© ReutersPOR LUSA 24/06/23
O líder do grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin, é um homem multifacetado, com diversos negócios na restauração que lhe deram a alcunha de "chef de Putin" e atividades ilegais que o colocaram sob sanções internacionais.
Empresário, ex-condenado, fundador de uma fábrica de 'trolls' (máquina de desinformação que através da Internet tenta interferir nas opiniões e decisões políticas) e mercenário, Prigozhin é, agora, o rebelde que desafia o Presidente russo, Vladimir Putin.
Com mais de 25 mil homens do seu exército privado, considerado ilegal na Rússia, mas que tem vindo a lutar ao lado das tropas russas na Ucrânia, Yevgueny Prigozhin iniciou na sexta-feira uma rebelião contra o comando militar devido ao "caos" em que, segundo ele, se transformou a guerra e aos "100.000 soldados russos" que diz terem morrido por culpa do Ministério da Defesa.
Nos últimos meses, Prigozhin tem vindo a criticar duramente o ministro da Defesa, Sergei Shoigu, e o chefe do Estado-Maior, Valery Gerasimov, desafiando-os constantemente em áudios e vídeos repletos de insultos, gritos e acusações de incompetência e de desorganização na estratégia bélica na Ucrânia.
A sua experiência como líder dos temidos mercenários russos, conhecidos pela brutalidade e pelo uso de métodos de tortura contra os seus próprios membros e inimigos, segundo denúncias de ex-combatentes e vídeos do grupo, foi adquirida em países como o Sudão, Mali, República Centro-Africana ou Líbia.
Contudo, Prigozhin nem sempre foi o líder de milhares de combatentes de Wagner, grupo que só em setembro de 2022 reconheceu, finalmente, ter criado em 2014, quando "começou o genocídio em Donbass", segundo disse, alinhado com o argumento usado por Putin em fevereiro de 2022 para lançar a guerra contra a Ucrânia.
Quem é Yevgeny Prigozhin?
Nascido há 62 anos em São Petersburgo, Prigozhin começou por ser um empresário criminoso, tendo passado 10 anos na prisão na década de 1990, sem que nunca tenha sido revelado o motivo.
Quando saiu da prisão, começou a vender cachorros-quentes e ganhava 1.000 dólares por mês, segundo relatou a um portal da sua cidade natal em 2011, numa das raras entrevistas que concedeu na altura.
Yevgeny Prigozhin aspirava, no entanto, a muito mais, e sabia como fazer bons contactos no meio empresarial e, mais tarde, na elite política russa.
Rapidamente, o homem, de extrema direita, conseguiu abrir o seu primeiro restaurante e entrar no mundo do 'catering' para jantares de gala ou com convidados ilustres da Rússia.
Nessa altura, Vladimir Putin já era Presidente e, às vezes, levava os seus convidados, incluindo líderes estrangeiros, como George Bush, a restaurantes de Prigozhin em São Petersburgo, segundo fotografias da altura.
Através da sua empresa Concord, Prigozhin foi ganhando contratos públicos de 'catering' e para fornecimento de escolas em Moscovo, acabando por conquistar o epíteto de "chef de Putin".
De acordo com uma investigação feita em 2017 pelo líder da oposição russa Alexei Navalni, atualmente detido, Prigozhin teria ganhado contratos estatais no valor de, pelo menos, 2.500 milhões de euros, incluindo um para fornecer alimentos ao exército russo.
Fábrica de 'trolls'
No entanto, as suas aspirações não ficavam por aqui. Embora nunca tenha implicado publicamente Putin nas suas iniciativas ilegais, Yevgeny Prigozhin decidiu servir o Estado russo através de uma outra faceta, quando criou a famosa fábrica de 'trolls' de São Petersburgo, que os EUA acusaram de interferir nas eleições presidenciais norte-americanas de 2016.
Só em fevereiro deste ano Prigozhin reconheceu ter sido o fundador desta estrutura, que lançou uma campanha nas redes sociais, em 2016, para manipular a opinião pública nos EUA antes das eleições presidenciais que Donald Trump viria a vencer.
"Nunca fui apenas o financiador da Internet Research Agency. Eu inventei-a, criei-a, administrei-a por muito tempo. Ela foi criada para proteger o espaço de informação russo da propaganda grosseira e agressiva das teses antirrussas do Ocidente", disse então.
Em novembro de 2022, Prigozhin respondeu pela primeira vez às acusações de suposta interferência nas eleições dos Estados Unidos, dizendo que a Rússia "o fez e fará": "Meus senhores, fizemo-lo, continuamos a fazê-lo e fá-lo-emos no futuro", disse.
Como resultado, os EUA sancionaram Prigozhin e três das suas empresas, incluindo a Concord Management e a Concord Catering, por influenciarem processos políticos no país.
Grupo Wagner
Em fevereiro de 2022, o empresário decidiu voltar a centrar-se no seu grupo de mercenários e enviou os seus combatentes para a Ucrânia, onde começaram os problemas com o comando militar russo, que inicialmente não deu o devido crédito aos 'wagneristas' quando estes tomavam alguma localidade, enfurecendo Prigozhin.
O conflito eclodiu este ano durante o combate pelo controlo de Bakhmut, que acabou por ser tomada pelos mercenários em maio, naquela que foi, até agora, a batalha mais longa na Ucrânia, e em que Prigozhin acusou Shoigu e Gerasimov de deixarem os seus homens morrer por falta de munições.
Conflitos com Putin e governo russo
Desde então, têm sido crescentes os ataques do empresário ao Ministério da Defesa russo, inclusive relativamente aos supostos ataques de drones ucranianos contra o Kremlin e o sul de Moscovo ou à incapacidade da Rússia em defender as regiões fronteiriças com a Ucrânia, como Belgorod, de incursões e bombardeamentos inimigos.
Yevgeni Prigozhin acusa o comando militar de mentir e de enganar os russos e Putin de ocultar a situação real na frente de guerra. Para alguns russos, ele é o único que diz a verdade, enquanto para outros é um homem perigoso e impertinente que, agora, se levanta contra as mais altas estruturas do poder.