O Presidente saudou os progressos conseguidos pela componente naval das Forças de Defesa timorense (F-FDTL), com mais de 800 elementos e cada vez mais equipamento, considerando que é essencial evitar os erros do passado.

Notou, por exemplo, que anualmente o Estado gasta entre 600 e 800 mil dólares para a manutenção do seu ferry de passageiros, feita na Indonésia e sem "controlo de que se faz mesmo a manutenção" nesse valor.

O Estado comprou ainda dois navios da Xangai Class, à China, "por 30 milhões de dólares, sem manutenção", recebendo três outras embarcações da Coreia do Sul, também sem manutenção, das quais uma "vai ser afundada" e as outras foram entregues à polícia.

"É necessário pensar muito na manutenção. Não há uma instituição que pode funcionar sem uma manutenção rigorosa. Refiro-me a uma manutenção de segurança e de defesa. Temos tantas embarcações, algumas compradas sem se pensar duas vezes", disse.

O chefe de Estado defendeu ainda que o país trabalhe com a Austrália e com a Indonésia, de forma bilateral ou trilateral, para garantir a segurança nas águas do país, considerando "romântico ou irrealista" Timor-Leste pensar que o pode fazer sozinho.

"É caríssima a segurança marítima. E é romantismo ou irrealismo total pensar que um país pequeno como Timor-Leste, ou de maior dimensão, pode fazer segurança marítima da sua orla económica exclusiva sozinho. Austrália, que é a Austrália, uma potência mundial, potência regional, só consegue controlar 10% da sua zona económica exclusiva, incluindo no mar de Timor. Quanto mais Timor-Leste", afirmou.

"Sempre insisti: para fazermos acordo, ou trilateral (Austrália, Timor-Leste e Indonésia) ou bilateral (Austrália e Timor-Leste). A Indonésia de uma maneira geral não gosta desses acordos tripartidos. Prefere o princípio da coordenação, em vez de acordo trilateral. Muito bem. Timor-Leste e Austrália, façamos o acordo de cooperação e coordenamos com a Indonésia, entregamos à Indonésia a coordenação para a patrulha no mar de Timor", afirmou.

Intervindo na cerimónia de hoje, a Encarregada de Negócios da Embaixada da Austrália em Díli, Caitlin Watson -- que está no país há apenas 15 dias -- reafirmou a importância que Camberra dá às suas relações com Timor-Leste.

"A nossa amizade assenta no respeito mútuo. As nossas nações partilham a ambição de um Timor-Leste mais forte, mais próspero e mais resiliente", disse.

"As vossas conquistas como nação -- num período relativamente curto -- são verdadeiramente notáveis. É testemunho da determinação do vosso povo e dos vossos líderes que Timor-Leste seja hoje democrático, soberano, estável e livre", afirmou.

Watson destacou o contexto internacional de segurança, e vincou que a Austrália quer uma "região com previsibilidade, que opere com regras, padrões e leis acordadas", onde "nenhum país domina, nem nenhum país é dominado".

Nesse sentido, disse, a região deve respeitar a soberania e todos os países devem beneficiar de "equilíbrio estratégico", o que para a Austrália implica trabalhar com parceiros e amigos na região.

"Queremos uma região aberta e inclusiva, baseada em regras acordadas, onde países de todas as dimensões podem escolher o seu próprio destino", sublinhou.

A nível bilateral, Timor-Leste e a Austrália assinaram no ano passado o novo acordo quadro de cooperação no setor da defesa, que o parlamento em Camberra deverá ratificar este ano e que assenta numa parceria "moderna, respeitosa e mútua".

"Dada a nossa fronteira marítima comum e proximidade geográfica, não é surpresa que a segurança marítima seja o principal foco de esforço na nossa relação de defesa. Reconhecemos que Timor-Leste, tal como a Austrália, também procura contribuir e responder aos desafios de segurança comuns da região", notou.

A diplomata relembrou que as capacidades do país neste setor têm contado ainda com a colaboração de Portugal e do Brasil e que, no âmbito da cooperação australiana, o país deverá receber ainda dois navios da classe Guardian, oferecidos pela Austrália, que permitirão reforçar o controlo das suas águas territoriais.

Uma capacidade que ajudará a responder a "incidentes de busca e salvamento, pesca ilegal, não declarada e não regulamentada, ameaças à segurança das infraestruturas de petróleo e gás 'offshore', pirataria e tráfico de pessoas e de estupefacientes".

"Uma capacidade marítima mais forte ajudará a proteger os vossos recursos naturais, mitigar os efeitos do aumento das catástrofes naturais, apoiar a vossa resiliência económica e contribuir para a segurança da região", disse.

"É igualmente necessária uma estreita cooperação entre os parceiros regionais em matéria de segurança marítima para que estas questões possam ser abordadas de forma coerente. E é por isso que o envolvimento prático com parceiros com ideias semelhantes, como a Indonésia, Portugal, Estados Unidos e outros, é tão importante", defendeu.


Leia Também: Ramos-Horta defende cessar-fogo e abertura dos portos ucranianos