quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Bill Gates foi à China com uma jarra de fezes e mostrou a sanita do futuro

Bill Gates levou a Pequim um recipiente com fezes humanas para dizer que desenvolveu uma sanita que as transforma em fertilizante. Não é preciso água ou sistemas de esgotos. Ainda não está no mercado.


Bill Gates diz que nunca imaginou vir a “saber tanto sobre cocó”. Mas sabe. Também nunca pensou que a mulher, Melinda Gates, tivesse de lhe pedir para “parar de falar de sanitas e de lodos de fezes à mesa de jantar”, à hora da refeição. Mas teve — e talvez tenha valido a pena.

Esta terça-feira, Bill Gates presentou uma sanita futurista numa exposição realizada em Pequim, precisamente dedicada às sanitas. Depois de 200 milhões de dólares investidos em pesquisa durante sete anos (que alguns analistas criticam por terem sido dirigidos a universidades de países desenvolvidos, não estando ainda totalmente definido que aplicação prático irão na realidade ter), a Fundação do casal Gates conseguiu desenvolver este ambicioso projeto que vem revolucionar o mercado, na medida em que a sanita agora apresentada não precisa de água nem de um sistema de esgoto para funcionar.

O fabrico da sanita resultou de uma colaboração internacional entre especialistas da China dos Estados Unidos e da Tailândia, entre outros países, e utiliza produtos químicos para transformar os dejetos humanos em fertilizante.

O El Mundo avança que Gates afirma que, após anos de desenvolvimento desta tecnologia, o produto está pronto para ser comercializado. O magnata, inventor e fundador da Microsoft garante que existem vários desenhos do produto e que o processo químico utilizado na tecnologia desfaz os dejetos humanos, não sendo necessário o uso de água para escoá-los. No entanto, admitiu, deverá demorar “pelo menos uma década” até que as novas sanitas cheguem em massa às regiões mais pobres do globo, sendo que as invenções têm ainda de se provar práticas e económicas. Um “ainda” que não é de menosprezar.



Uma apresentação com… cocó

A apresentação da inovação aconteceu numa feira que serviu para lançar o que o presidente chinês Xi Jinping considera ser uma das prioridades do seu país para os próximos anos: uma “revolução sanitária”. Em palco, Bill Gates quis mostrar “uma pequena coisa” que tinha ali “para mostar”: uma jarra de vidro (ou como lhe chamou simplesmente Bill Gates “um recipiente”) com fezes humanas.

Porquê trazer uma jarra de vidro com fezes humanas? Porque, explicou Bill Gates, aquele pequeno recipiente poderia conter “até 200 mil milhões de rotavirus” — tipo de vírus que causa diarreias graves em crianças e jovens e um dos vírus que causa a infeção da gastroentrite  –, “20 mil milhões de bactérias Shigella” — que podem originar doenças infecciosas que têm como possíveis consequências diarreia, febre e cólicas de estômago — e “cem mil ovos de vermes parasitas”. O contacto com estas bactérias e as infeções resultantes desse contacto (em locais onde não há sistemas de esgotos devidamente funcionais) resultam todos os anos na morte de meio milhão de crianças.
É a isto que a toda a hora tantas crianças, quando estão a brincar na rua, são expostas. “, alertou Bill Gates, citado pelo site Business Insider.
Em 2o15, Organização Mundial de Saúde estimou que apenas 39% das pessoas tivessem acesso a instalações sanitárias a casas de banho ou latrinas devidamente limpas. Bill Gates acha que é preciso mudar isso: “Quando pensamos em coisas que são básicas, no topo das prioridades além do acesso à saúde e de ter algo para comer, deveria estar ter acesso a uma sanita razoável, em minha opinião”.

Durante a apresentação da sanita, em Pequim, Gates despejou as fezes humanas na sua nova invenção para demonstrar a eficácia do produto, advertindo para os problemas de saúde relacionados com a falta de higiene em países subdesenvolvidos, tendo em conta que meio milhão de crianças morre anualmente por falta de condições sanitárias.

Este novo modelo, que não precisa de estar ligado a um sistema de saneamento ou de água e transforma os dejetos humanos em fertilizante, está a ser testado na cidade sul-africana de Durban, onde também estão a ser testados outros modelos, que se alimentam de energia solar, explicou Gates.

O multibilionário explicou que a rápida expansão destes novos produtos e sistemas de saneamento que não necessitam de estar conectados a nenhuma rede poderá reduzir drasticamente o número de mortos e o impacto da falta de higiene na saúde da população nos países mais pobres.



“Os maiores avanços sanitários em quase 200 anos”

Hoje, já não se discute “se podemos reinventar as sanitas e outros sistemas sanitários”, afirmou Bill Gates, em entrevista à estação britânica BBC. “É uma questão de quão rápido esta nova categoria de soluções autónomas, que não estão ligadas a uma rede, poderão escalar”. As várias inovações apresentadas em Pequim — entre as quais, a sua — trazem “os avanços mais significativos no sistema sanitário em perto de 200 anos”.
Nos países ricos temos esgotos que levam com água limpa, limpam e tiram alguma da água suja… em quase todos os casos há instalações de tratamentos. À medida que formamos  novas cidades em que vivem muitas pessoas menos ricas, esses esgotos não foram construídos e, na verdade, não é provável que o venham a ser. Portanto, a questão é: podes fazê-lo tu? Podes tu processar os dejetos humanos sem esse sistema de esgotos?”, explicou Bill Gates.
Segundo a Unicef, quase 900 milhões de pessoas não têm escolha senão fazer as suas necessidades ao ar livre. Só na Índia, estima-se que sejam 150 milhões.

A mesma fonte estima que 480.000 de crianças com idade inferior a cinco anos morrem todos anos de diarreia, muitas vezes por beberem água ou comerem comida contaminada pelos esgotos.

O Presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim, destacou que o saneamento é uma das prioridades para a sua organização, que se vai aliar com a Fundação Bill e Melinda Gates para levar instalações sanitárias seguras a todas as partes do mundo.

“Os sistemas que se podem difundir com rapidez e proporcionar um saneamento seguro e sustentável às comunidades são fundamentais para a qualidade de vida e desenvolvimento do capital humano”, afirmou Jim, citado no comunicado.

observador.pt

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