Pilula abortiva nos EUA (GettyImages)
CNN Portugal, 07/04/23
Mais de cem estudos revistos pelo The New York Times confirmam a eficácia e a segurança desta pílula para interromper uma gravidez no primeiro trimestre. Mas os grupos antiaborto insistem em querer proibir este medicamento
A pílula abortiva é um método seguro para interromper uma gravidez - é o que concluem mais de cem estudos científicos, realizados em 26 países de diferentes continentes ao longo de mais de três décadas, que examinaram a eficácia e a segurança da Mifepristona e do Misoprostol, as pílulas abortivas mais usadas nos Estados Unidos.
O jornal norte-americano The New York Times reviu estes estudos que, em conjunto, focaram 124 mil interrupções realizadas no primeiro trimestre de gravidez. Na maioria dos estudos, 99% das pacientes não tiveram complicações sérias. Foram relatadas apenas uma morte por infecção relacionada com o aborto e uma morte por causas não relacionadas. Todos concluem que as pílulas são um método seguro para interromper uma gravidez.
Os medicamentos são normalmente usados durante as primeiras 12 semanas de gravidez. Para as mulheres grávidas que consideram tomar a pílula abortiva, as alternativas seriam o parto ou uma intervenção cirúrgica.
“Pode haver uma discussão política aqui, mas não há muita ambiguidade científica sobre a segurança e eficácia deste produto”, disse ao The New York Times Caleb Alexander, professor de epidemiologia e medicina na Escola de Saúde Pública Johns Hopkins Bloomberg e co-diretor do Centro de Segurança e Eficácia de Medicamentos.
No entanto, apesar do extenso registo científico sobre a segurança das duas pílulas abortivas, a pílula abortiva foi já proibida em vários estados e os grupos antiaborto nos Estados Unidos pediram a um juiz federal que emitisse uma ordem para impedir que estes medicamentos fossem usados para interromper a gravidez, argumentando que são perigosos. Se confirmada pelos tribunais superiores, uma decisão a favor dos queixosos pode impedir a realização de abortos legais em todo o país, onde mais da metade dos abortos são feitos com medicamentos.
"É um retrocesso para a liberdade das mulheres, especialmente para as mais vulneráveis, que não terão recursos para ir a outro estado para obtê-la", disse à AFP o cientista francês Etienne-Emile Baulieu, de 96 anos, responsável pelo desenvolvimento da pílula do dia seguinte, sobre a decisão do Wyoming em março passado.
Na sua denúncia, os grupos antiaborto consideram que “o uso dessas duas drogas químicas abortivas causa ferimentos e danos significativos a mulheres e raparigas grávidas”. Os queixosos citam alguns estudos, mas nenhum contradiz os estudos revistos pelo The New York Times. Em vez disso, os estudos citados apontam para efeitos nos pacientes que são comuns e esperados, como sangramento e dor - quase todas as pacientes terão sangramento e dor durante um aborto medicamentoso, porque as pílulas basicamente desencadeiam um aborto espontâneo.
Em Portugal, onde a pílula abortiva está disponível desde 2007, para a realização de Interrupção Voluntária da Gravidez, a Direção-Geral de Saúde alertou que "em consequência da medicação, a mulher apresentará a mesma sintomatologia de um aborto espontâneo: dor pélvica mais ou menos intensa e perda hemática tipo menstrual que pode ser prolongada por 9 dias, ou até 45 dias em casos mais raros". Outros efeitos acessórios, referidos pela DGS, incluem náuseas, vómitos e diarreia, não sendo necessário, no entanto, receitar medicação.
“Não é uma experiência agradável. O sangramento naturalmente deixa as pessoas preocupadas”, disse ao NYT Ushma Upadhyay, professora de ciências reprodutivas da Universidade da Califórnia, em São Francisco.
Algumas pacientes que ficam preocupadas com a quantidade de sangue ou outros efeitos colaterais dirigem-se às urgências, mas a investigação de Upadhyay mostra que a maioria não enfrenta complicações graves.
E enquanto as pílulas têm uma eficácia de cerca de 95%, apenas cerca de 3 a 5% por cento das pacientes precisam de um procedimento adicional para remover o tecido remanescente ou interromper a gravidez. Os médicos consideram que essas não são situações tipicamente perigosas e o nível de risco é bastante baixo.
A Food and Drug Administration (FDA) dos EUA informou que desde que aprovou a medicação, em 2000, até junho do ano passado, aproximadamente 5,6 milhões de mulheres nos Estados Unidos tomaram as pílulas. Houve 28 mortes relatadas, ou seja, 0,0005 por cento. A agência informou que algumas dessas mortes podem ter tido outras causas.