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Por Lusa 03/06/24
O Burkina Faso lamentou domingo que a Costa do Marfim seja uma base de retaguarda para desestabilizar o país, o que, segundo o porta-voz do Governo de transição, "não é suscetível de consolidar as relações" entre os dois países.
Ouagadougou, 03 jun 2024 (Lusa) -- O Burkina Faso lamentou domingo que a Costa do Marfim seja uma base de retaguarda para desestabilizar o país, o que, segundo o porta-voz do Governo de transição, "não é suscetível de consolidar as relações" entre os dois países.
Em declarações na estação estatal de televisão burquinabê, o ministro de Estado e da Comunicação, Jean Emmanuel Ouédraogo, sublinhou que, "desde a emergência do Movimento Patriótico para a Salvaguarda e a Restauração (MPSR) [nome oficial da junta militar, liderada pelo capitão Ibrahim Traoré, que tomou o poder através de um golpe de Estado em setembro de 2022], o Governo não efetuou qualquer comunicação ou ação no terreno que visasse deteriorar as relações com a Costa do Marfim".
Em contrapartida, se a Costa do Marfim "se tornar a retaguarda de todos aqueles que tentaram desestabilizar o Burkina Faso, que se [aí] refugiam e continuam a realizar as suas ações ostensivamente sem serem molestados, isso não é suscetível de consolidar as relações de confiança entre os dois Estados", disse ainda.
A Frente de Defesa da República (FDR), uma organização composta por representantes da sociedade civil que apela à dissolução da junta e à saída dos militares, como condição para a organização de eleições que devolvam o poder às autoridades civis, foi o alvo concreto do ministro.
A organização, criada em abril e cujo porta-voz é um jornalista com o mesmo apelido do ministro, Inoussa Ouédraogo, denunciou o incumprimento das promessas da junta militar desde a sua chegada ao poder, nomeadamente em matéria de segurança, e lamentou um "balanço desastroso" no país, incluindo um aumento da repressão das vozes críticas a Traoré.
Embora a estrutura organizativa da FDR permaneça pouco clara, os meios de comunicação social sugerem que surgiu na Costa do Marfim.
"Parece uma comédia orquestrada a partir da Costa do Marfim por pessoas que partilham as suas amarguras e frustrações", disse o ministro, citado pela agência noticiosa estatal do Burkina Faso, AIB.
Também Ibrahim Traoré se referiu à FDR, alegando que alguns dos seus membros tinham contactado a junta numa tentativa de " obter posições", e expressando a sua "compaixão" por Inoussa Ouédraogo, que descreveu como "um cordeiro sacrificial".
O líder da junta militar assinou, no final de maio, uma nova carta constitucional, prolongando por cinco anos o mandato do Governo de transição.
A junta militar burquinabê, à semelhança das congéneres do Mali e do Níger, tem vindo a abandonar as organizações regionais de que fazia parte há décadas, nomeadamente a Comunidade Económica dos Estados da Africa Ocidental (CEDEAO), e a formar novas alianças (como a Aliança dos Estados do Sahel (AES), com aqueles dois países) hostis a um sistema que acusam de ser liderado pela França, a antiga potência colonial da maior parte dos Estados daquela organização regional.
O Burkina Faso tem registado um aumento significativo da insegurança desde 2015, com ataques perpetrados por grupos armados afiliados da Al Qaeda e do Estado Islâmico, o que levou a uma vaga imensa de deslocados internos e refugiados para outros países da região.
O Burkina Faso está, pelo segundo ano consecutivo, no topo da lista das crises negligenciadas em todo o mundo, segundo um relatório do Norwegian Refugee Council (NRC), divulgado hoje.
Com um número recorde de 707.000 novas deslocações dentro das fronteiras do país em 2023, a crise humanitária continuou a aumentar no passado, e centenas de milhares de pessoas foram privadas de ajuda.
O número de pessoas mortas em atos de violência duplicou em 2023, com mais de 8.400 mortes, segundo o relatório do NRC, e o número de refugiados burquinabês que procuram segurança nos países vizinhos quase triplicou, atingindo um total de 148.317, de acordo com os dados do ACNUR.
Um número sem precedentes de 42.000 pessoas sofreu níveis catastróficos de insegurança alimentar e cerca de 2 milhões de civis ficaram presos em 36 cidades bloqueadas em todo o país até ao final do ano.
Em face a proibições de circulação impostas pelos grupos armados, a assistência humanitária chegou a algumas destas zonas de forma praticamente inexistente, segundo o NRC, que estima em pelo menos meio milhão o número de pessoas que ficaram encurraladas sem acesso a qualquer tipo de ajuda.
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