Canela (imagem: Pixabay) © CNN PortugalEmbora a canela seja uma especiaria popular utilizada em vários alimentos, tem também uma longa história de utilização na medicina tradicional em muitas culturas. Atualmente, os produtos à base de canela são vendidos como suplementos alimentares, para ajudar no tratamento de vários problemas de saúde, incluindo diabetes, perda de peso e alívio da febre dos fenos (rinite alérgica) e outras condições inflamatórias.
Mas quanto é demasiada canela? Poderá o consumo excessivo de produtos à base de canela ter impactos negativos? É preciso ter cautela, pois a canela pode interferir no metabolismo de medicamentos sujeitos a prescrição médica, de acordo com um estudo publicado na revista Food Chemistry: Molecular Sciences. Os autores alertam para os riscos do consumo excessivo de substâncias que contêm canela, especialmente em indivíduos com outros problemas de saúde.
Para nos ajudar a entender os resultados do estudo e quais são as principais conclusões sobre o consumo de canela, falámos com a especialista em bem-estar da CNN, Leana Wen, médica de urgência e professora adjunta da Universidade George Washington. Anteriormente, foi comissária de saúde de Baltimore.
O que é a canela - de onde vem e quais são os seus potenciais benefícios para a saúde?
A canela é uma especiaria proveniente da casca seca das árvores Cinnamomum. O tipo mais comum de canela vendido na América do Norte é a canela Cassia, obtida das árvores Cinnamomum aromaticum, de acordo com o Centro Nacional de Saúde Complementar e Integrativa, um dos centros subordinados aos Institutos Nacionais de Saúde. A canela do Ceilão, por vezes chamada de canela "verdadeira", é proveniente das árvores Cinnamomum verum.
Embora alguns estudos sugiram que a suplementação com canela pode ser útil no tratamento da diabetes ou na perda de peso, são necessárias mais investigações para comprovar esses benefícios.
Da mesma forma, embora investigações preliminares apontem para um possível efeito do spray nasal com canela do Ceilão no alívio da rinite alérgica, são necessárias mais pesquisas para confirmar que pode ser um tratamento.
O Centro Nacional de Saúde Complementar e Integrativa afirma que "a investigação não apoia claramente o uso da canela no tratamento de qualquer problema de saúde". A canela não está aprovada pela Autoridade de Segurança Alimentar e Medicamentos dos EUA (FDA) como tratamento para qualquer problema médico.
O que já se sabe sobre os possíveis riscos do consumo de canela?
A canela cassia pode conter altos níveis de cumarina, que é um anticoagulante. A canela do Ceilão também pode ter vestígios. Se alguém que toma medicamentos anticoagulantes ingerir uma grande quantidade de cumarina, isso pode aumentar o risco de hemorragia.
Além disso, existem interações conhecidas entre a cumarina e o fígado. O uso prolongado de produtos de canela com alto teor de cumarina pode representar riscos para a saúde de pessoas com doenças hepáticas. O Centro Nacional de Saúde Complementar e Integrativa refere ainda que existem "razões teóricas" para pensar que a canela pode interagir com medicamentos anticancerígenos e com nicotina.
O que analisou este estudo?
Este estudo analisou o principal ingrediente ativo da canela, chamado cinamaldeído. Os investigadores começaram por analisar se o cinamaldeído é bem absorvido quando ingerido por via oral, através da análise dos fluidos gástricos e intestinais. Descobriram que é 100% bioacessível em ambos os fluidos, em jejum e depois de comer. Isto significa que, independentemente de alguém estar em jejum ou ter acabado de comer, espera-se que o cinamaldeído seja bem absorvido. Depois, descobriram que o cinamaldeído é rapidamente metabolizado noutro composto, o ácido cinâmico, e que pode ativar vários recetores que afetam o metabolismo dos medicamentos.
A possível interferência no metabolismo de medicamentos foi o que levou os autores a concluir que o consumo excessivo de canela pode causar interações entre ervas e medicamentos. Os investigadores defendem a realização de mais estudos para analisar essas possíveis interações. Até que esses estudos estejam concluídos, conforme indicaram num comunicado de imprensa, recomendam que quem estiver a considerar tomar suplementos de canela o faça com precaução e consulte um médico antes de utilizá-los.
Quem deve ter cuidado?
De acordo com os investigadores do estudo, a lista de doenças crónicas que justificam cautela antes de iniciar a suplementação com canela inclui hipertensão, diabetes, cancro, artrite, asma, obesidade, VIH/SIDA e depressão.
Acrescentaria a essa lista todas as pessoas que tomam medicamentos anticoagulantes - por exemplo, quem tem histórico de doenças cardíacas ou acidente vascular cerebral (AVC). Também devem ter cautela aqueles que tomam medicação metabolizada pelo fígado e outros suplementos alimentares que possam interagir com a canela, como a curcuma (açafrão-das-índias), o ginseng e o ginkgo biloba.
E quanto a polvilhar canela no café ou nas panquecas? Devemos ficar preocupados?
Os investigadores são bastante claros ao afirmar que uma pitada de canela no uso culinário não deve causar problemas. O que eles alertam é para o que chamam de "consumo excessivo". Isso não está claramente definido, pois o estudo não foi concebido para determinar o que seria um nível excessivo de canela. O que provavelmente se entende por consumo excessivo é o uso prolongado de produtos concentrados de canela, como suplementos - por exemplo, tomar cápsulas de canela todos os dias durante meses.
As pessoas que estejam a pensar tomar suplementos de canela devem consultar o seu médico para verificar possíveis interações com medicamentos. Devem também estar conscientes de que não há provas claras dos benefícios da suplementação com canela.
Que mais gostaria que as pessoas soubessem antes de começarem a tomar suplementos alimentares?
Os consumidores devem saber que a FDA não regula os suplementos alimentares da mesma forma que regula os medicamentos sujeitos a receita médica. De acordo com a legislação atual, a FDA não tem autoridade para regular a eficácia dos suplementos alimentares. A FDA também não analisa os suplementos antes de serem colocados no mercado. Em vez disso, a agência recorre à vigilância pós-comercialização para identificar problemas de segurança.
As pessoas devem ser cautelosas ao tomar suplementos alimentares. O facto de algo ser comercializado como "natural" não significa que seja seguro. Além disso, algo que é seguro em pequenas quantidades pode tornar-se perigoso quando consumido em grandes quantidades. As pessoas devem informar sempre o seu médico sobre os suplementos que estão a tomar ou que pretendem tomar, para que este possa avaliar as interações com outros medicamentos.