Combates entre o exército do Sudão e paramilitares continuaram hoje pelo terceiro dia consecutivo. Presidentes africanos apelam à paz.
Os principais combates de hoje tiveram lugar nas proximidades do quartel-general das forças armadas e do palácio presidencial de Cartum, onde se encontra a residência do líder do exército, general Abdel Fattah al-Burhan.
Aviões de combate sobrevoaram as zonas central e oriental de Cartum, a capital do Sudão, disseram testemunhas à agência espanhola EFE.
As mesmas fontes disseram que se ouviram fortes explosões perto de uma das bases do grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (RSF, na sigla em inglês) em Soba, onde os combates começaram no sábado (15.04).
As regiões do Nilo Oriental e Cartum Norte, perto da capital, também acordaram ao som de explosões que originaram grandes colunas de fumo.
Testemunhas disseram que o exército bombardeou dezenas de veículos paramilitares blindados e petroleiros a caminho da capital para reabastecer os tanques das RAF.
Residentes em Cartum relataram à agência norte-americana AP cortes de energia e pilhagens.
Na cidade de Omdurman, perto da capital, testemunhas relataram que estavam a ocorrer confrontos perto da estação estatal de televisão e rádio, um edifício que tem sido disputado pelas duas partes desde o início do conflito.
Presidentes africanos apelam à paz
Os presidentes queniano, William Ruto, do Sudão do Sul, Salva Kiir, ugandês, Yoweri Museveni, do Djibuti, Ismail Omer Guelleh, e somali, Hassan Sheikh Mohamud, realizaram uma cimeira virtual extraordinária no domingo (16.04) para abordar a crise no Sudão.
"Os líderes apelaram ao general Abdel Fattah al-Burhan e ao general Mohamed Hamdan Dagalo, (comandante das RFS) do Conselho Soberano de Transição para pararem a guerra e regressarem às negociações", escreveu a presidência queniana no Twitter.
A Autoridade Intergovernamental para o Desenvolvimento (IGAD) também decidiu enviar "o mais rapidamente possível" os Presidentes Kiir, Ruto e Guelleh ao Sudão para "reconciliar os grupos beligerantes", uma vez que "a estabilidade no Sudão é fundamental para a estabilidade social e económica da região".
O general Abdel Fattah al-BurhanFoto: Marwan Ali/AP/dpa/picture alliance
Dissolução das Forças de Apoio Rápido
O chefe do exército sudanês ordenou hoje a dissolução das Forças de Apoio Rápido paramilitares e a sua classificação como um "grupo rebelde".
"Como resultado da rebelião das RFS, o presidente do Conselho Soberano Transitório e comandante-chefe das forças armadas emitiu uma decisão de dissolver as RFS e declará-lo um grupo rebelde contra o Estado, e serão tomadas medidas contra ele em conformidade", disse o Ministério dos Negócios Estrangeiros sudanês.
Al-Burhan acusou estas forças paramilitares de lançarem ataques sábado contra posições militares na capital, Cartum, e outras cidades do país, incluindo a sua residência, pouco antes da reunião prevista entre o chefe do exército e o líder da RFS, Mohamed Hamdan Dagalo ('Hemedti') para abordar as tensões, de acordo com a agência noticiosa estatal sudanesa, SUNA.
Disse ainda que se tratou de um sinal de "má-fé" por parte das RFS e salientou que o exército "respondeu, de acordo com a sua responsabilidade nacional de alcançar segurança e estabilidade no país".
"As forças armadas conseguiram derrotar os rebeldes, infligindo pesadas perdas em vidas e equipamento, obrigando um grande número deles a render-se ou a fugir do campo de batalha", afirmou.
Entretanto, o comandante das RFS exigiu hoje que a comunidade internacional interceda: "A comunidade internacional deve agir agora e intervir contra os crimes do general sudanês Abdel Fattah al-Burhan, um islamista radical que bombardeia civis a partir do ar".
"O seu exército está a fazer uma campanha brutal contra pessoas inocentes", acrescentou Mohamed Hamdan Dagalo, na sua conta do Twitter.
O general avisou que os seus combatentes "continuarão a perseguir al-Burhan" até que "ele seja levado à justiça", justificando que os combates eclodiram no sábado, em "resposta ao cerco e assalto" às unidades das RFS.
Sudan Khartum | Sudan unterzeichnet „Rahmenabkommen“ zur Beendigung der politischen KriseSudan Khartum | Sudan unterzeichnet „Rahmenabkommen“ zur Beendigung der politischen Krise
O general Mohamed Hamdan DagaloFoto: Mahmoud Hjaj/AA/picture alliance
Hospitais alvo de ataques
Os médicos do Sudão denunciaram hoje que vários hospitais do país tiveram de suspender as suas atividades, após serem alvo de ataques.
"Hospitais e instituições de saúde em Cartum e noutras cidades do Sudão foram bombardeados", nos confrontos que ocorrem desde sábado, o que causou "sérios danos" a vários deles, revelou o Comité dos Médicos do Sudão num comunicado publicado na sua conta na rede social Facebook.
"Tínhamos pedido às partes em conflito que não atacassem instalações médicas, mas o que aconteceu foi exatamente o contrário", acusou a organização.
"Estes atentados são uma clara violação dos direitos humanos e dos acordos que estipulam a proteção das instituições de saúde", sublinhou.
A organização apelou à comunidade internacional para "exigir que as partes em conflito não danifiquem as instalações de saúde, abram corredores humanitários e permitam a passagem de ambulâncias" e reiterou o apelo às organizações humanitárias para agirem "urgentemente para ajudar a retirar os feridos e fornecer fluidos intravenosos, bolsas de sangue e ajuda médica".
Entretanto o secretário-geral da ONU, António Guterres, condenou hoje "as mortes e ferimentos de civis e trabalhadores humanitários e o ataque e pilhagem de instalações". "Lembro a todas as partes a necessidade de respeitar o direito internacional, inclusive garantindo a segurança de todo o pessoal das Nações Unidas, de organizações associadas e trabalhadores de ajuda humanitária", disse Guterres que também pediu o fim imediato ds hostilidades.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) tinha já avançado que "vários dos nove hospitais de Cartum que recebem civis feridos não têm mais sangue, equipamento de transfusão, fluidos intravenosos e outros materiais vitais".
As principais organizações da sociedade civil e partidos políticos do Sudão apelaram em uníssono, durante o fim de semana, não só ao fim dos combates, mas também ao fim da "militarização" que dominou "o espaço público" no país durante décadas, e em particular desde o derrube, há quatro anos, do ditador Omar Hassan al-Bashir, na sequência de uma revolução.
O país africano foi governado antes do início dos combates por uma junta liderada pelo chefe do exército que tinha como seu "número dois" o líder militar das RFS.
As divergências entre os dois sobre a integração paramilitar num futuro exército unificado - um acordo anterior à formação de um novo governo de unidade liderado por civis - acabaram por degenerar neste conflito.
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