Foto: Mikhail Tereshchenko/TASS/dpa/picture alliance
Por DW 21/08/23
Os países do BRICS vão reunir-se de 22 a 24 de agosto em Joanesburgo, numa altura em que o bloco pretende alargar a sua influência. Mas a ausência do Presidente russo, Vladimir Putin, já está a causar agitação.
De acordo com os organizadores, a próxima cimeira dos BRICS - que se realiza na África do Sul de 22 a 24 de agosto - tem como objetivo promover um sistema de governação global mais justo e contrariar o domínio económico das nações ocidentais.
No entanto, alguns observadores afirmam que a ausência do líder russo Vladimir Putin nas conversações pode prejudicar a sua crescente influência em África.
A Rússia é um dos cinco países membros dos BRICS - que incluem também o Brasil, a Índia, a China e a África do Sul - que se consideram economias em rápido crescimento.
O Presidente russo é atualmente alvo de um mandado de captura do Tribunal Penal Internacional, tendo como pano de fundo a invasão russa da Ucrânia, que tem sido amplamente condenada a nível internacional.
A sua potencial visita colocou a África do Sul perante um dilema diplomático e jurídico, até que mais tarde foi confirmado que o seu Ministro dos Negócios Estrangeiros, Sergey Lavrov, iria liderar a delegação russa.
Gideon Chitanga, investigador associado da Universidade de Witwatersrand, em Joanesburgo, disse à DW que a presença de Putin "vai ser uma enorme distração", devido a "todas as controvérsias que surgiram com a sua acusação" pelo Tribunal Penal Internacional.
"A sua ausência, pelo menos, ajuda, por enquanto, a manter o foco nas questões-chave", acrescentou Chitanga. "Por outras palavras, haverá menos ruído em relação ao Presidente Putin, à sua detenção e, provavelmente, a toda a questão que envolve as relações entre a Rússia e os países africanos."
Vladimir Putin participará em vídeo conferência.Foto: Mikhail Metzel/TASS/IMAGO
A ausência de Putin é importante?
Em julho, Putin desvalorizou a sua ausência da viagem à África do Sul.
"Não creio que a minha presença na cimeira dos BRICS seja mais importante do que estar agora aqui na Rússia", disse aos jornalistas.
No entanto, Gustavo de Carvalho, investigador sénior do Instituto para os Assuntos Globais Africanos da Universidade de Joanesburgo, disse que a Rússia está economicamente fraca neste momento, deixando potencialmente a porta aberta para negociações mais profundas se Putin tivesse feito a viagem.
"A guerra está a cobrar o seu preço. E assim, talvez alguns acordos de alto nível pudessem ter sido feitos, se o presidente Putin tivesse vindo", disse ele à DW.
"Mas não acho que [a sua ausência] vá ter um grande efeito de qualquer maneira".
Mas nem toda a gente está de acordo. No período que antecedeu a cimeira dos BRICS, o partido da oposição radical de esquerda da África do Sul, os Combatentes da Liberdade Económica, instou os líderes da China, Índia e Brasil a boicotarem o evento em solidariedade com a ausência de Putin.
O líder do partido, Julius Malema, apelou aos seus apoiantes para que realizassem protestos de apoio ao líder russo.
"Apelamos aos presidentes da República Popular da China, da Índia e do Brasil para que não compareçam na cimeira dos BRICS em solidariedade com o Presidente Putin", afirmou.
"Foi o [presidente sul-africano] Ramaphosa - o cobarde Ramaphosa - que não conseguiu garantir que não prenderíamos Putin", acrescentou. "Nunca apoiaremos o imperialismo contra o Presidente Putin".
As ambições russas para o Sahel na ribalta
O líder russo não está apenas a fazer ondas na África do Sul. A recente tomada de poder militar no Níger pôs também em evidência a crescente influência da Rússia na região do Sahel, na sequência de uma vaga de golpes de Estado na zona nos últimos três anos.
No Mali e no Burkina Faso - que assistiram aos seus próprios golpes de Estado em 2021 e 2022, respetivamente - os líderes militares expulsaram as tropas da antiga potência colonial francesa e reforçaram as relações diplomáticas com Moscovo. Ambos os países advertiram contra qualquer intervenção militar no Níger, com Putin a fazer eco do seu desejo de uma "resolução pacífica".
Durante o mandato do presidente democraticamente eleito do Níger, Mohamed Bazoum, o país era considerado um aliado do Ocidente.
No entanto, Frederick Golooba-Mutebi, investigador e comentador de assuntos sociopolíticos na região dos Grandes Lagos da África Oriental, disse à DW que a Rússia está simplesmente a perseguir os seus próprios interesses no Sahel, tal como outras potências ocidentais fizeram no passado.
"A Rússia, tal como qualquer outra potência ocidental, apoiará governos em África que estejam alinhados com os seus interesses", afirmou.
"Se a Rússia está a fazer o mesmo hoje em dia, o Ocidente não deve dar meia volta e ficar preocupado com a crescente influência da Rússia em África."
África a perseguir os seus próprios interesses
De acordo com o investigador Chitanga, a noção de que a Rússia contribui pouco para as economias africanas em comparação com as suas explorações militares continua a ser a narrativa dominante.
"No entanto, alguns africanos consideram Putin um aliado vital", afirmou, acrescentando que os cidadãos africanos estão mais interessados em "saber como os seus países irão beneficiar da cimeira dos BRICS e das relações emergentes em torno dos BRICS".
Chitanga acredita que os países africanos não vão necessariamente capitular perante a pressão ocidental.
"Existe uma grande preocupação entre os decisores políticos, os grupos de reflexão e os académicos africanos, que são muito críticos em relação ao que consideram ser a hipocrisia ocidental na tentativa de influenciar ou ditar a política dos países africanos", afirmou.
Frederick Golooba-Mutebi disse que os líderes africanos continuam a estar muito conscientes da posição das outras nações em relação à Rússia, em particular a que é divulgada pelos meios de comunicação social ocidentais. Na Cimeira Rússia-África de 2023, em julho, apenas 17 chefes de Estado africanos participaram, em comparação com 43 na primeira cimeira em 2019.
"Não se pode dizer que os líderes africanos viajaram ou estiveram representados em Moscovo porque gostavam de Putin. Eles tinham interesses com a Rússia que devem preservar", explicou.